Quando o poder público extingue cargos comissionados, o resultado é a redução das despesas com pessoal. Correto? Não para a Assembleia Legislativa do Paraná. Recentemente, a Casa aprovou uma “reorganização e readequação” de funções comissionadas da administração para o setor técnico da Casa, que, ao fim das mudanças, cortou 50 vagas e prometia gerar uma economia anual de R$ 614 mil. Levantamento feito pela Gazeta do Povo no Portal da Transparência da Casa, comparando as folhas de pagamento de antes e depois das alterações, porém, mostra que, na prática, houve o incremento de pelo menos 24 comissionados e uma elevação de quase R$ 326 mil por mês nesses gastos. A Assembleia alega que reduziu o valor global gasto com pessoal.
Apresentado em 14 de fevereiro pela Mesa Executiva, o projeto obteve parecer favorável da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) um dia depois. E já na sessão seguinte foi aprovado em três votações em sequência no plenário, culminando numa sanção governamental relâmpago após curtíssimos seis dias de tramitação. No site do Legislativo estadual, a aprovação da proposta foi apresentada sob o seguinte título: “Assembleia aprova extinção de 50 cargos que garantirá economia anual de R$ 614 mil”.
Veja os números do aumento de gastos com comissionados
O texto reduziu de 350 para 230 os postos comissionados à disposição da administração da Casa e, em contrapartida, aumentou de 100 para 170 as vagas de livre nomeação para a corregedoria, os três blocos temáticos, as 25 comissões permanentes e eventuais CPIs. Numericamente, houve uma redução de 50 cargos para essas estruturas, sob a promessa de que seria acompanhada de uma economia de R$ 614 mil aos cofres públicos por ano. “Nós estamos extinguindo um número grande de cargos e, ao mesmo tempo, fortalecendo o trabalho das comissões temáticas da Casa. Portanto, o que a Mesa Executiva está fazendo é algo que traz benefícios ao Poder Legislativo”, justificou à época o presidente da Assembleia, Ademar Traiano (PSDB).
Média salarial de R$ 14,6 mil
Em março, a média salarial dos 301 comissionados das áreas atingidas pela Lei 18.957/2017 foi de R$ 14,6 mil. Pelas regras da Casa, o limite de remuneração para cargos em comissão é de R$ 19 mil.
O discurso do tucano, no entanto, não se sustenta na prática. Em janeiro, dos 450 cargos em comissão em questão, 277 deles eram ocupados: 179 na administração e 98 na área técnica. Já em março – primeiro mês fechado sob as novas regras −, havia ocupação de 301 das 400 vagas: 160 no setor administrativo e 141 no técnico. Como reflexo desse aumento no número de comissionados em 24, o gasto com pessoal saltou de R$ 4.068.721,12 para R$ 4.394.380,50 – incluindo benefícios, como vale-alimentação e auxílio creche. A diferença de R$ 325.659,38 a mais gasta em março chega a cifras milionárias no cálculo anual, quando se levam em conta 12 salários, o 13.º e o terço de férias: elevação de despesas de R$ 4.341.039,54 em um ano, e não uma economia de R$ 614 mil.
E essa conta pode aumentar considerando que 99 dos 400 postos de livre nomeação estavam livres ao final do mês de março e podem ser preenchidos a qualquer momento.
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Segundo deputados ouvidos pela reportagem, a mudança foi feita devido aos limites de nomeações comissionadas que há na Casa: por exemplo, 23 vagas nos gabinetes parlamentares, oito na Comissão de Constituição e Justiça, três na de Orçamento e duas em cada uma das demais comissões permanentes, blocos temáticos, corregedoria e CPIs. Devido a essas restrições, era comum a Mesa Executiva lotar comissionados na administração para atender a pedidos dos deputados. “Agora isso deve acabar e cada um passa a ser responsável pelo seu funcionário”, resumiu um parlamentar.
Assembleia diz que reduziu despesa global com pessoal
Em nota enviada pela assessoria de imprensa, a Assembleia afirmou que a Lei 18.957/2017 é mais uma etapa do projeto de austeridade iniciado em 2011, que incluiu o ponto eletrônico para o controle de entrada e saída de todos os funcionários da Casa, inclusive os das comissões.
Por isso, no caso em questão, o Legislativo estadual extinguiu 120 cargos comissionados e criou outros 70 para atender às demandas das comissões, com o objetivo de “aumentar a produção legislativa e tornar o trabalho mais ágil e capacitado”. “A Assembleia é um órgão dinâmico. É natural que sejam feitas reformas de estruturas diante do surgimento de novas necessidades”, diz o texto.
Segundo a Casa, ao se analisar o custo global da folha de pessoal, as despesas caíram de R$ 22.693.069,07 em janeiro deste ano para R$ 22.205.042,45 em março – queda de cerca de R$ 488 mil. O Legislativo estadual justifica que, possivelmente devido ao método de busca realizado pela Gazeta do Povo no Portal da Transparência, “os dados levantados pelo jornal não refletem a realidade referente aos valores que envolvem a folha de pagamento”.