Maurício Fanini, ex-diretor da Secretaria da Educação e réu na Quadro Negro| Foto: Montagem sobre Reprodução/RPC

O começo do fim para Maurício Fanini se deu no fim de semana de 14 e 15 março de 2015. Em sua proposta de delação premiada, o ex-diretor de Engenharia da Secretaria de Educação (Seed) e réu na Operação Quadro Negro conta que esteve com o ex-governador Beto Richa (PSDB) na Granja do Canguiri, residência oficial do chefe do Executivo. Naquele sábado à noite, o tucano estava “apreensivo” e “muito inquieto”. O motivo: Luiz Abi, primo de Richa, seria preso na segunda-feira – como de fato foi, por fraudar uma licitação do estado.

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Após a prisão, Fanini diz ter ido à casa do ex-governador, que relatou desespero do grupo político dele diante da possibilidade de mais prisões. E o destino de Abi seria o mesmo do então diretor da Seed em decorrência dos eventos iniciados a partir do dia seguinte, 17 de março. Na ocasião, outro diretor da pasta, Jayme Suniê, foi notificado pelo Ministério Público (MP) para prestar esclarecimentos sobre uma denúncia de que Fanini recebia dinheiro de empreiteiras.

De imediato, ele afirma que foi ao Palácio Iguaçu relatar o caso a Richa. No gabinete, o tucano estaria “desesperado apagando fotografias e mensagens do celular”. “Apague todas as nossas fotos e mensagens trocadas entre nós. Isso é muito importante, eu passei o final de semana apagando as fotos que tinha eu e o Luiz Abi e as em que você aparece”, teria sido o pedido do então governador. A partir de então, Fanini passou a ser “escanteado”.

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No olho da rua

Diante do início da investigação do MP, o engenheiro afirma ter tomado consciência do real atraso na reforma e construção de escolas estaduais – o esquema consistia em pagar à Valor Construtora pelo avanço de obras que estavam praticamente no chão. Ele garante que nunca visitou os canteiros e apenas fazia “vista grossa” sobre os procedimentos de fiscalização. “Consternado”, Fanini chamou para uma conversa Eduardo Lopes de Souza, dono da empreiteira, e ordenou: “Não sei o que você vai fazer, ponha gente trabalhando dia e noite lá, e dê um jeito nessas obras”. O empresário pediu 90 dias para colocar tudo dentro do cronograma.

Diante do problema que se desenhava, Deonilson Roldo, chefe de gabinete de Richa, teria dito a Fanini: “Resolva isso! Se isso virar um escândalo, vai ser uma flecha direto no coração do governador”. Diariamente a partir daí, ele passou a cobrar Lopes de Souza e ser cobrado por Suniê. Até o dia 3 de junho, quando ambos – Fanini e Suniê – foram exonerados do governo, porque “a situação perante a imprensa e a opinião pública estava insustentável”.

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No relato de Fanini, a Sérgio Botto de Lacerda, procurador do Estado que comunicou a decisão, ele perguntou como iria se sustentar e afirmou que apenas cumpria ordens “com o consentimento do governador”. Teria ouvido que não deveria se preocupar, porque não era “cabeça” do esquema e, por atuar apenas na intermediação, “seria difícil sobrar” para ele. Também foi informado que Richa estava estudando uma colocação futura a ele na iniciativa privada.

Poucos dias depois da exoneração, Fanini foi à casa do governador, de quem teria ouvido que “as coisas estavam complicadas”. Respondeu que aguentaria, mas não poderia sobreviver sem uma colocação profissional. E diz ter sido orientado a procurar os empresários Beto Freire e Jorge Atherino, além de Botto de Lacerda. A promessa de Atherino foi de que Fanini teria um emprego com salário de R$ 12 mil.

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A prisão

Tudo continuava na base da promessa até 16 de julho de 2015, quando Botto de Lacerda teria pedido que Fanini fosse até o escritório dele, no bairro Batel, em Curitiba. “Sobrou para mim te falar, pensei antes de te ligar, mas f.... Acabei de sair do Palácio e o ‘filho da p...’ do Sciarra [chefe da Casa Civil] tinha colocado o diretor-geral da Polícia Civil na sala do governador e anunciou que a sua prisão havia sido solicitada”, foi o que Fanini disse ter ouvido do procurador. Foi informado ainda que iria ocorrer uma operação, que seria preso temporariamente e que era importante que limpasse todas as provas que pudessem comprometer Richa.

Fanini conta que na mesma noite foi até a casa do governador, que tentou aliviar a sensação de desespero dele e garantiu que a prisão seria de apenas dois dias “para dar uma satisfação à imprensa e à opinião pública”. Também disse que não haveria algemas nem aviso aos jornalistas e que tentaria reverter o iminente pedido de prisão.

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No entanto, o amigo de Fanini desde 1983, da época em que cursaram juntos a faculdade de Engenharia, não cumpriu a promessa. Às 6 horas do dia 21 de julho de 2015, uma terça-feira, o ex-diretor da Seed foi preso pela Polícia Civil no âmbito da Operação Quadro Negro – sem algemas nem a presença da imprensa, conforme havia dito Richa. Além disso, o que seria uma prisão de dois dias foi prorrogada de cinco para dez dias.

Nesse período, a então primeira-dama do estado, Fernando Richa, trocou mensagens de WhatsApp com a esposa de Fanini, no que seria “uma forma de monitoramento para que não houvesse medidas precipitadas, como por exemplo uma eventual delação”.

Solto no dia 30 de julho, Fanini de fato começou a receber no mês seguinte a mesada de R$ 12 mil dos empresários indicados pelo tucano, para que “permanecesse em silêncio”. Em 2017, o pagamento caiu para R$ 8 mil, começou a atrasar e cessou de vez em agosto.

Um mês depois, Fanini foi novamente preso, após virar réu por lavagem de dinheiro. Desde o início deste ano, ele está detido em Brasília por motivos de segurança, na expectativa que a Justiça homologue a proposta de delação premiada.

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Outro lado

O ex-governador Beto Richa negou todas as acusações de Maurício Fanini e disse que o engenheiro tenta envolver pessoas inocentes nos crimes que cometeu em busca de redução de pena, o classificando como “traidor”. “É uma tentativa desesperada de delação, que pela ausência de provas, não será aceita pela Justiça”, disse em nota, que pode ser lida na íntegra aqui.

Deonilson Roldo afirmou que Fanini mente e que, assim que descobriu indícios de fraudes nas obras de escolas estaduais, entre fevereiro e março de 2015, tomou todas as providências cabíveis para investigar e responsabilizar os envolvidos. “Isso é de conhecimento público e já foi informado inclusive ao Ministério Público”, defendeu.

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Ao portal G1, o procurador Sérgio Botto de Lacerda negou as afirmações de Fanini; disse que não estava em Curitiba na data em que supostamente teria antecipado ao engenheiro a prisão dele e pedido para apagar provas; e declarou já ter esclarecido tudo ao Ministério Público. Confirmou ter avisado Fanini da demissão, uma vez que a Secretaria de Educação não conseguiu comunicá-lo na ocasião. Afirmou tê-lo conhecido neste dia e ter sido procurado por ele quando tentava falar com o governador. O procurador disse ter pedido que não fosse mais procurado pelo engenheiro.

A defesa de Jorge Atherino afirmou que o empresário está à disposição das autoridades e que, inclusive, ele já prestou esclarecimentos ao Ministério Público. No entanto, como a proposta de delação de Fanini está em sigilo, preferiu não se manifestar sobre ela especificamente.

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A defesa de Fernanda Richa afirmou, ao G1, que não existe nem nunca existiu qualquer relação financeira da ex-primeira-dama com as pessoas mencionadas por Fanini e que, oportunamente, vai adotar medidas necessárias para garantir os direitos que lhe foram lesados.

A reportagem não conseguiu contato com as defesas de Eduardo Lopes de Souza e Beto Freire.