Médico Clóvis Arns da Cunha, presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia.| Foto: Reprodução Facebook
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A recente disparada nos casos de coronavírus preocupa não apenas em Curitiba, mas em todo o Brasil. Por outro lado, a esperança vem ganhando força nos últimos dias com a aprovação e a chegada das vacinas mundo afora. Essa é a avaliação do presidente da Associação Brasileira de Infectologia (SBI), o médico curitibano Clóvis Arns da Cunha.

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Em relação ao aumento dos casos, Arns afirma que as medidas tomadas pelo governo do estado e prefeitura, em fechar bares e proibir a circulação de pessoas e o consumo de bebidas alcoólicas à noite deve ajudar a aliviar o quadro nos próximos dias. Enfatiza ainda que o início da vacinação nesta semana no Reino Unido, e a perspectiva de que a imunização chegue ao Brasil nos próximos meses, é a melhor notícia desde o início da pandemia. Segunda-feira (8), a prefeitura de Curitiba fechou acordo com o governo de São Paulo para receber a vacina chinesa Coronavac, produzida pelo Instituto Butantan no Brasil

Ao ponto de o médico fazer um apelo, em especial aos jovens. “O recado para a população é: aguente um pouquinho mais. Não vá a festas clandestinas de centenas de pessoas, barzinhos lotados. Já aguentamos nove meses no limite de todos nós, vamos aguentar mais um pouquinho”, pede o presidente da Sociedade Brasileira de Infectologia em entrevista à Gazeta do Povo. Confira:

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Qual é o momento agora da pandemia em Curitiba e no Paraná?

É um momento de grande desafio. Por outro lado, temos boas notícias. A perspectiva das vacinas é muito animadora, embora tenhamos um sinal de alerta pelo grande número de casos aqui em Curitiba, no Paraná e várias outras cidades do Brasil.
Duas dessas vacinas já terminaram a fase de avaliação e estão indo muito bem. Uma delas é a da Pfizer, que acaba de receber, no dia 2 de dezembro, a autorização de uso emergencial no Reino Unido, cuja vacinação começa essa semana. A vacina da Moderna deve seguir o mesmo caminho nos próximos dias. E temos outras: a da Oxford; a chinesa da Sinovac; e a da Janssen, que estão adiantadas da fase 3. Portanto, a mensagem é clara: temos vacinas eficazes chegando.

Mas o momento segue crítico.

O momento é crítico, sim. O número de casos aumentou muito em Curitiba e no Brasil, a ponto de continuar essa curva ascendente e não termos mais leitos e nem equipes de saúde para atender. Então o recado para a população é: aguente um pouquinho mais. Não vá para festas clandestinas de centenas de pessoas, barzinhos lotados, como estamos vendo. Os jovens têm que aguentar um pouquinho mais. Até a festa de família deve ser com poucas pessoas, de preferência em local arejado, com as janelas abertas e, até, se possível, em um lugar aberto, o que diminui muito o risco de infecção.
Além disso, qualquer pessoa que tenha sintomas de resfriado ou gripe não deve sair de casa. Deve se manter em isolamento até ser avaliado por um médico. Enfim, a mensagem tem que ser clara: aguentem mais um pouquinho. Se já aguentamos nove meses no limite de todos nós, temos que aguentar um pouco mais.

Esse recado vale especialmente para os jovens, não?

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Embora a Covid seja leve para a maioria dos jovens, ela pode sim se tornar grave. E há ainda o risco de esse jovem levar a doença a seus pais ou avós, pessoas de mais de 60 anos que têm 15% a 20% mais chance de morrer. Para ele, jovem, é menos de 1%. Então, a mensagem é de otimismo em relação às vacinas, mas de alerta em relação ao comportamento humano. Todos nós cidadãos devemos coibir aglomerações. Para isso, devemos orientar nossos filhos, netos, parentes, enfim, os jovens.
Quando conversamos com nossos pacientes com Covid, muitos foram infectados por jovens. Porque como para o jovem a forma é geralmente leve ou mesmo assintomática, ele não fica em casa, continua saindo, e aí fica transmitindo o vírus. É um momento de alerta e prudência o que vivemos.

Por que nós não estamos vivendo uma segunda onda?

A gente não considera segunda onda porque em Curitiba e no Paraná estávamos começando a diminuir o número de casos [em outubro] e de repente subiu. Então não dá nem para chamar de segunda onda, porque não tivemos nenhum período em que estivéssemos quase sem internamentos. Nos dois serviços privados que coordeno aqui em Curitiba continuamos, mesmo na situação de menos incidência de casos, a internar de três a quatro pacientes por dia. Hoje isso saltou para de oito a dez internamentos diários. Houve aumento realmente significativo, mas nunca deixamos de ter uma fase de poucas infecções como na Europa, que ficou praticamente sem casos. Lá, sim, dá para chamar de segunda onda. Mas, mais importante do que se estamos na segunda onda ou se a primeira não acabou, é a mensagem para o curitibano e o paranaense fazer a sua parte como cidadão: que ele se cuide.

Na sua opinião, o que ocorreu para termos essa retomada dos casos tão expressiva, lotando os leitos dos hospitais após acharmos que o pico tinha sido entre julho e agosto?

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O que aconteceu foi que, infelizmente, com a diminuição no número de casos, muitos jovens acharam que a pandemia havia acabado. Vimos bares lotados, festas noturnas lotadas, pessoal sem máscara, pessoal na fila sem o mínimo de distanciamento social, tudo o que a gente fala que é para evitar e não foi feito. Agora veio a conta. O coronavírus é que nem cartão de crédito: o que você gasta hoje, daqui alguns dias vem a cobrança.

O que o senhor achou das medidas restritivas tomadas pela prefeitura e governo do estado para frear a transmissão, como as proibições de abertura de bares, de circulação de pessoas e a venda de bebidas à noite?

Essa medida que o governo do estado e a prefeitura tomaram foi muito acertada. Essa situação do cidadão não poder sair de casa de noite evita de ele ir para festas e bares. Com isso, acho que em aproximadamente 10 dias vamos ver o número de casos cair novamente.

A falta de profissionais de saúde para atuar na pandemia voltou a ser uma preocupação.

A falta de profissionais é o fator mais limitante que temos, tanto no serviço público, quanto no privado. Esse é o principal desafio. E não só médicos, mas enfermeiros, fisioterapeutas, esse trio que faz o cerne do atendimento ao paciente com Covid. Em um dos serviços privados que coordeno somos 40 médicos e alguns contraíram Covid e ficaram 10 dias afastados. Isso com todos nós sobrecarregados, trabalhando 12, 14, 16 horas por dia, emendando o plantão noturno com o plantão diurno. Nós todos, médicos e profissionais de saúde, estamos muito no limite porque não é fácil você ter pacientes de Covid morrendo, alguns relativamente jovens, alguns colegas nossos morrendo. Todos os pacientes são igualmente importantes, mas quando você vê um colega que estava na batalha perder a vida, isso do ponto de vista emocional das equipes é muito impactante, muito doído. Igualmente é perder paciente em qualquer situação. Mas quando você perde um idoso de 90 anos, com mal de Alzheimer, numa fase de cuidados paliativos, você pensa “descansou”. Mas quando você perde um paciente de 50 anos ou de 40 anos, isso impacta muito a gente.

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Estamos chegando no Natal. O movimento de pessoas nas compras preocupa?

Aquele comerciante, aquele industrial que está fazendo a lição de casa não deve ser punido. Hoje na maioria dos supermercados, na maioria dos shoppings há todas as medidas preventivas adequadas: distanciamento físico, com marcações na fila, todas as pessoas de máscara, álcool em gel à vontade... Eu não acho justo esse comerciante que fez a lição de casa ser punido. Por outro lado, aquela situação de bares que não controlaram seus frequentadores e deixaram as pessoas entrarem sem máscara, sem distanciamento físico, isso deve ser punido com o fechamento desses estabelecimentos. Porque o comportamento de quem frequenta e o comportamento do dono do bar, da festa, faz com que não só eles, mas todos nós possamos precisar de internamento.

Na minha visão não é só o poder público, não é só a Polícia Militar que tem que ir lá punir esses bares que não estão cumprindo as medidas de segurança sanitária. É dever de cada cidadão fazer sua parte. Na Europa, muitos países voltaram ao lockdown. Então para evitar que isso aconteça, cada um tem que fazer sua parte, sem precisar que a fiscalização ou a polícia tenha que interceder. Nós todos, na nossa família, nos nossos grupos de amigos, nos nossos grupos de WhatsApp, temos que colocar essa situação. Além disso, é importante um pacto de ouro: qualquer pessoa que tenha sintomas de resfriado ou gripe fique imediatamente em casa em isolamento respiratório, se isole da família, fique sozinho no quarto. Para fazer o exame você tem vários dias, mas se teve resfriado ou gripe fique imediatamente sozinho isolado no quarto. Teve tosse, febre, coriza, dor no corpo, não precisa esperar resultado do exame para se isolar.

O que o senhor recomenda para as festas de fim de ano?

Primeiro, evitar aglomerações. A festa de família deve ter núcleo pequeno. Se for uma casa grande, 10, 12 pessoas no máximo e desde que possam manter o distanciamento social o tempo todo, principalmente na hora de comer, em que a gente tira a máscara. Tem que usar a máscara sempre que estiver com outras pessoas, usar o álcool em gel ao colocar e tirar a máscara e em qualquer manipulação de objetos. O que temos visto: gente com Covid confirmada que continua fazendo corrida de Uber, continua indo no supermercado, na farmácia, sendo que hoje temos todos os atendimentos de delivery pra comida, farmácia, tudo que a pessoa não precisa para não sair de casa e expor a doença a outras pessoas.

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O senhor está otimista com as vacinas?

Temos de ressaltar a importância de cada um fazer a sua parte, mas também temos que ser otimistas. Ainda tem um caminho a percorrer, mas agora essa perspectiva é de poucos meses. Para quem está há nove meses sofrendo com essa pandemia, ter a perspectiva da vacina no Brasil daqui dois, três meses, talvez até antes, é uma excelente notícia.

Como o senhor tem visto o tratamento da Covid-19 com medicamentos não comprovados cientificamente?

Nós, da Sociedade Brasileira de Infectologia, que representamos mais de mil médicos infectologistas pelo país, concordamos de usar os protocolos internacionais. Todos esses protocolos mostraram que, infelizmente, todos os estudos do tratamento precoce não têm impacto na evolução da doença. Usar hidroxicloroquina, ivermectina, zinco, ozônio retal e todas essas situações não comprovadas em estudos clínicos não diminuem as chances de contrair Covid grave. Adoraríamos que esses medicamentos dessem certo, mas eles não reduzem a possibilidade de o paciente morrer. Já vi médicos que não são especialistas dizendo “quem usar hidroxicloroquina ou ivermectina não vai evoluir mal”. Quero dizer que mais da metade dos pacientes graves que internam nos dois serviços que coordeno estão usando essas medicações. Ou seja, o médico que prescreve essa medicação no começo do tratamento, talvez até por questão ideológica, não segue acompanhando o paciente quando o quadro vira uma pneumonia com hipóxia, que é a falta de oxigênio.

Esse médico lá do começo não vai atender o paciente no estado grave – ou porque ele não fica sabendo do estado grave ou porque joga o paciente para outro médico. E depois ele vem na mídia e fala “eu tenho experiência de mil pacientes em que usei a hidroxicloroquina e foram bem”. É mentira! Por que a hidroxicloroquina dele funciona e a dos outros médicos, cujos pacientes estão batendo na porta dos hospitais, não funciona? De junho para cá, dezenas de estudos clínicos mostraram que esses remédios não funcionam, a ponto de nos Estados Unidos quem prescrever hidroxicloroquina fora do estudo clínico poder ser punido por má prática da medicina. O que os Estados Unidos fizeram? Doaram dois milhões de comprimidos de hidroxicloroquina para o Brasil, porque lá ninguém mais está usando. Portanto, é importante esclarecer que quando a população tem a hipóxia, tosse e outros sintomas da Covid, a gente recomenda usar o oxímetro.

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Como a pessoa deve usar o oxímetro se tiver suspeita de Covid-19?

Na fase inicial, o paciente toma remédio para se sentir melhor, são analgésicos, remédios para febre. E a partir de então ele deve fazer o acompanhamento com o oxímetro digital, principalmente pacientes com mais de 60 anos ou que tenham outras doenças que possam levar à Covid grave, como diabetes, pressão alta, obesos, problemas pulmonares ou renais crônicos.

Com esse aparelhinho, o paciente consegue medir sua oximetria digital, que permite ver se você está ou não saturando bem, se você tem ou não hipóxia. Quando a saturação estiver em 95% ou mais, a pessoa pode ficar em casa. Na hora em que abaixar para 94% ou menos, a pessoa deve procurar um médico, que vai ver fazer tomografia ou outros exames para ver como está a oxigenação, a gasometria arterial e aí, sim, internar esse paciente no primeiro sinal de hipóxia, que acontece entre o quinto e o nono dia da doença. Com oxigenoterapia e dexametazona a maioria dos nossos pacientes está evoluindo bem. Para ter uma ideia em números: todos os dias damos de cinco a seis altas hospitalares de pacientes que, ao fazerem esse acompanhamento com o oxímetro digital, não precisaram de UTI, de ventilação mecânica.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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