Abib Miguel, ex-diretor-geral da Assembleia Legislativa do Paraná, foi condenado em novembro a 23 anos de prisão por ilegalidades cometidas na contratação de funcionários no Legislativo. Bibinho, como é conhecido, foi sentenciado pela 9.ª Vara Criminal de Curitiba por peculato, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Antes da sentença, em abril, Bibinho fez questão de entregar à Justiça, dentro deste processo, uma declaração de bens. O documento, usado para o cálculo do imposto de renda, é da década de 1970. Para ele, é uma prova de que ele não desviou recursos públicos do Legislativo.
Bibinho é acusado de comandar um esquema de desvio de recursos públicos que foi revelado pela série de reportagens Diários Secretos, produzida em parceria pela Gazeta do Povo e pela RPC em 2010.
Depoimento inédito
Em abril deste ano, Bibinho também prestou depoimento à Justiça. Foi a primeira vez que ele falou abertamente sobre as acusações. A Gazeta do Povo obteve acesso ao vídeo por meio de um requerimento formal ao Judiciário. Bibinho está preso, por decisão preventiva da Justiça, desde 17 de novembro, acusado de cometer ilegalidades enquanto aguardava julgamento, em prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica.
Em 2014, Bibinho chegou a ser sentenciado em duas ações criminais, mas as decisões foram anuladas pelo Tribunal de Justiça em 2015, acatando o argumento de que houve cerceamento de defesa. À época do julgamento, Bibinho optou por ficar em silêncio, alegando que seu advogado tinha um compromisso e não poderia estar presente. O vídeo a que a reportagem teve acesso é do depoimento prestado na retomada do julgamento.
No vídeo, o ex-diretor reclamou que está com os bens bloqueados, que acumula dívidas e que foi obrigado a sobreviver com apenas R$ 16 mil por mês [de aposentadoria]. Bibinho afirmou que, como descendente de árabes, é empreendedor desde que nasceu. Além disso, declarou que ganhou uma herança, do avô e do pai, ambos empresários bem-sucedidos. “Recebi um belo patrimônio.” No depoimento, ele contou de diversos empreendimentos que realizou no interior do Paraná, como o asfaltamento de parte da BR-277.
Bibinho afirma que, quando ingressou como diretor-geral da Assembleia Legislativa, em 1988, já tinha praticamente todo o patrimônio que mantém até os dias atuais. A fazenda Izabel, em Goiás, fruto de investigação do MP por lavagem de dinheiro, teria sido comprada em 1976. Ele alega que, nas áreas agrícolas que administra, chegou a produzir 200 mil sacas de soja, 200 mil de milho e 40 mil de feijão, rendendo de R$ 25 milhões e R$ 35 milhões ao ano.
“O meu patrimônio anterior e o meu comportamento me garantem que eu não fiz nada do que estão me acusando”, disse. Ele alegou que está sendo perseguido porque não aceitou fazer delação premiada, pois disse que não ia “inventar histórias sobre deputados para se safar”. O ex-diretor afirma ser inocente e nega todas as acusações. “Minha vida não existe mais.”
Negócios perdidos
Com a alegação de que foi penalizado injustamente, Bibinho afirmou que perdeu muitos negócios nos períodos em que esteve preso, inclusive a possibilidade de construir usinas no Amapá.
“Eu ia ganhar de presente. A Petrobras tinha um programa para instalar usinas de pequeno porte para se livrar do fornecimento de combustível para o governo do Amapá e facilitava o financiamento pelo BNDES para a construção dessas usinas, que iam custar R$ 400 milhões, para serem pagas em 12 anos. Quem fosse executar a obra daria só 20%. Saía perfeitamente da renda delas e ainda dava lucro. Precisava de um grande capital para obter o empréstimo do BNDES. Chamei um pessoal para fazer a sociedade comigo e depois caí fora, porque não pude ficar”, relatou.
Saques de dinheiro
No depoimento, Bibinho se limitou a responder questões feitas pela juíza e pela própria defesa. No momento da arguição pelo Ministério Público, ele respondeu apenas perguntas introdutórias e depois recorreu ao direito de se manter em silêncio.
Bibinho negou que ficava com os cartões bancários para fazer os saques nas contas, como um dos réus denunciou. Sobre os saques em sequência, com intervalo de apenas alguns segundos, o ex-diretor disse que o serviço no posto bancário da Assembleia ia se acumulando durante o horário comercial e, depois que o banco fechava, eram colocados em dia.
De acordo com a promotoria, havia depósitos em dinheiro feitos para as contas de Bibinho e familiares logo após os saques dos salários de funcionários fantasmas. O ex-diretor disse os servidores que foram nomeados por ele efetivamente trabalhavam e que não pode ser responsabilizado pelas contratações que foram feitas pelos deputados. “Apesar de tudo o que se fala, eu nunca recebi nada de ninguém”.
“Não era todo-poderoso”
Em dado momento, Bibinho recorreu à ironia para dizer que não era todo-poderoso, como a acusação teria feito crer. “[me apresentaram como] Um deus que eu não sou, que eu não tinha poder de fazer nada”, disse.
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