Em meados de 2014, Fabiano Kochan, morador da pequena cidade de Nova Aurora, no oeste do Paraná, se encontrava em uma situação financeira complicada. Uma dívida contraída após a internação de uma das filhas por um longo período em uma UTI tinha desequilibrado as contas da família. Trabalhador na limpeza pública da cidade, ele saía de casa muito antes do início da jornada de trabalho para tentar juntar latinhas de alumínio como forma de complementar a renda da família.
“Eu não estava conseguindo quitar essa dívida, e na época trabalhava como gari aqui em Nova Aurora. Não tinha dinheiro para arcar com essas despesas todas da casa, e por isso além de varrer as ruas eu via nas latinhas um jeito de fechar o final do mês. Mas era difícil o mês em que eu conseguia”, revelou à Gazeta do Povo.
Kochan tentou então a sorte como trabalhador nas lavouras da região, em empreitadas por dia, mas mesmo com todo o esforço o resultado não foi o esperado. Foi quando decidiu investir os poucos recursos que tinha em uma última opção, a criação de peixes em um pequeno sítio de seu pai. “Comecei com seis tanques de peixe, mas no começo era tudo muito difícil. Para quem já tem dinheiro, as coisas são mais fáceis, e a gente não tinha nada”, lembrou o piscicultor.
O ponto de virada na história de Kochan foi a parceria formada com uma cooperativa da região. “Foi um começo muito difícil, mas fomos fazendo no nosso ritmo, devagar. Conseguimos financiar um pouco de dinheiro em cima desse sítio do meu pai. A Copacol ajudou a gente com os aeradores para a água, e nós combinamos que o pagamento seria feito a cada lote de peixes que fosse saindo da propriedade”, contou.
Oito anos se passaram, e agora o piscicultor conta com 12 tanques de produção de tilápias juvenis – é a primeira etapa da criação, onde os alevinos se desenvolvem para depois serem encaminhados às estações de engorda. “Tem que juntar uns quatro alevinos para dar um grama de peso. Depois do nosso trabalho aqui, meu e do meu pai, eu entrego esses peixes com uma média de 80 a 100 gramas cada um para a próxima etapa, que é quando esses peixes ganham peso e vão para o abate”, explicou.
IDH mede a qualidade de vida das regiões
A história do piscicultor está longe de ser uma exceção dentro das áreas de atuação das cooperativas no Paraná. Um estudo feito pelo economista Daniel Nojima, e publicado na Revista Paranaense de Desenvolvimento – uma publicação do Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes) –, mostra que, especificamente nos municípios de menor porte, há fortes indícios de que a atuação das cooperativas colabora ativamente no desenvolvimento local.
O pesquisador utilizou em seus estudos os dados mais recentes disponíveis do Índice de Desenvolvimento Humano Municipal (IDHM), de 2010. A escala, que vai de 0 a 1, foi a forma encontrada pelo Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (PNUD) para tentar mensurar o nível de desenvolvimento de uma determinada região.
No ranking de países, a Noruega está no topo da tabela com um IDH estimado em 0,957. O Brasil ocupa a 84ª posição da lista, com um IDH de 0,765. O Paraná tem um índice geral um pouco abaixo do IDH nacional, com 0,749. No estado, o município com maior Índice de Desenvolvimento Humano é Curitiba, com uma nota 0,823 – um IDH maior do que o de países como o Uruguai.
No cálculo do IDH, as Nações Unidas levam em conta três componentes. O primeiro é a longevidade, e atribui notas mais altas para regiões com maior expectativa de vida ao nascer. O segundo é a educação, e busca identificar quais são as regiões onde há maior percentual de adultos alfabetizados e onde há maior índice de escolarização, desde o ensino infantil até a pós-graduação. Por fim é avaliada renda per capita das pessoas e seu impacto no poder de compra. E é justamente neste ponto que a presença das cooperativas parece fazer diferença nas cidades, segundo o estudo do economista.
“Os exercícios revelam indícios da existência, de fato, dessa relação [entre a presença das cooperativas e o aumento da renda], sendo possível argumentar sobre um processo complementar entre avanço das cooperativas e o conjunto de outras atividades e, em última análise, sobre as condições gerais de bem-estar”, avaliou Nojima.
Cooperativas são as maiores empresas em uma a cada três cidades do Paraná
A relação à qual o pesquisador se refere está presente, de forma ainda mais pronunciada, em uma a cada três cidades paranaenses. Dados da Ocepar mostram que dos 399 municípios do estado, em 130 deles a maior empresa é uma unidade de cooperativa – sede, entreposto ou indústria.
“Este cenário faz com que as cooperativas estejam intimamente ligadas à geração de empregos diretos e indiretos. Há também os recursos que os cooperados obtém a partir da venda da produção e de todas as atividades realizadas junto à cooperativa. Não podemos nos esquecer do retorno do dinheiro recebido na participação dos resultados, que é gasto no município e na região, assim como a arrecadação de tributos. Tudo isso contribui para essa melhoria”, avaliou Flávio Turra, gerente de Desenvolvimento Técnico da Ocepar.
Nas pequenas cidades esse efeito é visto com ainda mais clareza, apontou Turra. “Se nós pegarmos um exemplo de um pequeno município onde se instala uma indústria, um abatedouro, um frigorífico. É natural que as pessoas daquela cidade sejam as primeiras a buscarem essas vagas de emprego, mas pode ser que outras venham de fora. Com mais gente chegando na cidade, também é natural que haja uma melhoria na estrutura geral desse município. Vai abrir mais um restaurante, mais uma lanchonete. Se antes tinha só um posto de saúde, pode haver demanda para abrir um hospital. Pode ser que aumente as vagas nas escolas. E isso vai ser bom não só para os cooperados ou funcionários, vai beneficiar a cidade como um todo”, disse.
Comparativo entre IDHM de cidades com e sem cooperativas instaladas:
- Marechal Cândido Rondon (Copagril): 0,774
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,700
- Palotina (C.Vale): 0,768
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,691
- Medianeira (Frimesa): 0,763
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,728
- Campo Mourão (Coamo): 0,757
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,710
- Mandaguari (Cocari): 0,751
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,697
- Cafelândia (Copacol): 0,748
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,662
- Carambeí (Frísia): 0,728
- Média entre cinco cidades de porte similar: 0,680
Copacol é a origem de 80% dos impostos arrecadados em Cafelândia
Uma dessas cidades onde as cooperativas são a mola propulsora da economia é Cafelândia. Com pouco mais de 18,7 mil habitantes, o município tem na sede da Copacol – a cooperativa parceira do piscicultor Fabiano Kochan – a origem de mais de 80% dos impostos recolhidos localmente.
E é o investimento desses impostos, como destacou Valter Pitol, presidente da Copacol, que alavanca as ações e melhorias que acabam por beneficiar toda a cidade. O IDHM do município é de 0,748, um índice 13% maior do que a média de cinco cidades paranaenses de mesmo porte, mas sem a presença de cooperativas.
“Nas estradas rurais, por exemplo, isso é muito fácil de ser percebido”, contou Pitol. “As propriedades que antes corriam o risco de ficarem isoladas por conta de chuvas, agora contam com estradas cobertas com pedras irregulares, e em alguns casos até com asfalto. Isso é um trabalho feito pela prefeitura, com recursos oriundos desses impostos, e é um benefício para a toda sociedade e que acaba voltando para a própria cooperativa. Com uma estrada melhor, os caminhões não correm o risco de ficarem parados em valetas ou atolados na lama. Isso gera previsibilidade nas entregas de aves e suínos para as indústrias, e reduz a ociosidade, que para a indústria é sinônimo de prejuízo”, apontou.
Em Palotina, cooperativa C.Vale reduziu dependência do "bom humor" do clima
Outro município que era totalmente dependente do bom humor climático é Palotina, onde está instalada a sede da cooperativa C.Vale. “Uma frustração pelo clima derrubava as vendas do comércio, reduzia muito os negócios”, lembra Alfredo Lang, presidente da cooperativa, sem muita nostalgia. Por lá, o IDHM é de 0,768, 11% maior do que a média de cinco municípios de porte similar sem a presença de cooperativas, que é de 0,691.
O cenário, apontou o presidente, mudou a partir de 1997, quando o complexo de produção avícola da C.Vale começou a funcionar na cidade. A renda oriunda da avicultura passou a circular entre produtores cooperados e funcionários do frigorífico, e ajudou a mudar o cenário da cidade.
“Os benefícios foram crescendo à medida em que ampliamos a produção de frangos. O volume de recursos que passou a circular aumentou muito, e alavancou as vendas do comércio. O pessoal investiu, melhorou as lojas, os restaurantes. Os imóveis se valorizaram, a cidade se expandiu extraordinariamente. Locais rurais que antes eram lavouras de soja perto da cidade viraram áreas urbanas, bairros”, citou Lang.
Parceria mudou a vida da família do piscicultor
O piscicultor Fabiano Kochan se orgulha das conquistas obtidas em parceria com a cooperativa. As cifras astronômicas voltaram, mas agora são números que não assustam mais a família. Com a estrutura que já possuem, eles produziram cerca de 5 milhões de peixes em 2021. A dívida já foi quitada, e agora o produtor pode focar seus esforços e recursos para ampliar ainda mais a produção.
“Temos um sistema de energia solar e estamos projetando mais investimentos, que vão nos permitir uma produção de mais de 6 milhões de tilápias por ano. Hoje eu tenho minha casa, temos um grande barracão, geradores, toda uma estrutura de verdade para a produção de peixes. Cada ano a propriedade vem recebendo mais e mais investimentos, e com isso vamos crescendo também a cada ano. Olhando para trás, eu ainda não acredito no tamanho da nossa vitória. E eu sou muito agradecido porque tudo foi feito em parceria com a cooperativa, porque se não fossem eles eu não sei como minha família estaria hoje”, comemorou.
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