Terceirização de serviços, indicadores de qualidade, bônus por eficiência e outros parâmetros fazem parte da proposta de estabelecer regras para a distribuição de recursos e alterar a forma de gestão das universidades estaduais, apresentada pelo governo do Paraná para os reitores das instituições. Uma minuta foi elaborada e, depois de debatida nos próximos 45 dias, deve ser encaminhada para a apreciação pela Assembleia Legislativa (veja alguns dos principais itens). O assunto foi aventado pelo governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD), em declaração pública no dia 15 de maio, quando mencionou que os repasses de verbas seriam definidos por meritocracia.
Os detalhes do projeto foram apresentados aos reitores na segunda-feira (3) - saiba o que eles pensam das mudanças. Chamada agora de Lei Geral das Universidades Estaduais, a proposta havia sido nominada provisoriamente, no mês passado, como LEGU – Lei de Eficiência de Gestão Universitária. Para entender as bases do que está sendo construído, a reportagem da Gazeta do Povo esmiuçou o texto do projeto.
O primeiro ponto para entender a proposta é que, num primeiro momento, a discussão sobre a distribuição de recursos se aplica exclusivamente à verba de custeio, que representa cerca de R$ 130 milhões ao ano. Essa é a margem mais fácil de manejar, uma vez que os recursos já comprometidos, como folha de pagamento, são praticamente inegociáveis. Cerca de 90% dos R$ 2,5 bilhões destinados às sete universidades estaduais vão para pagar funcionários – 7.685 professores e 8.847 demais servidores, para dar suporte à formação de 97 mil estudantes, atualmente.
O economista Michel Samaha, assessor da Superintendência Estadual de Ensino Superior, participou da equipe que elaborou a minuta. Ele comenta que a divisão dos recursos atualmente é baseada em um histórico e na força política de cada instituição. Isso cria distorções. Ou seja, o valor repassado para custear a manutenção de toda a estrutura para um aluno de Geografia, por exemplo, muda consideravelmente de uma universidade para outra.
A intenção da lei é fixar parâmetros, para que existam critérios objetivos para a distribuição de recursos. Nesse sentido, Samaha conta que a ideia é premiar a eficiência. Ele dá um exemplo: hoje, se a universidade instala algum sistema de redução de gasto com energia elétrica, vai acabar sendo “punida” no ano seguinte, recebendo menos recursos. A partir da proposta, reduções de custos passariam a ser valorizadas, com incentivos econômicos.
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São pelo menos sete fórmulas para calcular o repasse, para cursos de graduação, pós-graduação e residência, também considerando se são novos ou já consolidados (com turmas formadas). São cálculos complexos (veja um exemplo aqui), que contabilizam, entre outras variáveis, o chamado CPC do curso – índice elaborado pelo Ministério da Educação a partir da qualificação dos professores, da estrutura ofertada e também do desempenho dos estudantes no Enade. As instituições também receberão bônus por cursos ofertados no período da noite e fora da sede.
Também há um artigo na proposta de lei que exige que as universidades elaborem planos de recuperação caso, por três anos consecutivos, a quantidade de matriculados seja menor do que 50% das vagas ofertadas. Caso no prazo de três anos seguintes o patamar não seja alcançado, o curso poderá ser fechado. O objetivo é combater a evasão e o desperdício de recursos. Eventualmente, pode acontecer a redução na oferta de vagas – que interferiria em outros parâmetros da conta do repasse de verbas e da disponibilidade de professores.
A minuta de lei também inclui regras administrativas como limite para a contratação de servidores não docentes, a terceirização das atividades meio, quantidade necessária de professores em cada curso e os critérios para contratação de temporários. Leia mais sobre essas regras aqui.
O projeto prevê uma etapa de transição, para adequações. Além disso, a aplicação das regras deve ser, posteriormente, definida e determinada por decreto.
Reação e debate nas universidades estaduais
Em maio, quando a intenção de criar uma lei para regular os repasses foi anunciada, reitores consultados pela Gazeta do Povo tinham declarado que estavam preocupados com os critérios que poderiam ser estabelecidos. Parte da insegurança veio da afirmação, feita por Ratinho Junior, de que era inaceitável que o custo para manter um estudante de universidade privada fosse a metade do gasto nas universidades estaduais. À época, o receio era de que a fórmula proposta considerasse apenas aspectos mercadológicos e da área de ensino, sem levar em conta a destinação de esforços para a pesquisa, para cursos deficitários – mas necessários – e para os aspectos sociais do trabalho desempenhado.
A reação agora, com a apresentação da minuta do projeto de lei, foi mais receptiva. A presidente da Associação Paranaense das Instituições de Ensino Superior Público (Apiesp), Fátima Aparecida Cruz Padoan, comenta que, num primeiro momento, a proposta é bem-vinda. "É muito bom ter parâmetros", opina. Agora, segundo ela, as universidades precisam avaliar ponto a ponto os critérios apresentados.
Fátima declara que não assusta o fato de parte da destinação de recursos estar vinculada ao desempenho dos alunos nas provas do Enade. Segundo a presidente, os reitores já estão acostumados a trabalhar com a busca constante para melhorar os índices avaliados pelo MEC. Ela avalia também que as instituições e os gestores passam a ter um pouco mais de autonomia, já que atualmente há uma “burocracia muito grande” e dificuldades para remanejar recursos. “Será mais responsabilidade, mas também mais liberdade”, analisa.
Os reitores pretendem debater amplamente o assunto com toda a comunidade acadêmica, usando o prazo dado de 45 dias para dar um retorno sobre as propostas – é que o governo pretende encaminhar o projeto de lei para a Assembleia Legislativa a tempo de, se aprovado, ser aplicado há na gestão dos recursos em 2020.
Para o reitor da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Sergio Carlos de Carvalho, uma das preocupações é com a terceirização dos serviços de limpeza e vigilância. Hoje o pagamento dessas funções está na folha de pessoal, com recursos garantidos pelo governo. Caso o trabalho passe a ser feito por empresas, o dinheiro sairá da verba de custeio. Segundo ele, dessa forma, seria necessário assegurar aumento nos repasses para fazer frente à mudança.
Ainda de acordo com o reitor da UEL, é preciso verificar se o principal ativo das universidades, o capital humano, foi suficientemente considerado nos parâmetros. “Ainda não posso dizer se é remédio ou veneno”, disse. Ele também aponta a função social das universidades, como a formação de professores – que não pode ser prescindida nem balizada por critérios de mercado.
Outro aspecto a ser analisado é que o eventual desempenho ruim no Enade pode ter relação com a redução de recursos aplicados – e levar a uma diminuição de verbas maior ainda, inviabilizando a recuperação do curso. Ele também avalia que a aventada autonomia para realizar concursos públicos, visando a substituição de professores em caso de baixas (aposentadorias, exonerações e falecimentos), ainda dependeria de alteração no dispositivo da Constituição Estadual que dá prerrogativa ao governador para nomear os cargos.
Confira algumas das principais propostas
- Após o pleno enquadramento de todas as universidades estaduais nos parâmetros estabelecidos por esta Lei, os ganhos de eficiência na gestão dos recursos orçamentários não serão deduzidos do orçamento dos anos subsequentes, ficando garantida a suplementação orçamentária para aplicação de superávits gerados.
- A relação professor/vaga é variável de acordo com as diferentes áreas de conhecimento e tem como limite mínimo um professor para cada dez vagas (1/10) e como limite máximo um professor para cada vinte e cinco vagas (1/25).
- O número de vagas de agentes universitários não ultrapassará o montante de 70% das vagas de docentes efetivos da graduação em cada Universidade – excluídas da conta as chamadas atividades meio.
- As atividades de conservação patrimonial, serviços gerais, limpeza e vigilância serão providas por meio da terceirização de serviços.
- As vagas totais de docentes temporários ficam fixadas em 16% (dezesseis por cento) do número de vagas dos docentes calculados com base na demanda da graduação.
- O total de servidores colocados em disposição funcional a outros entes da federação, nas hipóteses previstas em Lei, não pode ultrapassar 1% do total de servidores de cada Universidade.
- A reposição de pessoal nas universidades em decorrência de vacância gerada por aposentadoria, exoneração e falecimento se dará automaticamente, com autonomia de cada instituição para realizar os procedimentos de concurso público.
- As Universidades com cursos de graduação que registrem, por três anos consecutivos, um número de alunos totais matriculados menor do que 50% (cinquenta por cento) do número total de vagas, ficam obrigadas a apresentar plano de recuperação de matriculas para os três anos subsequentes, sob pena de perder a autorização de funcionamento dos referidos cursos.
- Fica criada a Gratificação de Responsabilidade Acadêmica (GRA) que se aplica de modo exclusivo a docentes que assumem a responsabilidade de coordenador de curso de graduação, pós-graduação stricto sensu, residências técnicas previstas em lei e chefia de departamento, de caráter temporário e não incorporável, com o valor fixado em 15 % (quinze por cento) da remuneração básica da carreira de Professor Adjunto, com dedicação exclusiva, nível A.
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