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| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

No fim do ano passado, Araucária ganhou destaque no noticiário nacional com um anúncio que soava como ilusão. Na contramão do restante do país, a cidade da Região Metropolitana de Curitiba (RMC) divulgou que reduziria significativamente a tarifa do transporte coletivo, de R$ 4,25 para R$ 2,90, em um corte de 31,7%. E não foi só. O município apostou, ainda, na ampliação de gratuidades e agora se prepara para implantar wi-fi em todos os ônibus da frota, sem cobrar um centavo do usuário. Em tempos de precarização geral do transporte coletivo e de passagens cada vez mais caras, ficou a pergunta: qual é a mágica?

Não, não há truque. A resposta rápida para a pergunta passa por pelo menos dois elementos: vontade política e uma polpuda arrecadação financeira. Na prática, a prefeitura revisou contratos, adequou linhas e cortou gastos, de modo a diminuir o custo do transporte. Em 2015, os repasses da prefeitura para manter o serviço de ônibus passaram de R$ 43,5 milhões. Para este ano, a previsão é de que o custo do transporte ao município fique em torno de R$ 18 milhões.

A partir deste pente-fino, a cidade viu que podia baratear a passagem – e até melhorar alguns serviços. “Foi possível diminuir [o valor da tarifa] sem tirar nada da população. Fizemos um controle rígido de gastos e arrecadações. Tiramos as gorduras que existiam e revertemos em benefícios aos usuários”, resumiu o superintendente de Transportes da prefeitura de Araucária, Wilmer Jacó da Silva.

Cortar para crescer

As alterações começaram pela deficitária linha Tupi-Pinheirinho, por meio da qual o sistema de transportes de Araucária se integrava a Curitiba. A prefeitura gastava R$ 1,1 milhão para mantê-la, mas a arrecadação com as passagens da linha não chegava a R$ 350 mil. A prefeitura extinguiu a Tupi-Pinheirinho e criou uma alternativa à integração: uma linha do terminal Vila Angélica, em Araucária, ao terminal do Pinheirinho, em Curitiba.

“Em reunião com a Comec [Coordenação da Região Metropolitana de Curitiba], vimos que tínhamos obrigação de subsidiar a linha que criamos. Mas mesmo com o subsídio, conseguimos economizar R$ 150 mil por mês, só nesta linha”, apontou Silva.

Depois disso, o pente-fino se estendeu às prestadoras de serviço. O município cancelou o contrato com a empresa de vigilância que fazia a segurança dos terminais – que ganhava mais de R$ 400 mil mensais. Após licitação, o mesmo serviço passou a ser prestado por R$ 85 mil, por outra empresa. Com a limpeza de terminais, os gastos caíram de R$ 300 mil para pouco mais de R$ 60 mil. Também houve revisão de contratos de locações.

A cidade extinguiu ainda a Companhia Municipal de Transporte Coletivo de Araucária (CMTC), empresa pública que administrava o sistema – equivalente à Urbs, em Curitiba – e fez uma nova licitação entre as empresas de ônibus. Como resultado, o valor do que a prefeitura pagava às empresas por quilômetro rodado – que havia chegado a R$ 8,60 – caiu para R$ 7,08.

Benefícios

Com o reequilíbrio financeiro, a prefeitura optou por ampliar as gratuidades, principalmente de estudantes matriculados em escolas públicas de Araucária. Hoje, o número de passagens isentas chega a 31% do total – o que correspondem a mais de 11 mil viagens grátis por dia. Paralelamente, o município decidiu liberar as catracas aos domingos, lançando a “domingueira gratuita”.

“Para manter os ônibus rodando aos domingos, gastávamos R$ 55 mil, mas arrecadávamos perto de R$ 12 mil com passagens, porque o número de usuários caía muito. O prefeito [Hissam Hussein Dehaini, do PSB], quando viu, disse: ‘Então compensa a gente pôr esse serviço de graça’. E assim foi feito”, contou o superintendente de Transportes.

Agora, todos os ônibus do transporte público de Araucária estão prestes a oferecer wi-fi gratuito aos passageiros. Além disso, a prefeitura já negocia com as empresas a ampliação da frota – de 73 para 79 ônibus – e a renovação dos veículos que já estão rodando. Tudo isso terá um peso de R$ 0,10 na planilha de custos, mas a administração municipal garante que o valor não será repassado à tarifa.

“Nós temos a visão de que quem deve arcar com a compra de novos ônibus não deve ser o passageiro”, disse Silva. “Se a população tem um sistema de transporte barato, acessível e de qualidade, ela deixa o carro em casa e passa a pegar o ônibus. Só assim vamos atrair o usuário. É isso que a gente tem feito”, avaliou.

O peso da arrecadação

Além do ajuste de custos e do volume de passageiros, a equação do transporte público tem outra variável importante: a arrecadação. Neste aspecto, Araucária goza de uma posição confortável. Apesar de ser a 13.ª cidade do Paraná em população (com 137,4 mil habitantes), o município é o segundo em Produto Interno Bruto per capita (R$ 104,5 mil/ano). Para este ano, Araucária tem um orçamento previsto de R$ 1,1 bilhão: volume financeiro que é apenas um oitavo que o de Curitiba, por exemplo, que tem população 13 vezes maior.

Coordenador da área estratégica de Cidades da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), o professor e urbanista Carlos Hardt destaca que revisões das despesas – como a que Araucária fez – são imprescindíveis para o equilíbrio financeiro. Ainda assim, ele ressalta que o efeito destes ajustes tem um limite. “O sistema precisa ser otimizado, mas quando ele estiver equilibrado, evidentemente, não vai ter de onde cortar mais”, explicou.

Por isso, o aspecto financeiro tem um peso decisivo. Mais especificamente, a capacidade de o município subsidiar o custo do transporte. Por isso, ele aponta que cidades menores teriam condições, em tese, de oferecer um aporte proporcionalmente maior, o que impactaria em uma tarifa mais barata.

“Em cidades pequenas, esse subsídio pode ser menor em volume financeiro, mas proporcionalmente é significativo. Em cidades grandes, por menor que o subsídio seja em termos porcentuais, vai sempre envolver uma quantidade de dinheiro muito grande”, acrescentou.

Enquanto isso, em Curitiba...

Ao longo da última legislatura, a Câmara de Curitiba se debruçou sobre a planilha de custos de transporte coletivo da capital. O relatório final de uma CPI apontou que pelo menos seis itens deveriam ser retirados dos cálculos. O que faria, à época, com que o preço da passagem caísse R$ 0,22 (de R$ 2,70 para R$ 2,48). A sugestão não foi acatada e, desde então, o valor cobrado dos passageiros teve três reajustes. Hoje, a tarifa custa R$ 4,25. A Urbs informou que, por determinação do prefeito Rafael Greca (PMN), a preço do bilhete ficará congelado neste ano.

Entre os itens que ainda constam da planilha de custos estão os impostos exclusivos das empresas de ônibus e o seguro dos veículos. Na avaliação da CPI, esses custos deveriam ser arcados pelas próprias empresas, porque estão diretamente relacionadas à atividade. Ainda assim, esses elementos constam da base de cálculo da tarifa, ainda hoje.

“A questão dos impostos exclusivos das empresas, por exemplo, tinha um peso de cerca de R$ 0,15 na tarifa técnica e ainda está lá. São impostos das empresas. Não faz sentido o usuário pagar por isso”, disse o vereador Bruno Pessuti (PSD), que à época foi relator da CPI.

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O professor Hardt pontua que, para o sistema de Curitiba, seria imprescindível uma revisão criteriosa e constante de receitas e despesas, como forma de equilibrar a tarifa técnica. O especialista ressalta que só desta forma a capital conseguiria “cortar excessos” da planilha.

“O sistema de Curitiba é muito complexo, mas há possibilidade de haver otimização dos gastos. Precisa ter um monitoramento muito apurado, para ir se fazendo ajustes neste sistema”, avaliou. “É aí que entra o gestor público. Precisamos de equipes enxutas, mas de alta capacitação, com pleno conhecimento do sistema. O gestor precisa ter um discurso técnico e embasado, senão é engolido pelos empresários”, acrescentou.

Por meio de sua assessoria, a Urbs informou que “os itens a serem excluídos, bem como os ajustes, serão revistos após convenção coletiva entre o Sindicato dos Motoristas (Sindimoc) e Sindicato das Empresas de Ônibus (Setransp)”.

Queda

Dados da Urbs mostram que o volume de passageiros despencou 40% em quatro anos. Em 2013, o transporte coletivo da capital teve 24,9 milhões de usuários por mês. No ano passado, a média fechou em 14,9 milhões de passageiros por mês. Por isso, os especialistas apontam que a única forma de reequilibrar o sistema é a prefeitura, a Urbs e as empresas adotarem medidas que tornem o transporte coletivo da capital mais atrativo.

“É fundamental trazermos mais passageiros para o usuário. E só vamos conseguir isso com qualidade”, sintetizou Bruno Pessuti.

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Neste sentido, o vereador defende a implantação de medidas como o bilhete único – por meio do qual, por um período de duas horas, o usuário poderia trocar de ônibus sem pagar outra passagem – e a instalação de câmeras de monitoramento nos veículos. “São alternativas que teriam um impacto direto no conformo e na segurança dos usuários. Nós precisamos atraí-los de volta”, apontou.

A reportagem pediu à Urbs uma avaliação de medidas recém-implantadas, como o Ligeirão Norte e a renovação da frota. A empresa destacou que serão 150 novos ônibus por ano, até 2020, e que os veículos e os indicadores de todas as linhas “são constantemente avaliados pela equipe técnica da Urbs”.

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