Deve haver cota racial para a contratação de comissionados nos órgãos públicos do Paraná? O Conselho Estadual da Promoção da Igualdade Racial (Consepir) entende que sim, e aprovou, no dia 4 de agosto, uma recomendação administrativa em que pede “as providências necessárias para assegurar a contratação de pessoas negras para cargos comissionados do setor público, distribuindo as oportunidades de forma equânime”.
O documento demorou dois meses para ser publicado em Diário Oficial, vindo à tona só no dia 4 de outubro. Passado um mês da divulgação, quando o Livre.jor procurou o governo do Paraná, a Assembleia Legislativa, o Tribunal de Justiça, o Ministério Público e a Defensoria Pública, no fim de outubro, a maior parte dos órgãos públicos sequer tinha sido comunicada da recomendação do Consepir. Nenhum se comprometeu a adotar os critérios raciais para comissionados.
Não é à toa que a presidente do Conselho, Edna Coqueiro, optou por não comentar a recepção da iniciativa. “Estamos na luta pela valorização da população negra”, limitou-se a dizer. A recomendação não delimita porcentual de reserva de vagas, como já acontece em concursos públicos há 14 anos (cota de 10% instituída pela lei estadual 14.274/2003), mas pede distribuição equânime “entre as diferentes esferas de poder, carreiras, posições e níveis de rendimentos”.
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Resposta do governo
“O governo do Paraná obedece a Constituição Federal para a nomeação de servidores para funções comissionadas. A equipe de gestão é plural e o critério de escolha não distingue cor de pele, etnia, gênero, classe ou credo”. Essa foi a resposta da gestão Beto Richa (PSDB), via assessoria de imprensa, ao questionamento se adotaria a recomendação do Conselho de Igualdade Racial. A administração também não disse à reportagem quantos negros ocupam cargos comissionados hoje dentro do Poder Executivo.
Por coincidência, na semana passada, o governo do Paraná lançou uma campanha publicitária de combate ao racismo institucional. Com o mote “Você não aceita isso pra você. Por que os negros deveriam aceitar?”, a peça publicitária mostra candidatos brancos se recusando a aceitar postos de trabalho em que sofreriam bullying e teriam salários menores que os colegas, por exemplo. A campanha seria uma parceria do Consepir com a Assessoria Especial da Juventude.
Outros Poderes
Procurado repetidamente pela reportagem, o Tribunal de Justiça do Paraná não se manifestou sobre adotar critérios raciais para a ocupação dos cargos comissionados e, a respeito de fornecer números sobre seus funcionários afrodescendentes, apenas indicou que as “informações requisitadas estão no Portal da Transparência”. A reportagem procurou, mas não localizou esses relatórios na página da instituição na internet.
A assessoria de imprensa da Assembleia Legislativa disse que esses questionamentos, “por terem que ser oficiais”, só seriam dados mediante solicitação via Lei de Acesso à Informação – numa demonstração do tabu que o assunto permanece sendo na administração pública. Esse pedido foi feito ao órgão e, até a publicação da reportagem, não obteve resposta da instituição.
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Mais “receptivos”
O Ministério Público do Paraná (MP-PR), que faz parte do Consepir, e portanto participou da elaboração da recomendação, foi lacônico sobre adotar a medida no órgão. Há cinco anos o MP-PR tem um Núcleo de Promoção da Igualdade Étnico-Racial, responsável pelas políticas afirmativas da instituição. Hoje, entretanto, dos 948 cargos comissionados do MP-PR apenas 72 são ocupados por pessoas autodeclaradas afrodescendentes (7,6%).
“Dos 841 servidores efetivos, 105 são servidores autodeclarados afrodescendentes [12,48%]. Do total de servidores efetivos, 111 ocupam funções gratificadas ou cargos em comissão, sendo 7 servidores autodeclarados afrodescendentes [6,3%]”, revelou o Ministério Público, dando publicidade às informações administrativas.
A Defensoria Pública também não fez segredo de seus números: dos 295 servidores, 31 se autodeclaram negros (10,5%). Das 12 funções gratificadas dadas a efetivos, 25% são ocupadas por negros (3). “Sim, deve haver uma preocupação na observação da recomendação [do Conselho de Igualdade Racial]”, afirmou Eduardo Abraão, defensor público-geral do Paraná para a Gazeta do Povo.
O dirigente da Defensoria confirmou que considerará a aplicação da medida, mas, em nota à reportagem, o órgão disse que “até o presente momento não houve nenhuma ação neste sentido, sobretudo em virtude do reduzido número de cargos comissionados”.
“A Defensoria Pública é a instituição que por sua natureza é promotora deste tipo de defesa demandada pela população”, afirma o órgão, que também mantém um núcleo interno para promover medidas afirmativas.
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