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Município que lidera a produção nacional de camomila busca “selo de qualidade”
| Foto: Ari Dias

Mais do que efeitos medicinais, o bom desempenho no uso cosmético, o poder de acalmar e estimular o sono e a excelente opção como rotação de cultura impulsionaram a camomila como fonte de renda, diversificação de pequenas propriedades rurais e atração turística, movimentando a cadeia econômica em um pequeno município do Paraná. Mandirituba tem 27 mil habitantes e está na Região Metropolitana de Curitiba, a 43 quilômetros da capital paranaense.

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Há cerca de meio século a erva chegou à cidade, segundo registros históricos locais, pelas mãos de imigrantes vindos do leste europeu, principalmente Polônia e Ucrânia, e hoje rende ao município o título de maior produtor brasileiro de camomila.

O Paraná produz cerca de mil toneladas da planta/ano, segundo dados da Secretaria de Estado da Agricultura e Abastecimento (Seab), e responde por aproximadamente 90% do cultivo nacional. Em Mandirituba, onde se concentram de 40 a 45 produtores, está quase metade da produção estadual, que tem ficado em torno de 450 toneladas/ano. Sozinha, a cidade responde por 35% da produção nacional.

Os dados oficiais de 2022 ainda estão em levantamento pelo Departamento de Economia Rural (Deral), órgão vinculado à Seab, mas em média, somente no Valor Bruto da Produção Agropecuária, a cultura rende R$ 6 milhões por ano. Em termos comparativos, em todo o Paraná o VBP da camomila é de R$ 18 milhões.

Como não se trata de uma cultura de elevado apelo comercial e amplo cultivo, como soja, milho e trigo, os números oficiais do cultivo da camomila em 2022 só devem ser apurados e apresentados no VBP em julho deste ano, reforça o Deral. Enquanto os números oficiais não chegam, os preparativos para a próxima safra não param. Isso porque a camomila de Mandirituba tem um mercado sedento por todo o Brasil, principalmente São Paulo, Mato Grosso e Goiás.

Além de camomila aos brasileiros, o objetivo, segundo o presidente da Associação dos Produtores de Camomila de Mandirituba (Camandi), José Edinei Klichevicz, é ganhar o mundo. Para isso, o sistema produtivo passa por um processo de aperfeiçoamento em boas práticas, de qualificação, capacitação e profissionalização em toda a cadeia.

Auxiliados pelo Sebrae-PR, o município está em busca da Indicação Geográfica (IG), na modalidade Indicação de Procedência, certificação emitida pelo Instituto Nacional de Propriedade Industrial (Inpi). “O registro de Indicação Geográfica é conferido a produtos ou serviços que são característicos do seu local de origem, o que lhes atribui reputação, valor intrínseco e identidade própria, além de os distinguir em relação aos seus similares disponíveis no mercado. São produtos que apresentam uma qualidade única em função de recursos naturais como solo, vegetação, clima e saber fazer”, esclarece o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa).

O reconhecimento vai agregar às referências como um espécie de DNA do cultivo, consolidando onde e como aquele produto foi cultivado, processado e transformado. É uma espécie de selo de certificação de qualidade e de controle, que promete agregar valor a um segmento que já é referência, lembra a consultora do Sebrae-PR para o agronegócio, Aline Geani Barbosa dos Santos, que acompanha de perto o processo.

Como os produtores não podem comercializar coletivamente a camomila pelo CNPJ da associação, os planos miram na fundação de uma cooperativa, processo que pode ser facilitado com a tão sonhada IG. “Até lá, continuamos trabalhando na produção, na venda, divulgação e na profissionalização”, completa o presidente da associação.

O relatório técnico que solicita a Indicação Geográfica para a camomila de Mandirituba foi encaminhado em novembro do ano passado. Agora é aguardar a avaliação em um processo que pode se prolongar por até dois anos. Até lá, as palavras de ordem são: capacitação constante, estímulo às boas práticas e valorização da cultura local. “Dentre as ações está o trabalho com crianças nas escolas reforçando a importância do cultivo para o município, para que a tradição não se perca”, destacou a consultora do Sebrae.

Com o avanço das lavouras, chegou a tecnificação do cultivo, conta Klichevicz. Há poucos anos, quando a colheita era manual, uma pessoa conseguia remover dos campos 20 quilos da planta por dia, com colheitadeira colhe hoje até 8 toneladas/dia. Mandirituba tem uma cadeia produtiva desde o cultivo das sementes, passando por semeadura, colheita, secagem, até a industrialização, lembra o prefeito Luis Antonio Biscaia (PSC).

Uma indústria local processa 10 toneladas de chá por ano. Segundo o gestor público, é preciso mais. “Estamos em busca de mais uma indústria para o empacotamento. Trabalhamos com o governo do Estado para atrair essa fábrica. Nossa produção comporta e precisamos agregar valor ao nosso produto. Em vez de vendermos as flores para outros estados, podemos vender toda a camomila já processada”, afirma.

O cultivo da camomila aparece entre as cinco principais atividades econômicas do município. O incentivo do poder público é, segundo o prefeito, para ampliar capacitações e estimular os produtores à formalização. O prefeito acredita que, com as emissões de notas fiscais e vendas realizadas pela futura cooperativa, o município consiga comprovar uma produção de mais de mil toneladas/ano. “Acreditamos que nossa produção seja maior que os registros apontam, com as emissões de nota e a formalização isso ficará comprovado”, completa.

Inverno florido com a camomila

A camomila é uma cultura de inverno com semeadura entre abril e maio. Os campos de camomila ficam floridos em branco e amarelo nos meses de agosto e setembro, quando inicia a colheita.

Além de Mandirituba, outros municípios da Região Metropolitana de Curitiba trabalham com a flor. Juntos, eles somam 98% do cultivo estadual. O motivo para tantas lavouras numa mesma região está na localização geográfica que proporciona condições climáticas favoráveis, além das condições de solo, avalia o Deral. O ciclo completo da camomila leva cerca de 120 dias. Para um bom desenvolvimento, precisa de temperaturas que variam entre 10ºC e 20ºC, condição facilmente encontrada onde estão estes campos, na RMC.

Camomila em Mandirituba atração turística nacional

Mas não é só de chás e cosméticos que vive a cultura da camomila em Mandirituba. O turismo rural viu nos campos floridos da camomila outro reconhecimento nacional: a cidade está no circuito do turismo rural, com destaque às cinco caminhadas anuais, algumas delas no meio dos campos de camomila. “Mais um segmento da economia que se consolida, se beneficia e se torna referência com a cultura”, lembra a consultora do Sebrae-PR.

Os eventos realizados no último ano atraíram em torno de 7 mil visitantes. O trajeto tem 13 quilômetros com indicação gastronômica, com direito a bolo e sorvete de camomila após as refeições, e pontos de comercialização do produto. O percurso pode ser feito a pé, de bicicleta ou de carro. A primeira caminhada deste ano foi em fevereiro. A que ocorre com os campos bem floridos será em agosto.

Diante do conjunto de ações que circunda a cultura, o Sebrae enxergou ali um potencial. Aline Geani Barbosa dos Santos conta que foram desenvolvidos diagnósticos de potencialidades para produtos e serviços em todo o Paraná. Mandirituba despontou. “A indicação geográfica vai reconhecer a reputação da cidade, a qualidade e características do produto e da sua produção”, completa.

A preocupação no ciclo 2023 está na incerteza para as áreas de cultivo. “Como é preciso plantar uma área muito grande, porque a camomila depende de bastante espaço, muitos produtores arrendam terras além das que possuem. Neste ano, com o preço do trigo muito elevado, está difícil encontrar áreas para arrendar. Os agricultores vão plantar trigo. Talvez tenhamos uma diminuição das lavouras”, avalia o presidente da Camandi.

Por outro lado, a expectativa é que, com menos áreas plantadas, o segmento consiga valorização do produto. “Nos últimos anos, o cultivo cresceu, a produção aumentou bastante e os preços caíram. A camomila em flor é vendida pelos produtores a R$ 15 e a mista [que reúne flores e talos] a R$ 7, R$ 8. Para garantir um bom rendimento, a camomila em flor deveria custar R$ 30 e a mista R$ 15”, calcula Klichevicz, que se dedica ao cultivo há 12 anos e colhe, em média, 25 toneladas/ano.

Ele vai manter suas lavouras e conta que começou com a camomila como uma opção de rotação de cultura. Logo se tornou a principal fonte de renda da família. “Virou uma paixão. É lindo, os campos floridos têm um cheiro muito bom. Quando começamos, buscávamos uma boa rotação de cultura para que a terra se mantivesse fértil e bem cuidada. Logo enxergamos o potencial e a camomila se tornou nossa principal atividade econômica. Agora é esperar o IG e, além do Brasil, ganhar o mundo”, planeja o agricultor.

Dez registros de Indicação Geográfica no Paraná

O Paraná tem o reconhecimento de dez produtos com o registro de IG. O mais recente foi o barreado do litoral, alcançado no fim do ano passado. Acrescentam-se à lista a bala de banana de Antonina, o melado de Capanema, a goiaba de Carlópolis, o queijo de Witmarsum, as uvas de Marialva, o café do Norte Pioneiro, o mel do Oeste, o mel de Ortigueira e a erva-mate São Matheus do Sul.

Outros cinco produtos paranaenses aguardam receber a certificação do INPI: vinhos de Bituruna, farinha de mandioca do Litoral, cachaça de Morretes, morango do Norte Pioneiro e, agora, a camomila de Mandirituba.

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