Desde fevereiro deste ano, a Itaipu Binacional não precisa mais pagar as parcelas contraídas há 50 anos para a construção da usina hidrelétrica em Foz do Iguaçu (PR), na fronteira do Paraguai, o que gera uma receita extra de US$ 2 bilhões no cofre da empresa, anualmente. A expectativa era de redução da tarifa da energia elétrica com a quitação da dívida, mas, o destino do recursos ainda é um ponto de interrogação sem resposta clara da nova gestão petista.
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A Itaipu Binacional está destinando mais de US$ 1,3 bilhão para duas áreas específicas de ação, US$ 956 milhões na atualização tecnológica da Usina e outros US$ 360 milhões na revitalização do sistema de corrente contínua associada à hidrelétrica, que leva a energia produzida até o estado de São Paulo. No entanto, os gastos vão muito além e causam preocupação, principalmente pela falta de transparência sobre as cifras bilionárias. Em reais, os valores nas duas áreas citadas somam mais de R$ 6 bilhões.
O destino da totalidade dos recursos é constantemente criticada e questionada no meio político e motivou a convocação ao Senado do diretor-geral do lado brasileiro da hidrelétrica, Enio Verri (PT), para prestar esclarecimento à Comissão de Infraestrutura, nesta quinta-feira (19), sobre a aplicação dos recursos e sobre a composição da tarifa da energia comercializada pela binacional.
“Por ser uma binacional há um problema crônico em transparência. Como ela pertence aos dois países (Brasil e Paraguai), a fiscalização é mais complicada. Além disso, os governos anteriores do PT foram marcados por muito desperdício de recursos, com financiamentos não associados às funções da empresa como a construção de uma sede em Curitiba, por exemplo, muito distante do local de funcionamento da usina [a 700 km]”, critica o senador Sergio Moro em entrevista à Gazeta do Povo.
No governo passado, de Jair Bolsonaro (PL), Moro lembra que houve uma mudança importante na gestão dos recursos de Itaipu que passou a investir em grandes obras estruturantes, como a segunda ponte entre Brasil e Paraguai, a Ponte da Integração, custeada pela binacional com investimento de R$ 463 milhões no projeto, somando obras complementares.
“Nesta nova direção há uma falha brutal na transparência. Nos causa muita preocupação se voltarmos ao quadro anterior de governos petistas, quando a Itaipu era utilizada para investimentos em eventos que não se justificavam do ponto de vista da finalidade da empresa. A atual gestão falha na transparência e por ter um regime legislativo especial, ela deveria tomar o protagonismo e ser mais transparente com relação aos seus gastos”, analisa o senador, ao lembrar de uma atividade recente, segundo Moro, de caráter "político-partidária", que acendeu o alerta da oposição para necessidade de fiscalização e cobrança por mais transparência.
“Teve o financiamento de um evento jurídico na USP para denunciar a operação Lava Jato, investigação que revelou a corrupção do PT e que o partido busca desconstruir. Então, usar dinheiro dos brasileiros para fazer política partidária é um absurdo”, completa. O evento ocorreu neste mês de outubro e a Itaipu destinou R$ 60 mil para a organização.
Quitação da dívida: US$ 2 bilhões em sobras e regras de utilização
Mas afinal de contas, para onde está indo esse recurso, já que a última parcela do financiamento foi paga em fevereiro deste ano? De acordo com a Itaipu Binacional, parte das verbas está sendo destinada, segundo a hidrelétrica, para redução das tarifas de energia, além de US$ 1,3 bilhão destinado para o projeto de atualização tecnológica e revitalização do sistema de corrente contínua.
A utilização dos recursos antes destinados à dívida é um dos focos da Revisão do Anexo C do Tratado de Itaipu. As negociações com o governo paraguaio começaram em agosto mas podem levar anos até a conclusão, segundo avaliação do lado brasileiro. Até lá, a pergunta pode seguir sem resposta.
Parte dos líderes políticos do Paraná e setor produtivo do estado, por exemplo, têm se organizado para reivindicar a realização de grandes obras de infraestrutura e logística, possibilidade descartada pela atual administração. Segundo a direção geral de Itaipu, a revisão do tratado deve ser conduzida pelos ministros de Relação Exteriores e caberá aos presidentes de ambos países as decisões antes do encaminhamento dos projetos para as casas legislativas.
Para o senador paranaense Sergio Moro, a quitação do financiamento trará uma sobra de caixa, mas que estes “valores não pertencem ao PT nem à direção da Itaipu” e defende investimentos pensando no bem comum, tanto do lado paraguaio quanto brasileiro, “O melhor caminho a ser seguido seria retomar investimentos em infraestrutura e não ter esses recursos pulverizados em eventos de difícil transparência e dificilmente relacionados aos objetivos finais da Itaipu”, avaliou.
Verri diz que tarifa em energia de Itaipu recuou 26%
Convocado pela Comissão de Infraestrutura do Senado nesta quinta-feira (19), o diretor Enio Verri afirmou que a tarifa de energia foi reduzida em 26% e que alcançou “o menor patamar em duas décadas”.
Segundo o comando da hidrelétrica, de “2009 a 2021, o valor ficou congelado em US$ 22,60 kW e que 2022, com a redução no pagamento da dívida para construção da usina, a queda foi de 8%, chegando a US$ 20,75 kW”.
Enio Verri reforçou que em 2023 a tarifa foi fixada em US$ 16,71 kW, valor 26% menor ao praticado no comparativo. “A Itaipu é uma empresa binacional e todas as nossas decisões são tomadas em consenso com o Paraguai. A queda no valor da tarifa de Itaipu foi fruto de muito diálogo, muita negociação, visto que o nosso sócio gostaria que o valor voltasse aos mesmos patamares praticados até 2021”, respondeu no Senado
Itaipu afirma que não retêm "quaisquer recursos financeiros”
Em agosto passado, a Itaipu lançou o programa Itaipu Mais Que Energia quando disponibilizou quase R$ 1 bilhão em projetos para 434 municípios, sendo os 399 paranaenses e outros 35 no Mato Grosso do Sul, que integram a área de atuação da usina, de acordo com a binacional.
Os gestores municipais tiveram até o fim de setembro para apresentar projetos em áreas pré-definidas pela hidrelétrica e a expectativa da é de liberação de verbas com “pouca burocracia”. O objetivo é que cerca de 70% deste volume já estejam nas contas das prefeituras até o fim deste ano.
Ao tratar da liberação de recursos da hidrelétrica para os mais diversos segmentos, o senador Esperidião Amim (PP-SC) disse ser essencial ouvir Verri no Senado. Foi dele o requerimento que convocou o diretor-geral da binacional para falar à Comissão de Infraestrutura. “Um orçamento que a diretoria aprova, de US$ 500 milhões de investimento, sem conhecimento do Congresso, é um orçamento secreto", contesta .
Enquanto a Revisão do Anexo C não chega ao fim, o que vale são as regras atuais para utilização dos recursos, inclusive daqueles que antes eram destinados ao pagamento da dívida. A informação é da própria Binacional. A hidrelétrica afirmou à Gazeta do Povo que, como não visa lucros, os recursos não podem ficar em caixa e estão tendo destinação certa.
A Itaipu não informou quais valores já deixaram de ser pagos que seriam referentes aos financiamentos, mas destacou em nota que “todos os recursos são aplicados para garantir o fornecimento de energia limpa e renovável para o Brasil e o Paraguai, a manutenção de projetos no campo da responsabilidade social e ambiental e de investimentos no desenvolvimento sustentável dos dois países”.
Ainda conforme a nota da binacional, “a entidade não retêm consigo quaisquer recursos financeiros” e que a tarifa de energia de Itaipu é definida, anualmente, por consenso entre Brasil e Paraguai, diante do alinhamento de interesses dos dois governos, denominado Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade (Cuse). Na composição tarifária é considera as despesas de exploração, os encargos do Anexo C, como o pagamento dos royalties, além de empréstimos e financiamentos, como exemplo, a antiga dívida de construção da usina.
“Os recursos da Itaipu, por força de seu Tratado e do Anexo C, são integralmente empregados na operação, manutenção e gestão da empresa, desde 2005 em projetos no campo da responsabilidade social e ambiental, nos encargos do Anexo C e no pagamento dos empréstimos e financiamentos contraídos. Não há outras destinações", garante.
"Como o Tratado estabelece que Itaipu não pode ter lucro, a eliminação da dívida de construção da usina, que foi totalmente quitada em fevereiro deste ano, reduziu a tarifa de energia para as concessionárias de distribuição das regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, diminuindo, nessa medida, a conta dos consumidores", acrescenta a empresa.
R$ 1,6 bilhão em obras estruturantes iniciadas na gestão Bolsonaro
A Itaipu Binacional informou que nos últimos anos investiu R$ 1,6 bilhão em grandes obras de infraestrutura como a Ponte da Integração, construída durante o governo de Jair Bolsonaro (PL), que está concluída, mas sem a infraestrutura de acesso segue inoperante.
No contexto das grandes edificações custeadas pela binacional está ainda a Perimetral Leste, iniciada no Governo de Bolsonaro, essencial para o funcionamento da segunda ponte, mas que caminha em passos lentos para conclusão.
Há ainda a duplicação da Rodovia das Cataratas, obra também iniciada no governo Bolsonaro e que segue em andamento, somada ao asfaltamento da BR-487, a Estrada Boiadeira, além da ampliação da pista do aeroporto de Foz do Iguaçu, edificação iniciada também durante o governo de Jair Bolsonaro.
"Nessa gestão [presidente Lula] foram redirecionados os investimentos socioambientais. Um dos programas que exemplifica essa linha de ação são projetos que contribuem para o desenvolvimento da sociedade é o Itaipu Mais que Energia", afirma a binacional. "Com esta ação, a Itaipu oferece uma contribuição concreta à implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) que compõem a Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas", justifica.
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