Em 5 de janeiro de 2020, a obra do campus da Universidade Federal da Integração Latino-Americana (Unila), na cidade paranaense de Foz do Iguaçu, deve completar cinco anos de abandono, já que ainda não foi anunciada uma solução definitiva para o “esqueleto” deixado por ali (mais de 40% da obra contratada), em uma área de quase 380 mil metros quadrados (380.699,72 m²), que foi doada pela Itaipu Binacional, e está localizada ao lado da entrada da hidrelétrica. Há, contudo, uma negociação em andamento, em fase avançada. O Ministério da Educação (MEC) confirma que, no cenário atual, a ideia é que a hidrelétrica assuma inteiramente a obra, um dos últimos projetos do arquiteto brasileiro mais famoso no mundo, Oscar Niemeyer (1907-2012).
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Na negociação em andamento, Itaipu daria continuidade à construção, mas com possibilidade de modificação do projeto original, para que ele fique adequado a uma nova finalidade – ainda não divulgada. “A Itaipu pode fazer ali um parque tecnológico, por exemplo. As tratativas vêm sendo feitas no sentido de fazer uma espécie de permuta. Itaipu se compromete a assumir a continuidade da obra e, em contrapartida, levando em consideração aquilo que já foi investido, ela devolverá para Unila uma quantia em patrimônio imobiliário”, explica Weber Gomes de Souza, coordenador de Planejamento e Orçamento das Instituições Federais de Ensino Superior, do MEC. Dois imóveis já estariam no radar. Atualmente, a Unila está espalhada em locais alugados.
Na prática, se a negociação entre Itaipu e Unila for concluída, o conceito original do projeto, pensado para reunir toda a vida universitária em um só espaço, não mais se aplicaria. “Eu não acredito que seria um problema. Acaba sendo comum em várias universidades terem vários campi no mesmo município. Eu acredito que seja uma questão menor. E para a Unila é interessante ter uma estrutura mais próxima da sua realidade de manutenção. A gente vê como uma boa solução para o empreendimento. É um projeto belíssimo, mas muito caro para a realidade da Unila hoje”, justifica Gomes de Souza, na entrevista que concedeu à Gazeta do Povo, no último dia 17.
Hoje nas mãos da gestão Jair Bolsonaro (PSL), a Unila foi fundada em 2010, no final da gestão Lula (PT), para formar uma “nova consciência política na América Latina”, nas palavras do petista. “Eu tinha quase que uma obsessão de criar uma universidade latino-americana (...). Já está pronto o projeto para a licitação do prédio da universidade, mas, enquanto o prédio não vai aprontando, aqui cabem pelo menos uns 4 mil alunos, e a gente espera que no ano que vem já tenha guatemalteco aqui, já tenha hondurenhos aqui, já tenha salvadorenhos aqui, já tenha cubanos aqui, já tenha chilenos aqui, já tenha equatorianos aqui (...). Não é porque o prédio não está pronto que a gente não vai fazer com que a América Latina vá se integrando aqui”, discursou Lula, em Foz do Iguaçu, durante aula inaugural da Unila, em 2 de setembro de 2010.
Atualmente, de acordo com a Unila, são 4.720 alunos (1.362 estrangeiros) matriculados nos 29 cursos de graduação, além de 763 estudantes de pós-graduação, distribuídos em 12 mestrados, 7 especializações e 1 doutorado. As aulas acontecem em quatro unidades, em diferentes endereços.
No mês passado, a Unila aprovou um “plano inicial de edificações”, uma espécie de plano diretor, prevendo a construção de dois prédios próprios, em um terreno localizado na Avenida Tancredo Neves, onde já está sendo construído um alojamento estudantil para a universidade. Mas a Unila não fala ainda em valores e trata do assunto – dois prédios - de forma paralela à negociação com a Itaipu.
“Unila e Itaipu retomaram negociações a respeito da obra do campus. A postura das duas instituições é de estudar conjuntamente todos os cenários para buscar uma solução no curto prazo, que atenda às necessidades de infraestrutura da universidade, levando em consideração o cenário orçamentário atual”, resume a Unila.
O projeto todo do campus, de acordo com a Unila, é calculado em R$ 800 milhões. Já a retomada da obra agora, que já atingiu mais de 40% do projeto, demandaria mais R$ 350 milhões.
O que diz a Itaipu
Procurada pela reportagem, a Itaipu limitou-se a informar que desde 2017 está em curso uma negociação para o distrato da doação do terreno doado à Unila. “As negociações foram paralisadas em 2018, pois não se chegou a um consenso sobre os valores e as possíveis permutas envolvendo o terreno e as estruturas da Unila e outros imóveis de Itaipu”, explica a hidrelétrica, em nota. Em 2019, as partes novamente voltaram a conversar.
“No corrente ano, sob as diretrizes da nova Diretoria Executiva de Itaipu, as negociações foram retomadas. Uma primeira reunião foi realizada em Brasília, no Ministério da Educação, e uma segunda reunião em Foz do Iguaçu, envolvendo as duas partes. No momento, tanto a Itaipu como a Unila aguardam os trabalhos de avaliação das estruturas que serão permutadas e de imóveis de Itaipu passíveis de entrarem na permuta. Essas avaliações devem ser concluídas até o final do mês, quando as partes novamente se reunirão para buscar a melhor solução”, continua a nota.
Já em junho de 2017 o Tribunal de Contas da União (TCU) chamava atenção para um ponto do contrato de doação do terreno que, na visão do órgão de controle, poderia representar risco ao erário. Uma das cláusulas do contrato, feito com base em escritura pública precária, definia que, se a obra não fosse concluída em cinco anos, o terreno voltaria para a Itaipu, com todas as benfeitorias ali contidas e sem direito a quaisquer indenizações. A partir daí, por orientação do TCU, a Unila e a Itaipu foram revisar o contrato.
Obra abandonada por consórcio
A construção do campus da Unila foi dividida em duas etapas. Para execução da primeira etapa da obra, foi firmado em junho de 2011 um contrato no valor de quase R$ 240 milhões (R$ 241.256.836,21) com o Consórcio Mendes Junior – Schahin, vencedor da licitação. Após o sexto termo aditivo celebrado entre as partes, o montante ultrapassou os R$ 260 milhões (R$ 264.817.255,88).
A primeira etapa da obra do campus contemplaria parte do bloco de aulas (sem o anexo de diretórios acadêmicos), parte do edifício central (sem o anexo do conselho universitário), o restaurante universitário, a central de utilidades e parte da galeria técnica, totalizando quase 80 mil metros quadrados (79.279 m²), em área de construção. O procedimento licitatório para a segunda etapa nem chegou a ser aberto. No total, a área construída representaria 146.649 m².
A primeira etapa da obra deveria ter ficado pronta em 30 de novembro de 2014. Mas, em 18 de junho de 2014, ela foi abandonada pelo consórcio e, em 5 de janeiro de 2015, logo nos primeiros dias do segundo mandato de Dilma Rousseff (PT), houve a completa desmobilização e entrega do canteiro à Unila. Naquela data, o consórcio tinha executado 41,58% da obra. Já a execução financeira ficou em 39,64% - o consórcio recebeu, portanto, cerca de R$ 100 milhões (R$ 104.985.903,94). O contrato só foi formalmente rescindido em 5 de junho de 2015.
De acordo com a Unila, naquele 18 de junho 2014, o Consórcio Mendes Junior – Schahin enviou um comunicado informando sobre a “impossibilidade de continuidade das obras nas condições vigentes” e acabou ingressando na Justiça Federal para obter a rescisão contratual e o pagamento de novos valores, alegando desequilíbrio econômico-financeiro. A Unila, por outro lado, também apelou à Justiça Federal, para obrigar o consórcio a pagar, entre outras coisas, os valores gastos com aluguéis de imóveis para abrigar as áreas acadêmica e administrativa. Os processos ainda não chegaram a um desfecho.
A Gazeta do Povo não conseguiu um retorno do Consórcio Mendes Junior – Schahin.
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