Anos antes de uma talentosa turma de urbanistas, liderada por Jaime Lerner, tornar o planejamento urbano uma das maiores marcas de Curitiba, as raízes que permitiram à cidade chegar a esse patamar estavam sendo plantadas. Na década de 1950, um militar com bom trânsito político assumia, pela primeira vez pelo voto direto, o cargo de prefeito da capital paranaense, investindo, sobretudo, em um novo olhar para o planejamento e em ações que anos depois melhorariam – e muito – a mobilidade urbana.
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Nascido na Lapa em 1917, Ney Aminthas de Barros Braga é hoje lembrado como uma das maiores forças políticas da história paranaense, principalmente pelos dois mandatos de governador. Mas, até a década de 1950, sua trajetória parecia seguir um caminho diferente: o militar. Ele construiu uma carreira sólida nas Forças Armadas. De família tradicional no estado, frequentou a Escola Militar do Realengo, uma das mais importantes do Rio de Janeiro, de onde saiu aspirante, em 1937.
Nos anos de Segunda Guerra, saltou de patentes no Exército, sempre alternando sua vida entre o Paraná e o Rio de Janeiro. Na entrada dos anos 1950, já era major e, desta vez, bem estabelecido em Curitiba.
Graças a um cunhado ilustre, sua trajetória começou a mudar de direção. A entrada de Ney Braga na política teve o apadrinhamento de Bento Munhoz da Rocha, ex-governador do estado. Logo após assumir o Executivo estadual paranaense, em 1951, Munhoz da Rocha convidou Ney Braga para ser seu chefe da polícia do estado – um posto semelhante ao que hoje é o de secretário de Segurança Pública. Ele aceitou e, em 1952, era oficializado no cargo.
Com o fim do Estado Novo (regime autoritário implementado no Brasil pelo presidente Getúlio Vargas), o cargo de prefeito se tornou elegível – a alteração foi oficializada com uma emenda à Constituição de 1946. No Paraná, no entanto, a eleição só foi regulamentada pela Constituição estadual em 1952 e colocada em prática para valer na eleição de 1954. Com isso, em vez de o prefeito ser escolhido por indicação do governador, como em anos anteriores, passou a ser eleito por voto popular, nos moldes do que conhecemos hoje.
A posição de destaque na comunidade foi fundamental para que Ney Braga chegasse, enfim, ao cargo de maior representatividade no município, diz o historiador Mauro da Silveira. “Ney Braga era conhecido na cidade. Tinha posição de respeito e o apoio importante de Munhoz da Rocha, que o tornou político de fato. Naquela Curitiba, de pouco mais de 200 mil habitantes, esses eram requisitos muito valorizados. Ainda que não tivesse um nome tão forte na política, sua campanha ficou mais fácil”, descreve.
Em seu livro “Religião e Política – A Liga Eleitoral Católica e a participação da Igreja nas eleições de 1954”, o historiador Renato Carneiro defende ainda que o apoio da comunidade católica a Ney também teve papel fundamental em sua eleição. Na época, ele sustenta, o político ressaltava valores cristãos e conseguiu atrair o eleitorado curitibano – 92% da população paranaense era católica neste período.
Naquele outubro de 1954, Ney Braga venceu com pouco mais de 18 mil votos (quase 30%). Na disputa, bateu rivais políticos como Wallace Tadeu de Mello e Silva, o segundo colocado, que ficou com 11 mil (cerca de 18%). Mello e Silva é pai do ex-senador Roberto Requião (MDB).
O prefeito assumiu a gestão municipal no dia 15 de novembro de 1954, substituindo o então indicado à prefeitura Ernani Santiago de Oliveira. Ele permaneceu à frente do município até 1958.
Mudanças urbanas e no transporte
Em sua gestão, Ney Braga chegou a ser premiado, em 1957, pelo Instituto Brasileiro de Administração Municipal (IBAM). O órgão elegeu a capital paranaense como a de maior progresso no país. Muito por causa de políticas desenvolvimentistas que implementou por aqui. Melhorou os cadastros fiscais do município, elevando a arrecadação, deu atenção a regiões mais periféricas, eletrificou bairros e criou o Departamento de Planejamento e Urbanismo – anos depois, na gestão do prefeito Ivo Arzua Pereira (1962-1967), o órgão se transformou no conhecido Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc).
Sobre essa preocupação com o plano urbano, o próprio Ney Braga falou em 1998, em entrevista ao jornalista José Wille. “A primeira coisa que eu fiz foi convidar para vir aqui o Prestes Maia, que tinha sido prefeito de São Paulo e era um grande urbanista. Ele veio, sobrevoou Curitiba e disse ‘Ney, você precisa ter cuidado com os fundos dos vales em Curitiba’. Aí eu entendi bem o problema e contratei uma empresa de São Paulo (...). Criamos um centro de planejamento urbanístico, que depois o Ivo Arzua transformou no IPPUC. E junto com esse pessoal de planejamento, que era o Mário de Mari, Fanchetti Rischbieter, o Dario Lopes dos Santos, o Alípio Aires de Carvalho, fizemos o plano da cidade de Curitiba, adaptando o Plano Agache, que vinha desde muitos anos antes, mas não estava sendo praticado por causa do custo e porque Curitiba já havia fugido um pouco do plano original. Então, conseguimos fazer o planejamento da cidade, que depois outros prefeitos aperfeiçoaram”, disse.
Braga também melhorou o sistema de transporte da capital. Com uma estratégia de concessão das linhas de ônibus, ele cedia trajetos mais lucrativos junto com trajetos pouco utilizados, equilibrando o serviço. “Nós dávamos o recurso de acordo com o rendimento”, relembrou na entrevista citada anteriormente. Surgiram, a partir daí, mais linhas com horários fixos. Além disso, a prefeitura pavimentou as estradas de acordo com os itinerários do transporte coletivo.
Durante a gestão de Ney Braga, foram inaugurados dois ícones da cidade: o Mercado Municipal e a antiga rodoviária, que hoje é o Terminal Guadalupe (em 1972, a rodoviária foi transferida para a instalação atual, na Avenida Presidente Affonso Camargo).
Liderança estadual
A prefeitura de Curitiba foi apenas o primeiro passo de Ney Braga em sua trajetória como líder político. Influente, ele foi, mais tarde, deputado federal, senador e governador do Paraná. À frente do estado, teve papel fundamental em políticas de modernização. Também exerceu cargos no governo federal nos anos da Ditadura militar, chegando às pastas da Agricultura e Educação.
Ele faleceu em 2000, aos 83 anos.
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