O Paraná não conta atualmente com um rastreamento ativo das variantes do coronavírus que estão circulando pelo estado, e ter essa informação traria maior controle da pandemia. Os exames com suspeita de variantes são enviados para a Fiocruz, no Rio de Janeiro, mas há um projeto que prevê o sequenciamento genético de mil amostras locais, sendo que 500 serão coletadas ainda em março. A análise deve começar a partir de abril.
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Hoje, o diagnóstico dos paranaenses com suspeita de Covid-19 é analisado por duas instituições locais: o Lacen e o Instituto de Biologia Molecular do Paraná (IBMP). Enquanto o primeiro avalia os casos graves e internados, óbitos, unidades sentinela e as gestantes, as demais amostras do RT-PCR coletadas em hospitais e unidades de saúde são processadas pelo IBMP. Nenhum deles, porém, faz o sequenciamento genético do coronavírus, que indica se uma variante foi responsável por aquela infecção.
Para obter essa resposta, algumas amostras são enviadas aos laboratórios da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) no Rio de Janeiro — que também recebe os exames de outros estados, como Santa Catarina e Alagoas. O Lacen da Bahia, ao contrário, é considerada a terceira maior unidade de vigilância laboratorial do país e faz o sequenciamento do próprio estado, além de Sergipe, Alagoas, Piauí, Pernambuco e Rio Grande do Norte.
"Nós ativamente fazemos a remessa das amostras [para a Fiocruz] que desconfiamos que possam ser uma variante ou que tenha algum vínculo epidemiológico. Por exemplo, uma família que viajou para algum lugar com maior número de casos de uma variante, como era no norte do país", explica Irina Riediger, diretora técnica da divisão de Epidemiologia e Controle de Doenças do Lacen do Paraná.
Como os pesquisadores da Fiocruz também têm acesso ao banco de dados dos paranaenses, caso alguma amostra chame atenção, ela é solicitada diretamente por eles, segundo a diretora técnica. Nos últimos meses, houve um aumento na pressão por se descobrir qual variante está em maior circulação, e essa informação é importante na análise da pandemia. "Saber qual é a variante não muda o manejo do paciente, o isolamento e a perspectiva de desfecho. Não tem um impacto para ele, mas serve para a Saúde Pública monitorar a dinâmica da pandemia no estado", destaca a diretora técnica.
Mil amostras
Até o começo de abril, pesquisadores da Rede Paranaense de Pesquisa Genômica (Napi Genômica) darão início a uma análise de 500 amostras do coronavírus — coletadas ao longo do mês de março em diferentes regiões do estado. Na sequência, conforme a evolução da pandemia, serão mais 500 análises, de acordo com David Livingstone Alves Figueiredo, médico e professor, presidente do Instituto de Pesquisa do Câncer de Guarapuava (Ipec), além de um dos idealizadores do Vale do Genoma, no qual a Rede faz parte. O projeto teve o aval da Superintendência de Ciência, Tecnologia e Ensino Superior do Paraná (Seti), do governo do Paraná.
"Nós já estamos fazendo o sequenciamento de 78 amostras, de um rastreamento que inclui 300 amostras, com verba da Seti e apoio da Fundação Araucária. Porém é muito importante que o estado faça o rastreamento do vírus do ponto de vista epidemiológico. Propusemos isso ao estado, a Seti assumiu e vamos fazer mil amostras do vírus. Quinhentas no começo de abril e depois mais 500, na sequência, de acordo com a quantidade de casos que tivermos mais para frente", explica.
Da análise feita com 78 amostras, Figueiredo lembra que foi possível identificar três variantes em circulação no estado. Uma delas, a P.2. — registrada primeiro no Rio de Janeiro — estaria no Paraná desde outubro. Outro destaque para essa análise anterior é que não apenas os vírus foram observados, mas o genoma dos pacientes.
"Hoje os médicos classificam os pacientes de risco com base nos dados clínicos, o que é pouco assertivo, embora sejam fatores importantes. Nós vamos olhar para os 25 mil genes, e entender por que o paciente mais magro e jovem teve problema, ou por que o diabético passou pela doença sem maiores complicações", argumenta Figueiredo.
Nas análises das mil amostras, apenas os vírus serão observados, mas nem por isso os benefícios serão menores. "[Ajudará] no direcionamento de estratégias epidemiológicas, como saber qual é a variante mais disseminada e qual vacina seria mais adequada", exemplifica.
Mudança na estratégia
De acordo com Ana Gorini da Veiga, pesquisadora de infecções respiratórias virais e professora da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre, a vigilância molecular das amostras de pessoas com infecções respiratórias, e não apenas do novo coronavírus, é "extremamente importante".
"É graças à vigilância molecular que o coronavírus foi identificado no início de 2020 na Ásia. Ao sequenciar com mais frequência, é possível identificar algum que é muito diferente, e quem garante que não possa ser uma nova variante altamente transmissível e patogênica? Com base nesse sequenciamento, conseguimos fazer esse tipo de análise", detalha a especialista, que coordena um projeto de sequenciamento de vírus respiratórios, como o influenza (gripe), no Rio Grande do Sul.
A análise de mil amostras no Paraná, segundo Veiga, é um começo: "O importante é, por exemplo, não coletar muitas amostras de um mesmo local ou região, como o litoral, porque provavelmente será o mesmo vírus para todo mundo. A tendência é que as pessoas tenham se infectado entre elas, então não terá muita diferença. É preciso ter um desenho amostral muito bem planejado para coletar amostras do início do surto, de diferentes regiões, e depois uma amostra por mês. Quanto mais distribuídos estiverem no espaço geográfico e no tempo, maior vai ser a representatividade".
Os benefícios dessas informações vão desde determinar qual vacina seria mais eficiente para o estado até qual região deveria ser atendida primeiro. Resultados preliminares da eficácia do imunizante desenvolvido pela farmacêutica AstraZeneca em parceria com a Universidade de Oxford indicam que a vacina teria uma ação reduzida contra a variante B.1.351 — identificada primeiro na África do Sul. Se essa fosse a variante prevalente no Paraná, por exemplo, uma vacinação em massa da população com essa específica poderia não ter o mesmo efeito se fosse com outro imunizante.
"O sequenciamento genômico é a base para as recomendações sobre as cepas virais que devem compor uma vacina, seja ela da gripe, do coronavírus. Com base na sequência genômica, podemos também desenhar marcadores para os testes de diagnóstico. Se o vírus sofre uma mutação no marcador que é usado pelo exame, ainda que o resultado dê negativo, a pessoa poderia estar infectada sem saber", explica a pesquisadora.
Ao anunciar os testes clínicos com a vacina ButanVac, o Instituto Butantan destacou que o desenvolvimento do imunizante levou em consideração a variante P.1 — identificada primeiro em Manaus e que, atualmente, corresponde por 70% das amostras avaliadas no Paraná. Resultados preliminares com a Coronavac, imunizante desenvolvido pelo Butantan e pelo laboratório chinês Sinovac, indicam uma proteção contra essa variante.
"Os estados deveriam ter essa vigilância ativa. Nesse envio das amostras para outros locais, corremos o risco de perder uma amostra, e é um gasto desnecessário. Havendo infraestrutura, porque nem todo estado têm equipamentos e recursos humanos para isso, deveria haver apoio do poder público com investimentos para que isso faça parte das vigilâncias das infecções respiratórias, com o sequenciamento", destaca Veiga.
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