A operação policial Peça Chave, deflagrada na manhã desta terça-feira (28), desvelou causas para um problema que afeta o cotidiano dos cidadãos paranaenses: a falta de viaturas para a realização de serviços básicos à população.
De acordo com as investigações da Polícia Civil, desde 2015 os serviços de manutenção da frota do governo do Paraná viriam sendo utilizados para o desvio de recursos por parte da JMK, empresa responsável pelo gerenciamento dos veículos. Ainda segundo a polícia, há 17 mil viaturas sob responsabilidade da empresa, que nega irregularidades.
Segundo a investigação, os desvios, realizados por meio de orçamentos falsos e pela utilização de peças de qualidade inferior à reportada, teriam causado prejuízo de mais de R$ 125 milhões aos cofres públicos. Além disso, de acordo com a Polícia Civil, a JMK não repassou pagamentos para as oficinas credenciadas - que, por isso, deixaram de realizar a manutenção dos veículos.
Os resultados são centenas de viaturas paradas ou com peças de má qualidade. "Várias pessoas sofreram danos por viaturas policiais que não puderam chegar a tempo, ou ambulâncias que não atenderam de modo adequado. O prejuízo para o estado é incalculável", disse o delegado responsável pela Divisão de Combate à Corrupção, Alan Flore.
Situação deve piorar
De acordo com o governo estadual, a situação já era considerada ruim pela gestão de Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) antes mesmo da deflagração da operação. Em janeiro deste ano, o governo suspendeu pagamentos à JMK, por causa de irregularidades constatadas. Depois disso, a Procuradoria-Geral do Estado entrou na Justiça e conseguiu a continuidade dos serviços, mesmo com a suspensão dos repasses.
Com a prisão temporária (por cinco dias) de pessoas ligadas à JMK, a expectativa do governo é que a situação se torne ainda pior. "Estamos estudando uma medida emergencial, uma forma alternativa de contratação", explicou Bráulio Fleury, diretor da Secretaria de Administração e Previdência (Seap).
O contrato com a JMK termina em julho, devido a um aditivo feito em janeiro pela gestão de Ratinho Junior. A justificativa do governo é de que não havia tempo hábil para realizar a nova licitação antes do término do contrato, inicialmente previsto para o início de 2019.
"Criamos um grupo de trabalho para elaborar um novo termo de referência e realizar a nova licitação", explica Fleury. A previsão é de que o edital seja lançado somente em julho.
Modelo de contratação será 'corrigido'
De acordo com a gestão atual, apesar do retrospecto ruim, a nova licitação deve seguir o mesmo modelo, com uma empresa centralizando todos os serviços. O governo afirma, entretanto, que "erros serão corrigidos".
"Nos moldes atuais não há controle sobre o pagamento que a JMK faz às oficinas. No novo modelo de contratação, a gente quer aperfeiçoar esse controle para que o estado só pague depois que as oficinas receberem. Além disso, é exigida pelo termo de referência a contratação de uma auditoria externa, que vá fiscalizar esse contrato com a nova empresa", explica Fleury.
Antes da contratação da JMK, o governo estadual realizava a manutenção das viaturas contratando diretamente as oficinas. Em 2014, foi realizado um pregão presencial para selecionar uma empresa que seria responsável por gerir toda a frota, e subcontratar as oficinas que realizariam os serviços.
Várias pessoas sofreram danos por viaturas policiais que não puderam chegar a tempo, ou ambulâncias que não atenderam de modo adequado. O prejuízo para o estado é incalculável.
Alan Flore, delegado responsável pela Divisão de Combate à Corrupção
O contrato com a JMK foi assinado em 2015, com o valor de R$ 56 milhões. A duração inicial era de 12 meses mas, com três aditivos, o governo foi prorrogando a contratação até julho deste ano. O valor global, segundo o Portal da Transparência, chega a R$ 248,7 milhões.
A empresa já enfrenta oito processos administrativos no governo estadual por causa de irregularidades. Destes, cinco foram abertos na gestão de Cida Borghetti (PP); os outros três já durante o governo Ratinho.
Peças de má qualidade com preço de primeira linha
Ainda segundo a investigação, os desvios incluíam o uso de peças de segunda linha, mesmo que o estado pagasse valores superiores aos de peças originais. A gestão de Ratinho Junior diz que ainda avalia se fará um levantamento para averiguar possíveis problemas de segurança nos veículos, decorrentes da prática criminosa.
"Ainda não tivemos acesso à investigação da Polícia Civil. Quando tivermos, vamos fazer reuniões para verificar o que eles identificaram e avaliar possíveis medidas", disse o diretor da Seap à reportagem.
O que diz a JMK
Confira, na íntegra, a nota enviada pela JMK sobre as acusações:
O sistema implantado pela JMK no governo do Paraná conta com grande transparência e economia, o que contraria muitos interesses que estavam estabelecidos antes da assinatura do contrato.
Antes da JMK, a manutenção da frota estava centralizada em apenas 37 oficinas. Hoje são 1088 em todo o estado.
No ano anterior a entrada da JMK (2013), o Paraná gastou R$ 71 milhões na manutenção da frota. No ano passado, o valor ficou em R$ 43 milhões. Ao longo do contrato foram economizados mais de R$ 60 milhões dos cofres públicos.
Anteriormente à entrada da JMK, a ordem de serviço era iniciada com apenas um orçamento. Hoje são três que entram no sistema para escolha dos gestores. Todo processo é acompanhado online pelo TCE, que tem a senha do sistema.
Todas estas informações estão fartamente documentadas e serão levadas à Justiça, comprovando que o trabalho da JMK sempre foi realizado totalmente dentro da lei.
Resposta do Tribunal de Contas
Após a publicação da nota oficial da JMK sobre o esquema investigado na Operação Peça Chave, o Tribunal de Contas enviou à Gazeta do Povo, nesta quarta-feira, uma resposta contestando as alegações feitas pela empresa em sua defesa. Confira a íntegra do posicionamento do tribunal.
O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE) desmente categoricamente a existência de qualquer acompanhamento “on line” dos serviços prestados pela JMK Serviços Ltda. por esta Corte, inclusive com a utilização de uma pretensa “senha”, conforme nota emitida pela empresa no dia de ontem.
Esta Corte controla o correto emprego de recursos públicos a partir da fiscalização dos entes públicos, não tendo qualquer tipo de acesso a serviços no âmbito privado, como é o caso de manutenção de veículos em oficinas terceirizadas. Os sistemas de acompanhamento “on line” que existem no TCE fiscalizam efetivamente entes do Estado e municípios, jamais qualquer entidade privada.
Desde o primeiro semestre de 2015, o TCE vem investigando, através inicialmente da Terceira Inspetoria de Controle Externo, a licitação que foi vencida pela referida empresa, no âmbito da Secretaria de Estado da Administração e da Previdência e de seu órgão subordinado o Departamento Estadual de Transporte – DETO, com base no contrato nº 256/2015-SEAP.
Pelo processo 702324/15 foi inclusive instaurada uma Tomada de Contas Extraordinária para apurar irregularidades no processo, sendo determinada a irregularidade nas contas da SEAP e aplicadas penalidades a gestores, com o encaminhamento, ainda no ano passado, do processo ao Ministério Público Estadual para as devidas providências, contribuindo assim com as investigações policiais.
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