Bíblia Sagrada.| Foto: Jonathan Campos/Gazeta do Povo / Arquivo
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Uma decisão do Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) considerou inconstitucional a leitura de trechos bíblicos no início das sessões do Legislativo municipal em Araucária, na Região Metropolitana de Curitiba. A decisão foi tomada no âmbito de uma ação protocolada pela Procuradoria-Geral de Justiça em 2022. A Câmara confirmou à Gazeta do Povo que vai acatar a decisão.

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O julgamento foi feito pelo Órgão Especial do TJPR, que conta com 25 desembargadores. Na avaliação do caso, 15 magistrados se posicionaram favoráveis à condição de inconstitucionalidade e 9 foram contrários, para que a leitura do trecho bíblico seja mantida.

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A previsão de leitura de um versículo da Bíblia não estava originalmente no Regimento Interno da Câmara Municipal de Araucária. O trecho em específico – que não obriga, mas abre a possibilidade de leitura do trecho bíblico “a critério do Presidente” da Câmara – foi incluído por meio de uma resolução de junho de 1997.

Leitura de trecho da Bíblia fere o princípio do Estado Laico, apontou procurador-geral de Justiça

De acordo com o então procurador-geral de Justiça que entrou com a ação, Gilberto Giacoia, a escolha deliberada de um versículo bíblico a ser lido na abertura das Sessões Plenárias do Legislativo de Araucária viola a Constituição Federal por privilegiar uma crença em detrimento das demais.

Tal norma, da forma como se apresenta no Regimento Interno, “desconsidera a laicidade de que devem se revestir as ações estatais e viola os deveres de impessoalidade que devem pautar o agir público”, reforçou Giacoia.

Os desembargadores favoráveis à tese do então procurador-geral de Justiça entenderam que, ao privilegiar a leitura de trechos do livro sagrado dos católicos, os vereadores de Araucária prestigiaram as religiões “que professam os ensinamentos bíblicos em desfavor de todas as demais”. Para embasar seus votos, os magistrados reforçaram que o Estado é laico, e que por isso precisa manter um posicionamento neutro em relação às religiões.

Desembargadores contrários à tese lembraram que medida não era obrigatória

Os desembargadores contrários à tese e vencidos na análise do caso lembraram que a medida não é obrigatória, e sim facultativa. Por isso, argumentaram, não há inconstitucionalidade no trecho do Regimento Interno em questão.

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Por ser opcional, descreveram os magistrados, a leitura da bíblia não tem o poder “de impedir que os parlamentares se manifestem dentro da Casa de Leis citando os textos religiosos ou ateístas que bem entenderem”.

Procurado pela reportagem, o TJPR disse que não se manifesta sobre ações ou decisões dos magistrados.

Vereadores iriam discutir a decisão do TJPR, mas Câmara confirmou que seguirá ordem

Mais cedo nesta segunda-feira (24), o segundo secretário da Mesa Diretora da Câmara Municipal de Araucária, vereador Ricardo Teixeira (Republicanos), disse ao portal de notícias g1 que os parlamentares iriam discutir a questão na sessão plenária desta terça-feira (25).

“Tivemos uma conversa prévia com a maioria dos vereadores, que sinalizaram em manter a leitura da Bíblia. Porém, como somos democráticos, vamos ouvir a opinião de todos”, comentou o vereador.

No início da noite, porém, uma nota oficial da Câmara Municipal de Araucária encaminhada à reportagem confirmou que a casa "acatará o decisório de imediato e estará promovendo a alteração no respectivo Regimento Interno através da sua Mesa Diretora".

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Caso envolvendo a Câmara Municipal de Araucária não é isolado

O caso envolvendo o Legislativo de Araucária não é um caso isolado. Em novembro de 2021, uma tramitação semelhante ocorreu no Órgão Especial do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP). Naquele caso, a Procuradoria-Geral de Justiça pediu a anulação de um trecho do Regimento Interno da Câmara Municipal de Itapecerica da Serra que previa a leitura de trecho da Bíblia na abertura das sessões da casa.

A laicidade do Estado foi argumento em outra decisão tomada no TJSP em março de 2022, quando uma lei municipal de Barretos foi anulada por instituir o estudo da Bíblia como componente curricular obrigatório para os alunos do nível fundamental da educação básica.

Em outubro daquele mesmo ano, o Regimento Interno da Câmara Municipal de Piracicaba precisou ser alterado pois continha um artigo no qual se previa a leitura da Bíblia no início dos trabalhos da Casa. Na decisão, o Órgão Especial do tribunal de Justiça paulista, provocado pela Procuradoria-Geral de Justiça, determinou que “o poder público deve se manter neutro em relação às diferentes crenças existentes”.

Em julho de 2023, o mesmo tribunal determinou a mesma suspensão da leitura do texto religioso na Câmara Municipal de Araçatuba, sob as mesmas argumentações. Com a declaração de inconstitucionalidade, os vereadores deixaram de usar a frase “sob a proteção de Deus” e de fazer leitura bíblica no rito de abertura das sessões legislativas. A decisão ainda foi tomada em São Paulo contra as câmaras municipais de Araras e Catanduva.

Em setembro de 2023, foi a vez do Pleno do Tribunal de Justiça da Paraíba tomar decisão semelhante contra a Câmara Municipal de Campina Grande. Neste caso, a leitura do trecho bíblico era obrigatória segundo o Regimento Interno da casa.

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“Ainda que não haja obrigatoriedade de adesão à crença religiosa em si, a adoção de práticas religiosas por parte de órgãos estatais pode gerar uma percepção de favorecimento ou privilégio de determinada religião, violando a igualdade e a neutralidade estatal”, pontuou o relator do caso.