A gamificação na educação vem sendo utilizada mais amplamente desde que a pandemia de Covid-19 levou os estudantes para as aulas online. E mesmo depois do retorno à escola, as ferramentas que se mostraram úteis com as aulas remotas seguem sendo referência para professores e estudantes. Até porque algumas delas remontam a tempos anteriores ao do distanciamento social e tiveram na amplificação do uso apenas a prova de que unir inteligência artificial e aprendizagem funciona - a ponto de mudar resultados em diagnósticos oficiais. Até mesmo quando é a matemática que, literalmente, está em jogo.
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Foi o que aconteceu na rede pública de ensino do Paraná no último ano. Os resultados das avaliações periódicas da rede estadual de ensino, a Prova Paraná, mostraram que os alunos estão indo melhor em matemática depois que o jogo online passou a ser utilizado. Em algumas escolas, “assustadoramente” melhor. O desempenho dos alunos do Colégio José de Anchieta, em Maringá, no noroeste paranaense, saltou de uma média de 53,9% de acertos em 2021 para 98,75% em 2022, por exemplo.
Coincide com o fato de que, há dois anos, a plataforma Matific passou a ser usada pelos alunos do 6º ano da rede pública. O software de jogos interativos reúne trilhas de aprendizagem com exercícios que agregam todas as exigências do currículo escolar, formatados com desenhos atraentes e problemáticas que desafiam os alunos a buscar soluções práticas.
“O aluno passa de fase cumprindo as tarefas da lição de matemática no jogo. É muito lúdica, todo o layout é de game. É uma sequência de exercícios, mas com cenário, em que o aluno navega por trilhas, cria um avatar, coloca acessórios no personagem. Como nessa idade eles (os estudantes) estão nessa pegada de jogar, a gente usa essa energia que querem gastar jogando para aprender matemática”, explica o secretário de Educação do Paraná, Roni Miranda.
Na média, o desempenho dos estudantes em matemática no sistema de avaliação do estado aumentou de 46,2% para 55,5% entre os dois últimos anos letivos. O que pode ser atribuído ao uso do sistema de jogos na grade curricular. Roni Miranda conta que nas últimas avaliações da Prova Paraná os alunos do 6º ano, de fato, tiveram desempenho além dos demais em matemática. “Houve diferença de até cinco pontos percentuais na performance deles em relação às outras séries”, menciona.
Muito além dos dados
Os resultados numéricos são apenas uma parte do processo, acreditam representantes do método e educadores. Para eles, o grande bônus é que os alunos estão gostando mais de matemática com a introdução do jogo - disciplina que historicamente faz os estudantes torcerem o nariz. “Não é só melhora de resultado na prova. A gente põe em forma de jogo tudo o que é importante para o aluno aprender e leva para situações cotidianas. Ele vê de forma concreta onde as operações se aplicam e aprende fazendo, colocando a mão na massa”, conta Dennis Szyller, CEO da Matific Brasil.
A inteligência artificial mapeia o desempenho de cada aluno e entrega as tarefas pertinentes ao nível correspondente, de forma individual. Conforme o estudante avança, os exercícios vão ficando mais complexos. “Ao mesmo tempo em que conseguimos fazer esse diagnóstico e entregar conteúdo que faça sentido para cada aluno, damos aos professores relatórios de desempenho para mostrar os pontos fortes e as lacunas de aprendizagem”, ressalta Szyller.
A plataforma entrega pedagogia rigorosa, feita por especialistas de universidades de renome no mundo, com tecnologia de jogos de ponta. Uma ferramenta e tanto para auxiliar o professor em sala de aula. “Traz diversidade de interpretações, visões diferentes dos autores e variedade enorme de exercícios sobre o mesmo assunto”, avalia a professora Luzia Regis Narok Pereira, do Colégio Estadual Marli Queiroz de Azevedo, de Curitiba – escola que ficou entre as primeiras colocadas em acessos à Matific.
A educadora observa que alunos mais introspectivos têm melhorado o desempenho em matemática com o jogo na plataforma. E atribui o sucesso a aspectos como o estímulo à interpretação, capaz de formar adultos mais preparados para enfrentar os desafios do mercado e da vida. “Se a pessoa não sabe como interpretar um problema, não sabe como resolvê-lo. E o que é nossa vida de adulto senão a resolução de problemas diários?”, questiona.
Além disso, a individualização é muito próxima do ideal, já que mesmo em uma sala de aula da mesma série, cada aluno está em um nível de aprendizagem. “E eles ficaram mais motivados. Trabalho com pesquisa em tecnologia na educação e a gente se questiona em relação às novidades que realmente fazem a diferença na aprendizagem. E consigo dizer que o Matific fez essa diferença”, afirma.
Inovação no ensino
A Matific é criação da startup israelense de mesmo nome, fundada em 2012 por educadores da Hebrew University, em Jerusalém, e do Centro Interdisciplinar de Herzelia, em Tel Aviv. A empresa trouxe a tecnologia da gamificação em matemática ao Brasil em 2014, após um aporte robusto para expansão global. Atualmente, é usada em 60 países, desde a educação infantil até o final do ensino fundamental, ou equivalente.
No Brasil, o resultado foi o alcance de mais de um milhão de estudantes, e o país se configura como o maior mercado da empresa em todo o mundo. “Estamos em mais de 5 mil escolas. Alcançamos 300 mil alunos da rede privada e outros 700 mil da rede pública”, diz o CEO, que tem o sonho de democratizar o ensino de matemática e formar mais mentes voltadas à disciplina, especialmente por conta do mercado de trabalho à vista.
O trabalho com a rede de ensino pública no Paraná ganhou destaque para a multinacional especialmente pela escalabilidade. A ferramenta alcançou 100% dos alunos da rede estadual do 6º ano. “É um feito inédito uma penetração tão grande. Estamos falando de alunos de escolas rurais, indígenas, alunos que estão usando internet com sinal de rádio”, conta. Este ano, a Matific começou a ser usada também para a 7ª série.
Roni Miranda explica que o alcance foi possível porque o Paraná adotou a estratégia de usar a plataforma em sala de aula, de maneira que tanto professores quanto alunos se envolvessem. “Criamos a figura de um personagem chamado embaixador. São professores de matemática que, desde quando começamos a usar a plataforma de maneira experimental, em 2020, se engajaram e dominaram o jogo. Eles foram então para as escolas e apresentaram a plataforma para os professores, muitas vezes entrando em sala e dando aula junto com eles”, lembra. Os embaixadores da Matific somam 42 professores, que atendem aos 32 núcleos regionais da Educação no Paraná.
Jogando e aprendendo
O sucesso foi tanto que os alunos passaram a querer jogar – e aprender - também em casa. É possível baixar o aplicativo no celular e fazer os exercícios offline. Quando o aluno acessa a internet, a plataforma atualiza os dados e contabiliza tudo o que foi feito nos registros da rede de ensino.
A professora Luzia relata que o sucesso da escola em número de acessos e exercícios cumpridos se deu por conta desse engajamento extraclasse dos alunos. Quem não utiliza tanto ou tem dificuldades no uso não é prejudicado, mas quem evolui nos exercícios recebe pontos por isso. “A avaliação precisa ser diferenciada e variada, mas, por que não pontuar se o aluno avança?”, diz.
Sophia Leonel Lamin, aluna do 6º ano do colégio Leoncio Correia, de Curitiba, é uma dessas usuárias superativas do jogo de matemática. “Eu consigo aprender mais fácil. É muito legal porque atrai, tem vários desenhos e, mesmo que você erre, ela (a plataforma) te dá dicas para melhorar”, avalia.
A mãe, Brunna Leonel, se surpreendeu com a forma como a filha passou a se interessar por matemática depois que começou a usar os jogos de aprendizagem. “Ela sempre gostou de português, falava que queria ser escritora. E agora me diz que acha que gosta mais de matemática. É com certeza uma forma de atrair muito mais a atenção das crianças”, considera Brunna, que passou a ver notas mais altas na matéria no boletim da filha.
A lição de Sophia fica para as gerações que certamente vão extrair um novo jeito de experimentar o aprendizado com o uso da tecnologia. E mesmo para os adultos que ainda queiram abraçar essa oportunidade. “A matemática não precisa ser só uma conta que você faz no papel, mas sim uma coisa divertida. Um entusiasmo.”
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