A reunião “sem muitos afagos” que durou cerca de cinco horas entre os presidentes do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e do Paraguai, Santiago Peña, se estendeu nos últimos dias, com entraves diplomáticos.
Receba as principais notícias do Paraná pelo WhatsApp
Representantes dos Ministérios de Relações Exteriores dos dois países não conseguiram avançar nas negociações sobre valores da tarifa de energia pagos pelo Brasil sobre o excedente produzido pela hidrelétrica ao lado paraguaio. O caixa da Usina de Itaipu segue travado, por decisão do governo do país vizinho, até a tarde desta segunda-feira (22).
O Brasil pretende manter para este ano proposta próxima aos US$ 16,71 por kilowatt (kW) pagos em 2023, mas o governo paraguaio pressiona: quer mais de US$ 20.
Essa pressão escalou no início do mês. Como é binacional, a usina é gerida igualitariamente pelo Brasil e pelo país vizinho. Se não houver consenso sobre pagamentos, por exemplo, nenhuma movimentação financeira é feita nas duas margens da usina. Para forçar negociação mais favorável, o Paraguai bloqueou o caixa da hidrelétrica, com travas ao chamado Procedimento Provisório do Sistema de Pagamento, resultando em espera de pagamentos a funcionários, terceirizados e fornecedores.
Reuniões sobre tarifa de energia se sucedem, mas avanços patinam
Apesar de ter marcado a primeira visita oficial ao governo brasileiro desde que tomou posse, a reunião entre Peña e Lula na última semana foi o quarto encontro que abordou o assunto entre os dois países, em cerca de seis meses. Uma série de discordâncias vem escalando pela firme posição do presidente paraguaio em defender abertamente a revisão dos valores e levantar a bandeira de que o país precisa receber mais pela energia que produz.
A hidrelétrica é a principal fonte de arrecadação de recursos públicos no país vizinho e, como por lá não se utiliza toda energia produzida naquela margem, o excedente é vendido exclusivamente para o Brasil.
Em dezembro, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) deliberou pela manutenção dos valores acordados em 2023 – aceitos pelo presidente antecessor, Mario Benítez. Para sugerir a manutenção, a Aneel considerou a quitação da última parcela da dívida contraída para a construção da hidrelétrica, há 50 anos.
Sem essa obrigação, é estimado que o caixa da Itaipu tenha uma "sobra" de US$ 2 bilhões por ano - e parte seria para a amortização das tarifas que têm valores revisados anualmente. A sugestão da Aneel descontentou o Paraguai. Para que a medida vigore, precisa ser aprovada pelos Conselho de Administração de ambas as margens.
O orçamento anual de Itaipu se aproxima dos US$ 3,5 bilhões, dos quais cerca de 70% eram destinados ao pagamento da dívida, agora encerrada.
Discussão deve provocar embates na revisão do Tratado de Itaipu
A venda do excedente de energia será um dos principais pontos de embate na revisão do chamado anexo C do Tratado de Itaipu, que está em curso e também foi tema da reunião do dia 15.
A revisão ocorre 50 anos após a assinatura do tratado, completados em 2023. O anexo C relaciona as bases financeiras e de prestação dos serviços de eletricidade da usina.
Na renegociação, o governo paraguaio vai reivindicar o direito ao livre comércio, pelo qual poderia vender o excedente ao país que decidir e “a quem melhor pagar”.
A revisão também vai definir como e onde serão utilizados os mais de US$ 2 bilhões em caixa. O diretor brasileiro da hidrelétrica, Enio Verri (PT), defende que parte da verba seja usada para abater preço das tarifas, mas reconhece que as negociações serão arrastadas e que a revisão pode levar anos até ser concluída. Após ser acordada entre os governos dos dois países, o anexo C precisa ser aprovado pelo Congresso Nacional do Brasil e do Paraguai. Até lá, seguem vigentes as regras atuais.
Lula reconhece divergências
O presidente Lula reconheceu publicamente que há divergências sobre os valores das tarifas, mas que "o tema seguirá sendo tratado pelas equipes de ambos os governos para que se chegue a uma solução".
A preocupação se acentua entre colaboradores e fornecedores da Itaipu que estão com valores em aberto - e não por falta de dinheiro em caixa. Entre os funcionários, não se descarta uma possível paralisação na última semana deste mês, caso soluções não sejam apresentadas. A Itaipu é responsável pela geração de 10% da energia consumida no Brasil.
Peña defende mudança de visão do Brasil sobre o Paraguai
Na primeira visita oficial de Peña ao governo brasileiro, ele defendeu a necessidade de o “Brasil mudar a visão sobre o Paraguai”. Lula disse ao presidente paraguaio que, apesar dos entraves, há disposição para o debate e para a construção de uma solução conjunta. O Brasil é o maior parceiro comercial do Paraguai.
Sobre o tema energia elétrica, a tensão vinha se acentuando desde o fim do ano, quando interlocutores do Ministério das Relações Exteriores do Brasil afirmavam que as negociações estavam complicadas. Do lado paraguaio, a alegação é que o país está disposto a fincar o pé em valores próximo aos US$ 20 por kilowatt (kW) e que essa seria uma condição irredutível.
"Agora é o Brasil que tem que ir a Assunção para que a gente possa continuar as tratativas para encontrar uma solução definitiva", disse Lula.
Santiago Peña considerou que "a visão do acordo foi a construção, a operação e o pagamento da dívida de Itaipu, e os objetivos foram alcançados”, mas completou que a “conversa [com Lula] foi sincera, aberta e construtiva".
Durante a semana, a Itaipu disse que “em uma próxima reunião extraordinária do Conselho de Administração a situação deve ser rapidamente definida” que a “empresa irá honrar todos os seus compromissos, com pessoal e fornecedores, o mais rápido possível”.
O Ministério das Relações Exteriores informou à Gazeta do Povo que “estão em curso tratativas bilaterais entre os governos do Brasil e do Paraguai para definição da tarifa (ou Custo Unitário dos Serviços de Eletricidade, também chamado CUSE) da Usina de Itaipu para 2024”.
Segundo o Itamaraty, “os dois governos têm interesse que se possa alcançar solução mutuamente aceitável no menor prazo possível, em linha com o excelente momento das relações entre Brasil e Paraguai e a importância da usina para a parceria bilateral”.
Segurança pública: estados firmaram quase R$ 1 bi em contratos sem licitação
Franquia paranaense planeja faturar R$ 777 milhões em 2024
De café a salão de beleza, Curitiba se torna celeiro de franquias no Brasil
Eduardo Requião é alvo de operação por suspeita de fraudes em contratos da Portos do Paraná
Deixe sua opinião