Dono de cinco mandatos consecutivos na Assembleia Legislativa do Paraná, Ademir Bier (PSD) se viu envolvido em uma operação contra um suposto esquema de fraude ao Sistema Único de Saúde (SUS). Três endereços e o gabinete dele foram alvos de mandado de busca e apreensão na manhã desta segunda-feira (10). Em uma gravação telefônica, um assessor do parlamentar, que foi preso, se refere aos pagamentos para furar a fila do SUS como “pacotinho” e reclama que Bier não se reelegeu neste ano mesmo ajudando as pessoas. O político nega qualquer envolvimento no caso.
Batizada de Mustela – gênero de mamíferos que inclui os furões −, a ação investiga agentes públicos, funcionários de hospitais e médicos em uma suposta organização criminosa que cobrava indevidamente de pacientes para furar a fila do SUS. Segundo o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), ligado ao Ministério Público do Paraná (MP-PR), a partir de valores que variavam entre R$ 2 mil e R$ 8 mil, esses médicos inseriam os pacientes na lista de urgência do SUS, o que garantia prioridade nas cirurgias.
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A ponte se iniciava no “Núcleo de Agentes Públicos/Políticos” do esquema, que fazia o contato com os funcionários dos hospitais, e estes levavam a demanda aos médicos envolvidos. Entre esses agentes está Paulo Roberto Mendes de Morais, conhecido como Paulinho, que é funcionário comissionado no gabinete de Bier com um salário de R$ 7,8 mil.
A investigação aponta “fortes indícios” de que Paulinho intermediava o agendamento de consultas médicas e cirurgias no esquema. Em gravação telefônica autorizada pela Justiça, ele menciona que “fazia esse tipo de trabalho para Ademir [Bier] há dez anos e que já atendeu ‘muito mais de quinze mil pessoas’ e encaminhou ‘mais de dez mil cirurgias’”. Já a uma paciente que precisava de uma cirurgia no útero e na bexiga, ele fala que “só na base do pacotinho, R$ 4 mil”.
Em outra conversa, ele reclama de um médico para quem encaminhou pacientes “pra depois ele ajudar nós na campanha, pro deputado, mas ele não ajudou”. Por fim, após Bier não ter sido reeleito em outubro deste ano, ele lamenta ao interlocutor a derrota nas urnas: “Assim mesmo o povo não quis. O povo achou que não é desse jeito, o povo não quer pessoa honesta, não quer pessoa que ajuda. O povo elegeu um monte de bandido, que já tava lá. Era a oportunidade de mudar, Ademir tinha uma ficha limpa, extremamente honesto”.
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Para o Gaeco, Ademir Bier deu suporte a Paulinho a fim de “retirar dividendos eleitorais perante eventuais beneficiados”, além de, em alguns casos, participar diretamente da negociação e encaminhamento de pacientes. Num telefonema na véspera do primeiro turno da eleição, o parlamentar pede os dados pessoais de uma jovem de 21 anos com a perna fraturada para “encaminhar pro pessoal”. “Pode deixar que a gente não vai esquecer não, tá”, agradece a paciente.
No dia seguinte à derrota eleitoral, em outro diálogo, o parlamentar não esconde a decepção com o resultado. “Vamos pegar o que tem aí, mais um pessoal que tem doente aí pra fazer, depois vou recolher o carro, vou até vender o carro, viu”.
Outro lado
À RPC, Ademir Bier negou qualquer participação no esquema. “Nunca pedi pra furar fila, não conheço esse hospital de Campo Largo, nunca lá estive e não conheço os médicos. Então, não tem qualquer motivo pra ser sabedor desse esquema, se existir”, afirmou. Mais cedo, por meio de nota, o parlamentar informou que “aguarda para ter acesso à investigação para emitir uma resposta definitiva ao caso. Contudo, desde já, é importante deixar claro para a opinião púbica que refuta veementemente o seu envolvimento em qualquer ilícito”.
“Sobre o caso, sabe-se apenas que um assessor comissionado, conhecido como ‘Paulinho’, vinculado ao gabinete do deputado, foi preso na manhã de hoje (10) pelo Gaeco, em razão de por ele ter tido efetivado supostos atendimentos e encaminhamentos de pacientes oriundos do interior, na área da saúde. Ademir Bier não tem razões para desconfiar da pessoa em questão e acredita que o assessor não está envolvido em atos irregulares. Porém, caso confirme a participação do referido assessor em ilícitos, reitera que este servidor não agiu com anuência e autorização do deputado, devendo, neste último caso, responder por seus atos. Por fim, manifesta seu profundo respeito e admiração pelo trabalho do Ministério Público e do Poder Judiciário, acreditando na apuração com responsabilidade do caso. O deputado reitera seu compromisso com seus eleitores e amigos e afirma, com contundência, a regularidade, integridade e honestidade de todos os atos praticados na condição de deputado estadual, ressaltando que toda a atuação em cinco mandatos foi respaldada pela legalidade, honestidade, probidade e moralidade administrativa”, diz a nota.