Nilsa Lançoni viveu quase até os 100 anos, morando sempre na Água Verde| Foto: Divulgação / Arquivo da família
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Ivette Nilsa Freitas Lançoni viveu quase um século exatamente no mesmo lugar. A casa dela, marcada na memória de muita gente pela cor branca e janelas azuis apesar de nem sempre ter sido ornamentada assim, é patrimônio do bairro Água Verde tanto quanto a Arena da Baixada ou o Santuário Sagrado Coração de Jesus, do qual era frequentadora. Habitou outra casa no mesmo terreno, com a mãe e a irmã, antes de construir o lar marcante de cuja varanda assistiu a cidade se transformar.

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O pai, português de Coimbra, embarcou para o Brasil “prometido” à mãe de Nilsa, numa época em que casamentos arranjados eram uma forma comum de formar família. Ele morreu cedo, vítima de infarto. Ela, então com duas filhas crianças, precisou dar um jeito de gerar renda. A solução foi criada no próprio quintal, onde ordenhava vacas e as meninas entregavam o leite, vendido na vizinhança.

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Na juventude, a independente Nilsa encontrou trabalho no Centro da cidade, como modista de loja, e assim ajudou no sustento da família, que pela força de suas mulheres e também pelos acontecimentos do destino, tinha base matriarcal. Dessa época, manteve o hábito e o gosto por passear pelo Centro, vasculhar lojas e conversar com os vendedores e vendedoras, dos quais se tornou conhecida.

O fato de ser uma mulher autônoma não atrapalhou em nada o encontro com um amor, que se tornaria seu marido. Mas o casamento precisou esperar alguns acontecimentos históricos dos quais o noivo, Florisval Lançoni, o Neno, fez parte. Assim como vários civis jovens na década de 1940, ele foi convocado para servir o Exército na Itália durante a Segunda Guerra Mundial. Cumprido o dever cívico no exterior, não retornou diretamente ao altar com Nilsa.

Antes, passou um tempo em São Paulo jogando futebol pelo Palmeiras. De retorno à capital paranaense, enfim casaram-se – após uma serenata reconquistadora com amigos da Banda da Polícia Militar do Paraná. Neno jogou ainda pelo Athletico e Coritiba. Neste último, time do coração dele e da família, foi um dos maiores artilheiros da história. Mesmo após o falecimento precoce do jogador, aos 49 anos, Nilsa continuou indo ao Estádio Couto Pereira, acompanhada de uma comadre coxa-branca. Chamava a atenção da torcida por tricotar durante o jogo.

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Porém, o esporte mais amado por ela era o tênis. O canal de esportes estava sempre sintonizado para acompanhar os jogadores prediletos e os resultados. Talvez por isso, sugere a filha Ana Lucia Lançoni Ramos, um dos netos de Nilsa tenha tomado tanto gosto pelo tênis, praticando de forma amadora.

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Herança dos tempos em que tricotava e costurava mochilas para garantir a renda da casa, Nilsa cerzia peças e fazia outros trabalhos manuais com as amigas para ajudar a Cruz Vermelha, organização da qual eram voluntárias. Em troca da boa ação, elas encontravam motivo para uma reunião semanal com chá e boas conversas.

O paradoxo é que Dona Nilsa, que morou sempre no mesmo lugar, dificilmente era encontrada em casa. “A família brincava que se alguém queria encontrar ela, não devia procurar em casa. A gente passava lá e deixava um bilhete escrito ‘Passei por aqui’”, ri Ana Lucia. Estava na igreja, comprando lãs no Centro, na feira – era amiga dos feirantes, que utilizavam sua casa para almoçar e ir ao banheiro – , com as amigas num jogo de futebol, visitando alguém. Estava em todos os lugares, mas sempre no mesmo. Conforme pediu, Nilsa faleceu em casa, tranquilamente, aos 96 anos, no dia 6 de março deste ano. Ela deixa três filhas, sete netos e 14 bisnetos.

Nilsa era viúva de Neno, ídolo da torcida do Coritiba| Foto: Arquivo da família
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