O revés com a proibição do uso dos canudos plásticos no Rio de Janeiro mudou a roupagem de um projeto de lei com iniciativa semelhante em Curitiba. Com a aprovação de um substitutivo, a proposta que tramita na Câmara Municipal retira a possibilidade de multa e estabelece a distribuição de um “Selo de Consciência Coletiva” para bares, restaurantes e lanchonetes da capital que incentivarem o desuso de canudos e copos recicláveis tradicionais. A lógica é a mesma de um projeto de lei estadual prestes a chegar à Assembleia Legislativa (Alep) e que, além da criação de um selo pró-meio-ambiente, autoriza a discussão de incentivos fiscais e outros benefícios a comerciantes engajados em práticas contra o lixo plástico.
A nova versão discutida em Curitiba foi desenhada pela própria autora do projeto, a vereadora Maria Letícia (PV), após a configuração de um curioso cenário no Rio de Janeiro. Primeira metrópole do Brasil a adotar um movimento mundial contra os canudos, a capital fluminense viu o consumo de copos descartáveis disparar depois que a norma que bane os canudos entrou em vigor, em julho do ano passado.
Leia também: 7 alternativas cheias de design para substituir o canudo de plástico
“O que a gente imaginou a partir desse exemplo é que, ao invés de punir, vamos fazer as pessoas se engajarem na causa. Então, a nossa proposta é incentivar esses bares e restaurantes a, espontaneamente, aderirem ao não uso dos canudinhos e copos plásticos. E eles serão premiados à medida e que eles forem abrindo mão”, explicou a vereadora.
O substitutivo já foi aprovado e a expectativa é de que a nova proposta seja avaliada em plenário nas próximas semanas. “Nós percebemos que com certeza isso é muito mais educativo do que a gente ficar ameaçando com punição. Tem que fazer uma mudança política porque a gente tem visto que com pressão e violência não se resolve nada”, justificou a parlamentar.
Lei no Paraná
Pesadelo número 1 do meio-ambiente, ainda que em contexto de controvérsias, os canudos entraram em uma tendência de extinção praticamente irreversível. Fora do Brasil, redes como a Starbucks e McDonald’s anunciaram políticas para minar o uso do item em suas lojas, em uma postura seguida meses depois pela União Europeia. Em outubro do ano passado, os Estados-membros do bloco anunciaram o fim completo destes pequenos utensílios até 2021, sobretudo, para barrar o aumento da poluição oceânica.
No Brasil, além do Rio de Janeiro, capitais como Vitória e Porto Alegre já abraçaram a causa. E o Paraná poderá ser outro estado a ter em breve a sua própria legislação anti-canudos e copos plásticos.
Proposta do deputado Requião Filho (MDB) que deve ser protocolada na próxima semana na Alep também estipula uma espécie de reconhecimento a bares, restaurantes e lanchonetes que estimularem o uso de canudos e copos confeccionados a partir de substâncias menos nocivas, como materiais comestíveis, biodegradáveis, reutilizáveis ou permanentes.
“A gente tem que pensar na realidade. Qual foi a vantagem que o projeto de proibir teve no Rio de Janeiro? Vantagem ecológica nenhuma. Aqui, vamos buscar, em vez disso de proibir e criar multas, incentivar quem use menos. E que eles vejam que é possível ter vantagens com isso”, declarou o deputado.
O texto do projeto indica a criação do selo “Empresa Consciente Meio Ambiente Equilibrado”, que, como em Curitiba, só seria conferido a estabelecimentos que adotassem medidas de redução do lixo plástico. Além disso, a prévia da norma autoriza o governo do estado a discutir medidas de benefício a essas empresas, como preferência na contratação para eventos públicos e incentivos fiscais estaduais, por exemplo.
“Eu acredito que é possível sim a gente chegar a um denominador comum [sobre os benefícios], mas tem que entender que o projeto faz é dar uma autorização para o governo discutir isso. Depende do governo querer fazer ou não”, ponderou Requião Filho.
Comércio animado
Ao contrário da primeira versão do projeto sobre o uso de canudos em Curitiba, que destacava multa de R$ 2 mil reais para empresários que descumprissem a legislação, donos de bares e restaurantes da cidade agora parecem estar mais animados com a variante da proposta.
“Nós sempre nos posicionamos contra esses projetos de lei rasos, sem discussão, que saíam praticamente do control C control V. Está mais do que provado que tem leis, mas não tem fiscalização. Só ver as tragédias que estão acontecendo. Agora fazer a população participar de fato, o empresário se engajar, não tem como não dar errado”, analisa Fábio Aguayo, presidente da Associação Brasileira de Bares e Casas Noturnas Paraná (Abrabar-PR), entidade que participou das discussões que deram nova forma ao projeto de lei municipal e também que levaram à concepção de uma proposta na esfera estadual.
E de acordo com Aguayo, a ideia de incentivo a uma reeducação ambiental tanto dos donos dos estabelecimentos como dos clientes pode, num futuro não muito distante, trazer novos nichos de mercado para o estado. “Eu tenho certeza de que se houver incentivo, ele [dono] não vai ficar só no canudo. Vai buscar outros meios e descobrir que dá para atrair uma clientela que até então não era valorizada. Se houver trabalho harmonioso, todo mundo sai ganhando”.