A tecnologia pode ajudar a prever deslizamento de encostas, com potencial para fornecer diretrizes mais seguras quanto aos reais riscos oferecidos em trechos de serras como os das BRs-376 e 277, no Paraná. Desde o ano passado, esses caminhos registraram incidentes que culminaram em obras e interdições preventivas frequentes, despertando insegurança por parte de usuários e do setor produtivo.
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A alternativa de utilizar sensores capazes de detectar movimentos nos terrenos e o consequente risco de deslizamentos é a solução criada por uma startup brasileira voltada para prevenção de desastres naturais. A solução baseia-se no uso de IoT (da sigla em inglês Internet of Things, ou Internet das Coisas) e tecnologia de monitoramento para prever incidentes com encostas, barragens e até alagamentos.
Atualmente, a decisão de fechar ou não uma rodovia de forma preventiva - como vem acontecendo na BR-376, ligação mais direta entre a capital do Paraná, Curitiba, e o litoral de Santa Catarina – baseia-se em inspeções periódicas e no acompanhamento dos índices de chuvas no local. Se as entidades competentes, sejam as concessionárias que administram os trechos ou as defesas civis, junto com a Polícia Rodoviária Federal (PRF), chegam à conclusão de que o volume de água pode arriscar um deslizamento, a rodovia pode ser totalmente bloqueada, por tempo indeterminado.
Mas essa informação, por si só, pode não ser capaz de determinar se um desastre envolvendo encostas está prestes a acontecer. Algo que a tecnologia poderia ajudar a resolver, segundo os desenvolvedores. “Com a indicação da latitude e longitude de onde se tem o problema, conseguimos mapear com um time técnico a sensibilidade da área e instalamos sensores nos pontos frágeis”, explica Pedro Curcio Junior, CEO da Ineeds Systems, criadora da solução.
Os sensores se comunicam dentro de determinada distância, “informando” uns aos outros sobre a estabilidade do terreno no local onde estão instalados. Se uma pedra se move ou a terra se desloca dentro de um determinado ângulo, os aparelhos emitem alertas para uma central de monitoramento. “São sensores com tecnologia de alta performance, com muita inteligência embarcada e cruzamento de dados para trazer as informações para a plataforma, que permite ao gestor saber o que está acontecendo em tempo real”, explica Curcio Junior.
A sensibilidade dos sensores é customizada conforme as características do terreno. Os alertas são emitidos por sinais de radiofrequência que permitem comunicação de longa distância para o software, que também é fornecido e adaptado pela empresa conforme as características de cada gestor, seja uma concessionária ou órgão público.
Uma das vantagens, segundo o empresário, é o custo-benefício da tecnologia para o monitoramento de encostas. Além do valor de instalação, que varia conforme a análise da área coberta e a quantidade de sensores a serem colocados no solo, os equipamentos têm um custo unitário mensal de operação que varia de R$ 80 a R$ 120. “Somando, chega-se a um valor acessível, em vista do que é o problema de haver acidentes com perda de vidas, o que é inestimável, mais os prejuízos de quando acontece uma tragédia”, afirma.
Solução para áreas de risco
Os sensores desenvolvidos pela Ineeds são usados pela prefeitura de Petrópolis (RJ) como alternativa de acompanhamento de riscos no Morro 24 de Maio, um dos focos de monitoramento da Defesa Civil municipal. Eles foram instalados depois das fortes chuvas que acometeram a cidade entre os meses de fevereiro e março de 2022, ocasionando deslizamentos e enchentes com dezenas de vítimas fatais.
No Paraná, o coordenador de projetos da Secretaria de Inovação, Modernização e Transformação Digital do Estado, Thiago Marcelino, conta que a pasta tem estudado alternativas nessa linha. A facilidade para implementar soluções de inovação por entes públicos, no entanto, é recente, e só veio com o decreto de regulamentação da Lei de Inovação do Paraná (20.541/2021), assinado este mês pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD).
“Apesar do Marco Legal das Startups (Lei Complementar 182/2021) e da lei estadual, sem a regulamentação, a contratação de soluções inovadoras propostas por startups ainda não era tão fácil. Isso abrirá portas e facilitará a entrada dessas soluções no Paraná”, avalia Thiago Marcelino.
As legislações facilitam a contratação das empresas dessa natureza porque, em vez de amarrar um produto ou serviço na contratação, definem o problema e fica a cargo das empresas trazer possíveis soluções, com base em modelos testados no mercado e adaptáveis às realidades locais.
O próximo passo da secretaria é abrir uma chamada pública apresentando os desafios vividos em diversas áreas – inclusive no que tange aos problemas com encostas – para atrair empresas interessadas em apresentar suas tecnologias. “Com o respaldo legal, fica mais fácil trazer esses empreendedores para que testem soluções e verifiquem a viabilidade para o Estado”, antecipa. O edital da chamada está em fase de aprovação junto à Procuradoria-Geral do Estado (PGE) e deve ser publicado em breve, estima Marcelino.
Mesmo no caso das rodovias a serem novamente concedidas à gestão privada, o governo pode ajudar as concessionárias do ponto de vista legal para trazer empresas de inovação - e tecnologia - capazes de sanar problemas como os das encostas.
Para a Defesa Civil do Estado, inovações tecnológicas como os sensores de movimento de terra e de pedras são ferramentas que, somadas às tecnologias já utilizadas, podem ajudar a evitar tragédias envolvendo desabamento de encostas. Atualmente, o órgão atua principalmente com monitoramento meteorológico para ajudar a aferir riscos de deslizamentos e outros desastres naturais no Paraná.
Ao receber informações de órgãos como o Sistema de Tecnologia e Monitoramento Ambiental do Paraná (Simepar), o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e outros sistemas de monitoramento climático, a Defesa Civil envia alertas por meio do Centro Estadual de Gerenciamento de Riscos e Desastres (Cegerd) aos municípios.
Uma das tecnologias utilizadas no estado é o radar meteorológico Banda X, cedido pela empresa japonesa Japan Radio Company (JRC) em 2017. O equipamento de curto alcance é voltado para monitoramento em centros urbanos e está instalado na região metropolitana de Curitiba. Com capacidade de escanear áreas menores, consegue obter informações mais detalhadas sobre os índices pluviométricos.
“A ele temos vinculado um software de previsão de deslizamento. Com base nos dados históricos, o software analisa se, com a quantidade de chuvas que o radar captou, existe possibilidade de deslizamento na região de estudo”, conta o assessor de comunicação da Defesa Civil do Paraná, capitão Marcos Vidal.
O equipamento funciona em conjunto com outros dois radares instalados no perímetro estadual e é um suporte de decisão para as ações da Defesa Civil. “Novas tecnologias seriam muito bem-vindas, pensando na atuação de diferentes soluções e integração de dados”, avalia.
Gestão de encostas
A gestão de encostas é uma das atuações necessárias das concessionárias que administram rodovias brasileiras que cortam regiões de serras. Um campo e tanto para a aplicabilidade da tecnologia como auxiliar deste trabalho. A Ecovias, que administra o Sistema Anchieta-Imigrantes, principal ligação entre São Paulo e a Baixada Santista, mantém um sistema de monitoramento pluviométrico e geotécnico que ajuda nas medidas preventivas.
De acordo com a concessionária, o monitoramento pluviométrico é feito por meio de 15 estações meteorológicas que fornecem informações em tempo real e que estão instaladas em pontos estratégicos, abrangendo principalmente o trecho de serra, mas também os trechos de planalto e litoral.
Quando a concessionária constata um acúmulo acima de 80 mm de chuvas, dentro de 72 horas, é feita uma inspeção visual para verificar trechos mais sensíveis. Se alguma anomalia for encontrada, passa-se a uma inspeção da área de engenharia, que faz uma avaliação técnica e, se necessário, pede uma avaliação geotécnica de um especialista.
Já o monitoramento geotécnico é feito por sensores, como o inclinômetro (sensor móvel que aponta a variação da inclinação nos intervalos de medição), o piezômetro (aparelho que determina pressões da água no solo geradas pelo lençol freático) e o extensômetro (que mede a aproximação ou deslocamento entre dois pontos). Ao todo, são monitorados sete pontos estratégicos em trecho de serra.
Durante o ano, são feitas obras para limpeza e manutenção dos sistemas de drenagem, responsáveis por ajudar no escoamento da água, além de serviços de contenção nas encostas. Embora disponha desse protocolo de prevenção, a concessionária afirma estar constantemente em contato com o mercado para estudar novas alternativas e o que existe de tecnologia de monitoramento de encostas.
Já a Arteris Litoral Sul - concessionária que administra o Corredor do Mercosul, que compreende o Contorno Leste de Curitiba (BR-116) e as BRs-376 e BR-101, até o município de Palhoça, Santa Catarina - informa que realiza monitoramento constante nas encostas ao longo de todo trecho concedido.
No caso do trecho da Serra do Mar da BR-376, onde houve o deslizamento da encosta em novembro de 2022 e os recentes bloqueios preventivos, a concessionária informa que faz inspeções anuais realizadas por empresa especializada, exigidas no contrato de concessão.
A concessionária possui quatro estações meteorológicas para acompanhamento dos índices pluviométricos, e a depender dos indicadores, medidas preventivas são tomadas para garantir a segurança dos usuários, segundo a Arteris. A concessionária não informa, no entanto, se conta com alguma tecnologia como os sensores de monitoramento para avaliar possíveis riscos de desmoronamento de encostas.
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