Mesmo considerado indispensável, especialmente diante de intempéries climáticas que assolam o país todos os anos, o seguro rural não recebeu a devida atenção do Governo Lula no Plano Safra 2023/2024, anunciado em junho, o que provocou impactos negativos nos campos.
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Dos R$ 25 bilhões sugeridos pela Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) como forma de equalização das taxas de juros para financiamentos e subvenção ao seguro, o setor recebeu apenas metade. Como resultado, produtores de todo o país convivem com as incertezas e o risco de perdas nas lavouras.
A contratação de uma apólice de seguro rural permite ao produtor minimizar suas perdas ao recuperar o capital investido na lavoura. O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural (PSR) confere ao agricultor uma oportunidade de segurar sua produção com custo reduzido, por meio de auxílio financeiro do Governo Federal. A subvenção econômica concedida pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) pode ser solicitada por qualquer pessoa física ou jurídica que cultive ou produza espécies contempladas pelo Programa e permite ainda, que os valores sejam complementados por subvenções concedidas por estados e municípios.
De acordo com Jefrey Albers, coordenador do Departamento Técnico e Econômico (DTE), do Sistema Faep/Senar-PR, a ausência de recursos não tem uma explicação aceitável, até agora. A gestão de risco era uma bandeira defendida durante o governo Jair Bolsonaro (PL) e tinha na ex-ministra da Agricultura, Tereza Cristina (PP), uma defensora do processo. Com a ausência de recurso para subvenção, os agropecuaristas vão pagar de 20% a 40% a mais pelo valor do seguro.
“O seguro foi jogado de lado. Sabemos que a questão é orçamentária, mas não é possível que algo tão fundamental seja escanteado. Todas as conversas que ocorreram até agora não foram claras. As contratações para esse ano já não tem recursos e para o ano que vem não há previsão. Mesmo para o Paraná que detém uma grande fatia desses recursos, não temos no horizonte a expectativa de liberação de recursos”, lamenta.
Fragmentação de ministérios preocupa setor
Há o temor, ainda, que a fragmentação de ministérios produzida pelo atual governo afaste as pastas e a possibilidade do diálogo em prol do setor. Além do Mapa, Meio Ambiente, Pesca e Desenvolvimento Agrário discutem, na maioria das vezes, de forma conjunta, os rumos das políticas públicas com impacto no agro.
Essa preocupação que tomou corpo ainda em dezembro de 2022, quando o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) indicou a futura reorganização da Esplanada dos Ministérios e se solidificou nos primeiros meses deste ano com embates pela imprensa entre os ministros Carlos Fávaro, da Agricultura, e Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário. Para Jefrey, um dos pontos de ruptura com o processo orçamentário do seguro rural, possivelmente, tenha origem neste imbróglio.
“Talvez as conversas não estejam fluindo da maneira adequada. A intenção pode até ser boa, mas o resultado não está vindo na prática. O Plano Safra já foi dividido na própria apresentação, quando colocaram um dia para a agricultura familiar e outro para a agricultura empresarial. E o pior, o seguro rural sequer foi mencionado”, ressalta.
No entendimento do coordenador técnico da Faep, além das conversas internas, o processo ainda conta com a intervenção do Banco Central e Ministério da Fazenda. Por isso, não ajuda em nada anunciar um volume grande de dinheiro se a grande parte dele é calçada na subvenção da taxa de juros e não tem recurso para tal.
“Se não tem o recurso, o produtor não tem acesso. Não deu um mês e já tinha linha de financiamento de investimento do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) bloqueada”, critica.
Paraná na liderança das contratações
Ao longo das quase duas décadas do PSR, os produtores paranaenses contrataram mais de 580 mil apólices, próximo de 40% do total nacional (1,5 milhão). O segundo lugar fica com o Rio Grande do Sul, com 324 mil apólices contratadas desde 2006, seguido por São Paulo, Santa Catarina e Minas Gerais. No entanto, sem garantia de orçamento para atender a demanda do restante deste ano e em 2024, a tendência é a redução do interesse pelo seguro rural.
De acordo com Jefrey Albers, o perfil do produtor paranaense é diferente do resto do país. No Paraná, 85% corresponde à agricultura familiar até 50 hectares, o que cria um ambiente propício para a utilização do seguro rural. Além disso, há quase 20 anos, é feito um trabalho junto aos produtores para terceirizar o risco e não assumir sozinho as consequências de uma intempérie.
“Já temos mais de mil egressos nos nossos cursos. Queremos criar a cultura da contratação e acho que isso tem feito uma diferença grande no volume em relação às contratações e em comparação com o resto do país. Basta ver que, não apenas lideramos nas apólices adquiridas, mas também nos valores de subvenção que viabilizaram o seguro desde 2006. São R$ 2,5 bilhões para o Paraná, contra R$ 1,8 bilhão do Rio Grande do Sul, segundo colocado, São Paulo com R$ 975 milhões e Mato Grosso do Sul com R$ 764 mi”.
O mercado de seguradoras, inclusive, vinha em uma crescente, segundo Jefrey. Mas com a ausência dos recursos, a tendência é de recuo imediato. Soma-se a isso, ainda, os problemas de indenizações que mostravam, nas últimas safras, a necessidade do seguro se manter disponível para produtores do Estado do Paraná.
“Sem a subvenção, por si só, o seguro fica mais caro para o produtor. E como a exposição ao risco e as indenizações que as seguradoras tiveram que fazer o seguro passou a representar um ônus para o produtor. A participação no custo de produção subiu muito e, por isso, as contratações vão cair. É um ciclo vicioso, pois se cai a contratação, o preço fica maior e você regride”.
Ministério da Agricultura não cria expectativas
O fato do seguro rural não ter sido mencionado na apresentação do Plano Safra gerou surpresa por parte do setor agropecuário, mas para os responsáveis pela pasta do agro na Esplanada dos Ministérios, não. No entendimento do Mapa, não ter anunciado o orçamento para o PSR trata-se de uma decisão de ordem técnica, que demonstra seriedade na condução da política pública.
“Vamos pautar a gestão do PSR de maneira transparente, principalmente, na questão orçamentária. Sem promessas, sem criar expectativas que podem não ser atendidas no futuro, como já ocorreu em anos anteriores”, afirma o Departamento de Gestão de Riscos do Ministério.
Apesar do posicionamento oficial, no Paraná, os produtores já sentem os impactos dos últimos prejuízos. Muitas seguradoras passaram a oferecer coberturas menores e deixaram de ofertar produtos para a agropecuária em 2023. Antes, a cobertura cobria 50 sacas por hectare, agora está na faixa das 30 a 35 sacas, provocando o desamparo aos produtores paranaenses.
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