Em agosto de 2009, a Gazeta do Povo noticiava o andamento dos primeiros trabalhos para elaboração do estudo de impacto ambiental para a construção do metrô em Curitiba. Foi a mais recente empreitada para a implantação do modal em Curitiba – os primeiros estudos sobre o tema datam de 1969 –, e a que chegou mais próxima de sair do papel. Mas, nesse período de uma década, o projeto foi reduzido, suspenso e, por ora, não há intenção de retomá-lo, ao menos na gestão do prefeito Rafael Greca (DEM).
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Mais do que a frustração dos entusiastas do metrô curitibano, as idas e vindas nas iniciativas de implantação tiveram impacto nos cofres públicos. Somente entre 2002 e 2016, período que compreendeu as gestões de Cassio Taniguchi (DEM), Beto Richa (PSDB) e Gustavo Fruet (PDT), quase R$ 25 milhões (valor corrigido pela inflação) já foram consumidos apenas em estudos e projetos para o modal. Além disso, um repasse de R$ 1,8 bilhão da União para o município acabou cancelado com a suspensão do processo de licitação para as obras.
Mas apostar no metrô pode não ser mesmo a melhor ideia para solucionar os crescentes problemas de mobilidade da capital paranaense, na avaliação do engenheiro civil Garrone Reck, professor do Departamento de Transportes da Universidade Federal do Paraná (UFPR). “A curto e médio prazos é preciso pensar em soluções de superfície”, defende. “Isso significa disputar espaço com automóveis, mas é necessário para melhorar o desempenho do sistema.”
Segundo ele, a velocidade média operacional de um ônibus de linhas super expressas em corredores exclusivos podem atingir 30 km/h – a do metrô gira em torno de 40 km/h. “Há um ganho? Sim, mas a infraestrutura é muito cara”, destaca. Para fins de comparação, o ônibus no trânsito congestionado tem velocidade média operacional de 15 km/h. “Mesmo países desenvolvidos, como Estados Unidos e China, estão buscando soluções de corredores de ônibus, ironicamente, inspirados no modelo de Curitiba.”
O projeto abandonado da Linha Azul
Dez anos atrás, a prefeitura de Curitiba estava sob a gestão de Beto Richa. Naquele ano, o Consórcio Novo Modal já havia sido contratado para fazer os estudos de engenharia da Linha Azul, a primeira prevista. Em alguns pontos da cidade, equipes técnicas que trabalhavam em obras já usavam uniformes e placas com a marca Metrô Curitibano. A ideia inicial era que a linha, com um traçado de 22 quilômetros ligando o Santa Cândida e a Cidade Industrial (CIC), estivesse pronta para a Copa do Mundo de 2014.
O projeto acabou atrasando e a licitação para a construção propriamente dita, no modelo de parceria público-privada (PPP), saiu apenas em 10 junho de 2014, antevéspera da abertura do Mundial no Brasil, e já no mandato de Gustavo Fruet. O edital previa, além da construção, a concessão da operação à vencedora, por um período de 35 anos, do trecho de 17,6 quilômetros, da CIC até o Terminal do Cabral – a extensão até o Santa Cândida ficaria para outro momento.
Caso os planos previstos à época tivessem se concretizado, desde 2018 os cidadãos curitibanos já poderiam se deslocar de metrô da CIC até a estação Rua das Flores, no Centro, passando por estações como as dos terminais Pinheirinho, Capão Raso e Portão. Agora em 2019 estariam sendo inauguradas as estações Passeio, Alto da Glória e Terminal do Cabral.
Mas no dia 22 de agosto de 2014, a dois dias da abertura dos envelopes dos concorrentes, o processo licitatório foi suspenso pelo Tribunal de Contas (TCE-PR), que condicionou sua retomada à reformulação de trechos do edital. A prefeitura refez o documento e prometeu relançá-lo no fim de 2015, o que acabou não acontecendo. O projeto do metrô passou então a enfrentar outro obstáculo para sair do papel: os custos da obra.
Uma parte expressiva do orçamento inicial – R$ 1,8 bilhão – viria do governo federal por meio do Ministério das Cidades, hoje incorporado pelo Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR). A prefeitura e o governo do estado investiriam R$ 700 milhões cada e R$ 1,5 bilhão ficariam por conta da iniciativa privada, totalizando os R$ 4,7 bilhões previstos no edital original da licitação. Até 2016, quando o projeto foi descartado de vez, a inflação havia elevado o custo para R$ 5,8 bilhões, e o governo federal informava que não acrescentaria mais um centavo no repasse já autorizado (e que acabou não sendo pago). O projeto ficou suspenso e acabou abandonado com o fim da gestão de Fruet.
Para Garrone Reck, o projeto tinha um equívoco que consistia em ter sido pensado como uma solução municipal. “O próprio termo ‘metrô’ deriva do processo de metropolização. Apelidou-se assim o sistema de transporte porque é adequado a grandes aglomerados urbanos”, explica. “Quando se fala em metrô de Curitiba, em linha Norte-Sul, limita-se esse conceito. É um sistema que se aplica para solução de uma extensão muito mais ampla, de região metropolitana.”
O metrô de São Paulo, que conta com a maior malha metroviária do país, é operado por uma empresa de capital misto controlada pelo governo paulista. “Não é um projeto que fica circunscrito ao município, porque faltariam recursos para assumir um projeto desses no nível local”, diz Reck. Para ele, embora houvesse contrapartida dos governos federal e estadual no empreendimento curitibano, não havia prioridade desses entes em uma obra que impactava basicamente um único município.
A prefeitura de Curitiba e o Ippuc foram procurados para falar sobre o projeto, mas informaram, por meio de assessoria de imprensa, que, uma vez que o projeto não fez parte da atual gestão, “as demandas relativas ao tema devem ser feitas a quem o conduziu”.
Presidente do Ippuc na época da elaboração do projeto da Linha Azul, Cléver Ubiratan Teixeira de Almeida é hoje diretor de Planejamento e Gestão da Mobilidade e Serviços Urbanos da Secretaria Nacional de Mobilidade Urbana, órgão vinculado ao MDR. A Gazeta do Povo solicitou entrevista com ele, mas não obteve retorno até o fechamento desta reportagem.
Durante a campanha eleitoral de 2016, Almeida colaborou com o programa de mobilidade do então candidato Rafael Greca, e, embora tenha sido entusiasta do metrô em outro momento, passou a defender como alternativa o Veículo Leve sobre Pneus (VLP), uma espécie de evolução do Ligeirão, tecnicamente chamado de BRT (sigla em inglês para Transporte Rápido por Ônibus).
Greca descarta metrô
Desde que era candidato à prefeito de Curitiba, em 2016, Rafael Greca já anunciava que não apostaria no metrô. Logo após eleito, afirmou que sequer acreditava haver dinheiro da União disponível para o metrô. “Vamos parar de acreditar em história da carochinha”, disse em entrevista à Gazeta do Povo.
Apesar disso, no período de transição da prefeitura, Greca tentou negociar a utilização dos R$ 1,8 bilhão destinados ao metrô para outros projetos de mobilidade. O Ministério das Cidades, no entanto, cancelou o repasse, afirmando que não seria possível alterar o objeto selecionado para o direcionamento do dinheiro. “Novos recursos para mobilidade urbana dependem de abertura de novo processo seletivo, quando a prefeitura deverá apresentar os respectivos projetos”, informou o órgão à época.
O total de transferências para o município em convênios na área de mobilidade ficou em R$ 9,72 milhões em 2017 e em R$ 16,05 milhões em 2018, segundo o MDR.
Greca tenta atualmente a liberação de recursos para ampliação da canaleta para o Ligeirão da Praça do Japão até o Terminal do Capão Raso, a construção do Terminal do Tatuquara e o sistema trinário para a linha Inter 2, que inclui construção de uma trincheira no bairro Seminário. Outras prioridades da gestão na área de mobilidade incluem a conclusão da Linha Verde e a implantação dos ligeirões Norte/Sul e Leste/Oeste.
Para dar conta dos projetos, o prefeito aguarda aprovação, pelo Ministério da Economia e pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, de um empréstimo de US$ 106,8 milhões (aproximadamente R$ 405,8 milhões) do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). O financiamento, assim como uma operação de crédito de R$ 15 milhões com a Caixa Econômica Federal também destinada à mobilidade urbana, recebeu o aval da Câmara de Curitiba nesta semana.
Na terça-feira (27), em entrevista ao programa RIC Mais Notícias, da rádio Jovem Pan, o prefeito foi questionado sobre a possibilidade de implantação do transporte subterrâneo na cidade. “Não há dinheiro nesse Brasil de hoje para fazer metrô”, disse. “Porque um quilômetro de BRT custa mil vezes menos do que um quilômetro de metrô.”
Ainda na gestão de Gustavo Fruet, a prefeitura lançou uma Pesquisa de Manifestação de Interesse (PMI) para implantação de projetos de eletromobilidade na cidade. Três propostas, consideradas alternativas à solução do metrô, foram recebidas: uma para utilização de VLP e outras duas para ônibus elétricos ou híbridos.
Para o engenheiro Garrone Reck, o metrô pode ser implantado em um momento futuro, em que um planejamento metropolitano identifique a necessidade de integração entre municípios por meio do modal. “Antes disso, é preciso melhorar a qualidade de vida das pessoas que utilizam o ônibus”.
O pesquisador considera que é preciso ampliar a rede de vias preferencias para o transporte coletivo, utilizar veículos mais modernos e sustentáveis e reservar espaço também para a chamada mobilidade ativa – pedestres, ciclistas e usuários de outros meios de transporte não motorizados, como patinetes. “Hoje há muito pouca participação dessas soluções porque falta infraestrutura e segurança pública”.
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