Após quase duas décadas em estudo, a construção de uma nova sede para a Câmara Municipal de Curitiba pode sair do papel no ano que vem. Listada entre as metas do município na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2020, aprovada nesta semana, a edificação deve ganhar projeto até o segundo semestre deste ano, segundo o presidente da Casa, Sabino Picolo (DEM).
Uma emenda ao projeto da LDO apresentada pela Comissão Executiva da Câmara e aprovada pelo plenário em meio a críticas prevê que parte dos recursos venha de um fundo financeiro, ainda a ser criado, alimentado com eventuais repasses não utilizados pela Casa ao fim do ano legislativo.
A ideia de implantar uma nova sede para o Legislativo municipal se arrasta pelo menos desde 2002. Na época, na gestão de João Claudio Derosso na presidência da Câmara, o Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) chegou a projetar um prédio que ocuparia a área de estacionamento entre os anexos I e II, nos fundos do Palácio Rio Branco.
O novo imóvel, previsto na LDO com 9.990 metros quadrados, abrigaria o plenário, hoje em funcionamento no Palácio Rio Branco, e os gabinetes dos 38 vereadores, atualmente distribuídos em dois diferentes anexos da Casa. “Queremos que Curitiba tenha uma Câmara à altura da grandeza da cidade”, diz Picolo. Ainda não há uma estimativa de custos para o empreendimento, mas na última vez que se tocou no assunto, em 2016, o Legislativo municipal esperava a aplicação de R$ 58,5 milhões na obra.
A intenção ainda é utilizar o espaço para o novo prédio, mas a arquiteta Célia Regina Bim, coordenadora de projetos do Ippuc, afirma que a proposta deve ser totalmente refeita. “Os vereadores vão elaborar um novo escopo de necessidades para darmos andamento a esse estudo”, diz. Além do prédio histórico, que não pode ser modificado por ser tombado, a arquiteta conta que pretende manter os prédios anexos já existentes. “Nossa ideia é que o projeto se integre a eles”, diz. “Mas tudo ainda é preliminar e pode haver mudanças de planos.”
O diretor-geral da Câmara, Daniel Dallagnol, considera que a atual estrutura da Casa não atende mais as necessidades do Legislativo. Ele lembra que as galerias do Palácio Rio Branco precisaram ficar interditadas por mais de um ano após uma manifestação de servidores contrários à aprovação de um pacote de ajuste fiscal proposto pelo prefeito Rafael Greca (DEM), em 2017.
Após o protesto, por causa da presença de pessoas acima da capacidade permitida no local, a Comissão de Segurança de Edificações e Imóveis (Cosedi) da Defesa Civil de Curitiba e o Corpo de Bombeiros constataram “deslocamento da estrutura do assoalho junto das paredes de sustentação”.
“Fica difícil justificar à população a proibição de entrar muita gente. É a Casa do Povo, afinal”, diz Dallagnol. O Corpo de Bombeiros permite hoje a presença de 148 pessoas no prédio histórico da Câmara – 120 no piso do plenário e 28 nas galerias. Considerando que sempre estão no imóvel vereadores, jornalistas, assessores e demais funcionários da Casa, o acesso de populares acaba muito restrito.
Para o presidente da Câmara, a atual sede não dispõe de segurança para “votações polêmicas”. Picolo lembra que, ainda na discussão do pacote de ajuste fiscal de 2017, os vereadores mudaram o local de votação para a Ópera de Arame por considerarem haver risco à integridade física dos parlamentares. “[O prédio atual] é muito vulnerável para os dias de hoje. Quando foi construído, 120 anos atrás, a situação era outra.”
Sem consenso
Líder da oposição na Câmara, a vereadora Noemia Rocha (MDB) é contrária à iniciativa. “Diante do momento que vive o país em relação à questão financeira, na minha leitura não é uma prioridade”, avalia. “Especialmente em meio à falta de recursos para a saúde e para a educação.”
Para a vereadora, a atual estrutura é suficiente para abrigar as atividades legislativas do município. “Há momentos pontuais em que falta espaço para a participação popular, mas são casos excepcionais”, diz. Ela explica que a posição é pessoal, uma vez que não há consenso na bancada de oposição a respeito do tema.
Já Tico Kuzma (Pros) adota um discurso que fica no meio do caminho. Na votação da emenda à LDO que criaria um fundo financeiro para subsidiar a construção do novo prédio, ele se manifestou contrariamente. “É importante que o dinheiro que sobra seja investido na cidade”, diz. “Se a mesa [executiva] optasse pela construção baseada em uma parceria público-privada [PPP], utilizando os imóveis que a Câmara já tem, teria meu apoio.”
Segundo secretário da Casa, Professor Euler (PSD), explica que ainda não há uma definição sobre o modelo de contratação da obra. “A prioridade é tentar fazer a construção sem que seja usado recurso público”, afirma. “O fundo é para que, caso a PPP não consiga cobrir todos os custos, a Câmara tenha recursos. A gente não pode ficar sem alternativa diante das vontades do executivo.”
Na primeira discussão da LDO em plenário, dos 38 vereadores, 18 votaram favoravelmente à emenda que prevê a desobrigação de devolver ao executivo a verba não utilizada pelo legislativo. A própria base da prefeitura não orientou voto de seus membros. Quatro parlamentares votaram contrariamente e três se abstiveram, enquanto 13 não se posicionaram oficialmente – o presidente da Casa votaria apenas em caso de empate.
A proposta da LDO de Curitiba, que prevê um orçamento de R$ 9,43 bilhões para 2020, ainda não traz uma estimativa de recursos que serão destinados para a meta de construção do imóvel, uma vez que os valores devem ser definidos apenas na Lei Orçamentária Anual (LOA), analisada no fim do ano. Documento da secretaria municipal de finanças apresentado em audiência pública no último dia 13 prevê que 1,99% das despesas do município correspondem à rubrica ‘Legislativo’.
Além da construção da nova sede, estão entre as linhas de destinação de recursos do orçamento de 2020 do legislativo: a aquisição e reposição de equipamentos e material permanente, a execução de reformas e melhorias na Câmara, a manutenção da estrutura funcional e das atividades político-parlamentares e a manutenção da Escola do Legislativo, unidade que promove ações de qualificação profissional na Casa.
Idas e vindas
Desde o primeiro projeto feito pelo Ippuc em 2002, o novo imóvel para as atividades dos vereadores de Curitiba avançou e recuou diversas vezes. Em 2009, ainda presidente da Casa, João Claudio Derosso criou o Fundo Especial da Câmara Municipal de Curitiba (FEC), para o qual passou a destinar anualmente recursos economizados do orçamento com o objetivo de utilizá-los futuramente para a construção da nova sede. O FEC funcionava de maneira semelhante ao fundo previsto na emenda à LDO aprovada pelos vereadores.
Em junho de 2016, já sob a administração de Ailton Araújo (PSC), o valor acumulado, no total de R$ 58,5 milhões, foi repassado à prefeitura, à época sob gestão de Gustavo Fruet (PDT). “Estamos devolvendo esses recursos para que nenhum funcionário público do município fique sem o 13º salário nessa época de crise da economia global”, disse Araújo na ocasião.
O repasse foi feito com o compromisso, previsto em lei, de que o Executivo iniciaria a construção de um imóvel destinado à nova sede em até dois anos e que concluiria a obra em até quatro anos. Ou seja, a responsabilidade ficava para o prefeito seguinte, Rafael Greca, que viria a ser escolhido nas eleições de outubro daquele ano. Segundo a Lei 14.870/2016, para a execução da obra, a prefeitura atualizaria o repasse de R$ 58,5 milhões com base no indicador de custo unitário básico (CUB) do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Paraná (Sinduscon-PR).
No início do mandato de Greca, em 2017, entretanto, uma nova lei aprovada pela Câmara modificou o texto, retirando o compromisso de construir o prédio. Na época, o então primeiro-secretário, Bruno Pessuti (PSD), apontou a crise econômica como justificativa para propor a revogação do dispositivo. A mesa executiva, então sob a liderança de Serginho do Posto (PSDB), era contrária à ideia de construir um novo prédio.
Mas, no final do mesmo ano, o projeto voltou à agenda quando Greca decidiu incluir a construção da nova sede da Câmara no Plano Plurianual 2018-2021. Eleito para a presidência da Casa no fim de 2018, Picolo, entusiasta da ideia, acordou com o prefeito a previsão da obra na LDO de 2020. “Dá para ter um projeto no segundo semestre deste ano para definir uma estimativa de custos e incluir na LOA”, diz o atual presidente da Câmara.
Estrutura fragmentada
Hoje as 527 pessoas que trabalham na Câmara, entre vereadores e servidores concursados e comissionados, ficam lotados em cinco diferentes edificações, que somam 7.786 metros quadrados de área construída.
Enquanto as sessões plenárias e solenes são realizadas no Palácio Rio Branco, os gabinetes dos parlamentares ficam distribuídos entre os Anexos I e II, prédios independentes, localizados na mesma quadra, onde funcionam ainda alguns setores administrativos.
Outras atividades se distribuem no Anexo III, localizado na quadra em frente ao Palácio Rio Branco, e no Anexo IV, que fica na Rua Barão do Rio Branco, entre a Av. Visconde de Guarapuava e a Rua André de Barros.
A quadra onde fica o Anexo III é uma alternativa cogitada para a construção do novo prédio. A ideia, no entanto, tem poucas chances de ir para frente, já que dependeria de uma permuta com a iniciativa privada para anexação de um terreno.
A proposta fica ainda mais difícil de prosperar porque, além de haver na área construções tombadas que precisariam ser mantidas, o imóvel do Anexo III, que pertencia à antiga garagem de bondes da cidade, é de propriedade da prefeitura, que tem planos de implantar um terminal de ônibus no local.
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