Sessão plenária da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná| Foto: Dálie Felberg/Alep

A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) indicou que vai insistir no Supremo Tribunal Federal (STF) para cessar as oito aposentadorias de ex-governadores do Paraná que ainda estão sendo pagas. Embora na quarta-feira (15) a Assembleia Legislativa tenha aprovado em primeiro turno de votação o fim do benefício previsto para os futuros ex-chefes do Palácio Iguaçu, uma outra proposta, a que deixava clara a interrupção do pagamento também para os atuais beneficiários, acabou derrotada no plenário na Casa.

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Em um primeiro momento, a ideia da OAB é pedir ao STF a manutenção do julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4545, proposta no início de 2011 pela entidade, e que até hoje não foi analisada pela Corte. Na ADI, a OAB pede que o STF declare inconstitucional o parágrafo quinto do artigo 85 da Constituição do Paraná, que prevê a tal verba de representação – a conhecida “aposentadoria” - para ex-chefes do Executivo.

Com a manutenção do julgamento, a OAB vai insistir, no âmbito da própria ADI, para que o STF deixe claro o fim dos benefícios também para aqueles que já recebem hoje o dinheiro, em torno de R$ 30 mil (R$ 30.471,11), correspondente ao vencimento de um desembargador do Tribunal de Justiça do Estado (o equivalente a 90,25% do subsídio mensal de um ministro do STF).

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A preocupação da OAB é que a ministra do STF Rosa Weber, relatora da ADI, julgue extinto o processo, por perda de objeto, sem analisar o mérito do caso. Na quarta-feira (15), com o apoio de 44 deputados estaduais, a Assembleia Legislativa aprovou, em primeiro turno de votação, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 01/2019, que revoga aquele trecho da Constituição do Paraná. O segundo turno da votação da PEC está previsto para o próximo dia 28. Na sequência, a PEC já pode seguir para a promulgação.

O presidente da OAB no Paraná, Cássio Telles, afirmou em entrevista à Gazeta do Povo nesta quinta-feira (16) que a entidade vai trabalhar para que o assunto seja mantido na Corte em Brasília porque acredita que, a partir daí, ficará claro que os atuais pagamentos também devem ser interrompidos. Na Assembleia Legislativa, uma emenda aditiva à PEC, que cortava os atuais benefícios, não prosperou: era necessário o apoio de pelo menos 33 parlamentares, mas faltaram seis votos, e acabou enterrada. Assim, embora o Legislativo tenha impedido o pagamento aos futuros ex-governadores do Paraná, não se avançou com clareza sobre os efeitos da PEC para quem já recebe.

Para a OAB, a própria PEC já seria suficiente para eliminar os atuais pagamentos, mesmo sem a emenda aditiva, que foi capitaneada pelo deputado estadual Homero Marchese (Pros). “Seria uma decorrência lógica, mas, na prática, estamos vendo que isso não vai ocorrer”, avaliou Telles. Parlamentares que votaram contra a emenda aditiva (ou que se abstiveram) argumentaram, entre outras coisas, que o assunto ainda não está pacificado no mundo jurídico e que, por isso, seria um risco aprovar uma emenda aditiva com tal teor.

“Nós acreditamos que não existe direito adquirido em cima de algo que é inconstitucional. Por isso ainda vamos defender a manutenção do julgamento da ADI. Em um segundo momento [se o STF não avançar no tema], vamos pedir para o próprio governo do Paraná cessar os pagamentos”, antecipou Telles.

Caso de Mato Grosso extingue atuais benefícios

No STF, há um entendimento consolidado sobre a existência das aposentadorias: para a Corte em Brasília, elas não são devidas. Quase dez ADIs que tratavam de outros estados brasileiros já foram julgadas procedentes, de 2007 até agora. Mas, em relação à interrupção dos pagamentos em vigor, o STF se debruçou sobre o tema apenas recentemente, na esteira da ADI 4601, do Mato Grosso.

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Em outubro do ano passado, na ADI de Mato Grosso, o STF deu provimento a embargos de declaração e, por maioria de votos, entendeu que “o direito adquirido não configura fundamento idôneo para a preservação do recebimento da referida pensão vitalícia, máxime quando baseada em previsão inconstitucional”.

No Mato Grosso, a aposentadoria para ex-governadores daquele estado foi criada em 1978. No ano de 2003, a Assembleia Legislativa extinguiu o benefício. No mesmo momento, contudo, a Casa fez uma ressalva, e manteve os benefícios já pagos, com base em trecho da Constituição Federal de 88 (artigo 5º, inciso XXXVI), no qual “a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.

Agora, com a publicação do acórdão do STF, neste mês de maio, os benefícios no Mato Grosso não podem mais ser pagos. Apesar disso, no Paraná, a maioria dos parlamentares não considerou o caso de Mato Grosso. Na visão deles, o STF ainda precisaria analisar o caso paranaense [ADI 4545].

Parecer jurídico defende permanência de pagamento

Um dos oito beneficiários, o ex-governador do Paraná Orlando Pessuti, que permaneceu no Palácio Iguaçu durante oito meses, em 2010, está entre aqueles que acreditam que o pagamento é “direito adquirido”, e não pode ser cortado.

Parecer jurídico encomendado por Pessuti e distribuído aos parlamentares faz críticas à decisão do STF em relação a Mato Grosso e sustenta, em quase 50 páginas, que não se trata de um ponto “pacífico”.

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“Embora o STF tenha exarado decisões favoráveis ao poder supremo das emendas face aos direitos adquiridos, há também decisões contrárias em que o mesmo tribunal não permitiu tais efeitos”, escreveu o professor Emerson Gabardo, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Administrativo.

“Há forte doutrina no sentido de ser terminantemente vedado pela Constituição da República a atribuição de efeitos retroativos às Emendas Constitucionais, principalmente quando afetam direitos subjetivos que vem sendo exercidos há anos e sem qualquer resistência por parte do Estado”, justificou Gabardo.

Para o professor, a decisão do STF sobre a ADI de Mato Grosso “choca e escandaliza pelo erro inescusável dos ministros ao confundir efeitos pretéritos consolidados inerentes ao ato jurídico perfeito com garantia de regime jurídico”. “O STF, ao autorizar o cancelamento retroativo dos benefícios já conquistados e vigentes (alguns há décadas) não aceitou apenas uma alteração no regime jurídico. Ele determinou a extinção do regime jurídico”, reforçou Gabardo.

Quem ganha hoje?

- Veja quem são os oito ex-governadores do Paraná que atualmente recebem a “aposentadoria”:

Paulo Pimentel, que foi governador do Paraná entre 13 de janeiro de 1966 a 15 de março de 1971

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Emilo Hoffmann Gomes, que foi governador do Paraná entre 11 de agosto de 1973 a 15 de março de 1975

João Elísio de Ferraz Campos, que foi governador do Paraná entre 9 de maio de 1986 a 15 de março de 1987

Roberto Requião, que foi governador do Paraná entre 15 de março de 1991 a 2 de abril de 1994; e de 1 de janeiro de 2003 a 1 de abril de 2010

Mário Pereira, que foi governador do Paraná entre 2 de abril de 1994 a 1 de janeiro de 1995

Jaime Lerner, que foi governador do Paraná entre 1 de janeiro de 1995 a 1 de janeiro de 2003

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Orlando Pessuti, que foi governador do Paraná entre 1 de abril de 2010 a 1 de janeiro de 2011

Beto Richa, que foi governador do Paraná entre 1 de janeiro de 2011 a 6 de abril de 2018

- Veja quem são as três viúvas de ex-governadores do Paraná que atualmente recebem a “pensão”:

Rosi Costa Gomes da Silva (viúva de Mario Gomes da Silva, que foi interventor federal entre 7 de outubro de 1946 a 6 de fevereiro de 1947)

Madalena Gemieski Mansur (viúva de João Mansur, que foi governador do Paraná entre 11 de julho a 11 de agosto de 1973, por conta da morte do titular)

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Arlete Richa (viúva de José Richa, que foi governador do Paraná entre 15 de março de 1983 a 9 de maio de 1986)