Embora cercada ainda de mais perguntas do que respostas, a privatização de unidades de refino da Petrobras – incluindo duas paranaenses, a refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), em Araucária, e a Unidade de Industrialização de Xisto, em São Mateus do Sul – começa a tomar uma forma palpável. De acordo com informações obtidas pelo jornal O Estado de S. Paulo e a agência Folhapress, a estatal já prepara um modelo de demissão e realocação de funcionários, bem como já tem regras para os compradores.
A venda de ativos da petrolífera brasileira foi aprovada pelo Conselho de Administração da Petrobras há duas semanas. O movimento é parte de um esforço do governo Jair Bolsonaro (PSL) que visa, segundo o Executivo federal, reduzir o monopólio estatal no setor, economizar em gastos públicos e melhorar o preço dos combustíveis. Com capacidade para refinar 2,2 milhões de barris de petróleo por dia, a Petrobras detém 98% do parque nacional de refino. O detalhamento sobre a venda de oito unidades no país só deve acontecer no fim deste semestre.
De acordo com informações publicadas pelo jornal O Estado de S. Paulo no último sábado (11), a partir de um comunicado interno da diretora de Refino e Gás da Petrobras, Anelise Lara, aos funcionários, a transferência das refinarias à iniciativa privada será concluída em 2021. A executiva aponta que aos empregados das unidades, a empresa oferecerá um "cardápio de opções", que inclui o programa de desligamento voluntário (PDV) já em curso em algumas delas e a realocação interna, se houver interesse da companhia.
O PDV já foi comunicado aos funcionários das unidades paranaenses, confirmou à Gazeta do Povo o presidente do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina (Sindipetro), Mario Dalzot. São 700 empregados na unidade de Araucária e 265 na de São Mateus do Sul.
Ainda deve ser oferecido um plano de desligamento via acordo e a possibilidade de os funcionários migrarem para a empresa que vai ser criada, diz O Estado de S. Paulo.
Após a conclusão da venda, será iniciado um período de transição, cuja duração vai ser negociada com os compradores. Durante esse período, os empregados continuarão a trabalhar na refinaria como parte da equipe da Petrobras. Nesse momento, o comprador poderá convidar alguns dos profissionais a fazer parte da nova empresa. Caberá ao funcionário decidir se vai aceitar ou se prefere continuar na estatal. Mas a Petrobras também terá a opção de escolher com quais empregados quer ficar.
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Sem monopólio
Além disso, o governo decidiu impor à Petrobras regras para a venda de refinarias, sob o argumento de que é preciso promover a concorrência na produção de combustíveis no país.
Segundo resolução aprovada na semana passada pelo CNPE (Conselho Nacional de Política Energética), a Petrobras não poderá vender refinarias potencialmente concorrentes para o mesmo grupo econômico. A preocupação é que uma mesma empresa compre duas refinarias que disputem mercados próximos, como por exemplo, as unidades do Rio Grande do Sul e do Paraná.
O governo defende que a competição na produção de combustíveis pode garantir ao consumidor "condições adequadas de preço e qualidade". Já a Petrobras diz que a venda das refinarias garante recursos para investir no pré-sal e reduz o risco de ingerências em sua política de preços, segundo apuração da agência Folhapress.
Ainda às escuras
As poucas informações não são suficientes para tranquilizar Araucária, município altamente dependente da atividade de refino da Repar. O que faz o mistério pairar são as dúvidas sobre o processo e nenhuma perspectiva de quais grupos teriam interesse na unidade e com quais finalidades. De acordo com a Secretaria de Governo da prefeitura, o município permanece às escuras sobre o destino da Repar.
Araucária, no entanto, se prepara para o pior dos cenários: o de queda de arrecadação. É que sai da refinaria mais da metade do ICMS, o imposto sobre circulação de mercadorias, arrecadado pelo município. O tributo, da ordem de R$ 1 bilhão, segue para o governo estadual, que retorna uma parte substancial para que a cidade consiga tocar seus projetos. Por ano, são R$ 400 milhões para Araucária, indicou em março, à Gazeta do Povo, o secretário de Governo do município, Genildo Pereira Carvalho.
Se somados também o tributo arrecadado de empresas ligadas à refinaria, como as distribuidoras de combustível, e o ISS, que é o imposto sobre serviço de qualquer natureza, esse total responde por mais de 80% do dinheiro que irriga os cofres da cidade. “A preocupação com a privatização é alta em virtude de uma queda de arrecadação. Ainda não sabemos se esse petróleo será refinado aqui ou em virá de fora [do país]”, disse. Caso seja importado, Araucária poderá ter a divisão de ICMS com Paranaguá, por exemplo.
Para mitigar os efeitos e tornar a cidade independente da indústria petrolífera, o município está apostando em novas frentes de investimento. “Em 2017, quando soubemos [do interesse em privatizar], elaboramos um plano de desenvolvimento do município. Contratamos o Sebrae e estamos na fase de estudo e diagnóstico. Queremos criar um plano que contemple tanto o desenvolvimento do município quanto a atração de novas empresas ”, apontou o controlador-geral de Araucácia, Luis Carlos Moreira, também em março deste ano.
Benefícios
Apesar disso, a privatização não significa necessariamente perdas para o município. Diversificar a economia pode ser uma saída para que a cidade resolva velhos problemas que acompanharam a montagem da refinaria e toda sua rede. “O problema social que a Repar gerou é muito maior. Temos uma das maiores ocupações irregulares do Paraná. Cerca de 30 mil pessoas. Isso gera uma pressão social na saúde, na educação”, disse o secretário de governo. Com nova vocação, a prefeitura almeja, ao menos, estancar o crescimento dessas regiões. É uma aposta de médio e longo prazos.
Economicamente, pode haver ganho imediato. Tudo depende do rumo que o novo detentor da refinaria der a ela. “Se pegar o exemplo da Vale do Rio Doce, guardadas as devidas proporções, depois que ela foi privatizada, ela rende aos cofres federais, estaduais e municipais muito mais do que antes. Muito por conta da produtividade, da política que ela mantém”, ponderou o controlador-geral do município. “Se a privatização não tiver deslocamento de refino, essa atividade continuar em Araucária, a chance é de que se aumente a capacidade de produção e, com isso, incremente o recolhimento de imposto”, disse Moreira.
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