Uma decisão liminar do ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), coloca em xeque revisões salariais feitas em municípios do Paraná desde a entrada em vigor da Lei Complementar (LC) 173, em maio do ano passado. Publicada na semana passada, em 5 de agosto, a decisão de Alexandre de Moraes ocorreu no bojo de uma Reclamação (RLC 48538) proposta pela prefeitura de Paranavaí contra dois acórdãos do Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) que permitiram que cidades paranaenses fizessem a revisão salarial do funcionalismo, ao entender que isso não representaria afronta à lei federal de maio de 2020. A LC 173 estabeleceu que estados e municípios em todo país devem cumprir determinadas medidas para que a União assegure dinheiro ao enfrentamento à pandemia do coronavírus. Entre as medidas, uma série de restrições envolvendo despesa com pessoal.
Na linha dos argumentos levados pelo município de Paranavaí (cidade localizada no Noroeste do Paraná), Alexandre de Moraes derrubou os dois acórdãos do TCE, em despacho assinado no último dia 2. Para o ministro do STF, o TCE fez uma interpretação “peculiar” do alcance da lei federal. Procurado pela Gazeta do Povo nesta terça-feira (10), o TCE afirmou que tem entendimento divergente, mas que respeita a decisão do ministro e que vai modificar a orientação às cidades paranaenses (leia mais logo abaixo).
O foco do debate está no inciso primeiro do artigo oitavo da LC 173, que definiu que “União, Estados, Distrito Federal e Municípios afetados pela calamidade pública decorrente da pandemia ficam proibidos, até 31 de dezembro de 2021, de conceder, a qualquer título, vantagem, aumento, reajuste ou adequação de remuneração a membros de Poder ou de órgão, servidores e empregados públicos e militares, exceto quando derivado de sentença judicial transitada em julgado ou de determinação legal anterior à calamidade pública”. Ao analisar o trecho a pedido de municípios do Paraná, o TCE apontou que não se pode confundir “reajuste”, de fato proibido pela LC 173, com a chamada “revisão geral anual” que está prevista no artigo 37 da Constituição Federal.
No entendimento do conselheiro Artagão de Mattos Leão, relator do caso no TCE, a revisão geral anual “não gera ganho remuneratório real, mas apenas promove a recomposição da perda inflacionária frente à instabilidade da moeda”. Assim, segundo ele, o artigo oitavo da LC 173 “não veda a recomposição inflacionária”. A posição de Mattos Leão, a mesma do Ministério Público de Contas do Paraná, foi seguida por unanimidade pelos demais conselheiros do TCE-PR, gerando os acórdãos 447230/2020 e 96972/2021. Os dois documentos, agora derrubados pelo ministro do STF, já serviram de base para os municípios paranaenses adotarem revisões salariais.
O município de Paranavaí foi ao STF para contestar os acórdãos do TCE através de uma Reclamação protocolada em julho. Nela, a prefeitura destaca que o STF já de se debruçou sobre a LC 173, no julgamento de duas ações diretas de inconstitucionalidade (ADIs 6450 e 6525), em março deste ano. No julgamento das ADIs, os ministros compreendem que a LC 173 de fato prevê a vedação à revisão geral ao funcionalismo e consideram que isso é constitucional.
Ao defender seu pedido de liminar, a prefeitura também falou sobre o impacto do tema para os 399 municípios paranaenses com contas fiscalizadas pelo TCE. “Há ainda risco de efetivação de eventual sanção aos gestores públicos que não observarem a decisão da Corte de Contas local, que vai de encontro da decisão da Suprema Corte, pois as consultas em âmbito dos Tribunais de Contas [que geraram os acórdãos] são vinculantes e eventual não observância é considerado pelos tribunais como erro grosseiro ou inescusável. Ademais, haverá possibilidade de prejuízo ao erário em cifras milionárias, uma vez que os servidores eventualmente beneficiados com a concessão da revisão geral estarão – em tese – de boa-fé, não podendo ser repetido tais valores”, escreveu ao STF o procurador do município de Paranavaí Washington Aparecido Pinto.
TCE vai identificar revisões já concedidas
Questionado pela reportagem sobre quantos municípios já teriam proporcionado a revisão salarial ao funcionalismo público, a despeito da LC 173, o TCE-PR explicou que ainda não possui tal levantamento. Como a decisão do ministro do STF Alexandre de Moraes é recente, o TCE informou que ainda precisa “avaliar a questão” e “identificar eventuais reposições efetuadas”. Em princípio, antecipa o órgão de controle, reajustes já concedidos devem ser suspensos, sem devolução do que foi recebido de boa-fé.
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