Em alguma praça de Curitiba, um grupo de idosos se reúne para lembrar de como era a cidade no tempo deles. Descrevem os detalhes de cada rua, das edificações, falam de como “aquele bairro cheio de prédios na minha infância era tudo mato”. Por vezes, até levam fotos para que as lembranças fiquem mais vívidas ou para provar um ponto a algum amigo desconfiado da memória do outro. Com mais de 90 anos, Paulo Affonso Grötzner, colecionador de relíquias e bastião da memória urbana curitibana, não tinha mais muitos contemporâneos próximos para fazer essas sessões de prosa sobre o passado. Driblava essa falta natural causada pela longevidade compartilhando seu acervo e contando histórias da vida real para milhares de compadres e comadres na internet.
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“Ele repartia o acervo sem receber nada em troca, pelo puro prazer de ajudar. Era um arquivista no sentido perfeito da palavra”, comenta Paulo José da Costa, fundador do grupo do Facebook “Antigamente em Curitiba”, no qual Paulo Affonso matava a sede de animados nostálgicos ao disponibilizar, em pílulas, sua infindável coleção de fotografias, documentos e memorabilia. Além de auxiliar pesquisadores, jornalistas e estudantes a seguirem com suas escritas, ele mesmo compunha e reunia textos temáticos no formato de livros e postava online.
Entre as publicações independentes uma sobre a família por parte de pai, de origem alemã, chamada “A saga de um pioneiro” e outra sobre a família por parte de mãe, italianos, “Satori do Borguetto”. Já “O caminho do mar” é um relato das recordações de menino sobre o litoral paranaense na década de 1930. Ele mostra e descreve a paisagem de Caiobá em uma época em que poucas pessoas faziam o trajeto capital-litoral com frequência. Seu pai foi um dos primeiros a construir casa naquela praia. Paulo foi um grande colaborador da coluna Nostalgia da Gazeta do Povo, de Cid Destefani, jornalista falecido em 2015. “Sempre trocavam figurinhas sobre Curitiba”, relembra o filho Afonso Grötzner Neto.
Apesar de ter nascido em Curitiba, foi alfabetizado primeiro em alemão e dois anos depois aprendeu o português formal. Foi industrial e trabalhou na fábrica de biscoitos Lucinda, empresa da família e personagem recorrente em seus tesouros e recordações. Em outra empresa uma vez liderada por ele e depois passada para o comando do filho e do neto, permanece um pequeno museu particular criado por Paulo Affonso. Com a mesma minúcia na organização dos catálogos de fotos e documentos, lá ele exibia a coleção de relógios de parede, rádios antigos e toda a sorte de tecnologias do passado. “Tudo isso era uma arte para ele, organizar lembranças foi algo que fez a vida toda”, conta Afonso.
Para levar à tela do computador um trabalho tão esmerado quanto o que realizava à mão, com colagem e recuperação de papéis, investiu tempo em uma dezena de cursos para dominar as ferramentas tecnológicas mais atualizadas. Em casa, contava com equipamento completo para tal: scanner, impressora colorida de qualidade, computador e internet potentes. Seu passatempo preferido era conversar com as pessoas, e utilizou sua habilidade com as tecnologias para exercitar o gosto pela prosa de maneira virtual, cultivando uma comunidade de nostálgicos ao redor de si.
Paulo Affonso Grötzner morreu no dia 20 de abril, aos 95 anos. Deixa a esposa Luiza Regina Grötzner, um filho, duas netas, um neto e um bisneto.
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