Dois executivos ligados à Odebrecht relataram o repasse de R$ 4 milhões, via caixa 2, à campanha de reeleição de Beto Richa (PSDB) ao governo do Paraná, em 2014. O conteúdo dos depoimentos – que foram prestados à Operação Lava Jato e transcorreram sob sigilo – foi revelado pela RPC e pelo portal G1. Os delatores também mencionam o pagamento de propina a deputados da base de apoio ao então governador. Richa, o PSDB e outras autoridades citadas negam.
Os delatores são Luis Antônio Bueno Júnior e Luciano Ribeiro Pizzato, ouvidos em inquérito instaurado para investigar a duplicação da rodovia PR-323, a chamada “Rodovia da Morte”, localizada entre Maringá e Umuarama, no Noroeste do estado. Os repasses via caixa 2 teriam sido feitos como contrapartida a favorecimentos a Odebrecht na licitação da obra.
Ex-diretor da Odebrecht, Bueno Junior narrou que o pedido de propina teria sido feito pelo ex-chefe de gabinete de Richa, Deonilson Roldo, em reunião ocorrida no Palácio Iguaçu, em janeiro de 2014. O executivo relatou que, dias depois do encontro, teria sido procurado por Roldo, que teria informado que ajudaria a Odebrecht a vencer a concorrência. A empreiteira de fato venceu a licitação de R$ 1,2 bilhões, mas a obra não chegou a ser executada.
Outro delator, Pizzato detalhou que, em julho de 2014, o empresário Jorge Atherino – considerado amigo de Richa – teria ido ao seu escritório e perguntando se a Odebrecht iria honrar o compromisso firmado entre Bueno e Roldo. Pizzato disse que foi autorizado a repassar R$ 4 milhões a Richa, via caixa 2.
Segundo o delator, todo esse dinheiro foi destinado à campanha do tucano, embora a planilha de propinas da empreiteira só tenha registrado o pagamento de R$ 2,5 milhões de caixa 2 a Richa – que era identificado sob a alcunha de “Piloto”. Além dos R$ 4 milhões, a empreiteira teria feito a doação de mais R$ 435 mil a deputados da base do tucano. Os delatores afirmaram, ainda, que confirmavam o pagamento da propina com Atherino.
Já Pedro Rache, ex-executivo da construtora Contern, relatou que teria sido chamado por Deonilson Roldo a uma reunião no Palácio Iguaçu, em fevereiro de 2014. Ele compareceu ao encontro porque a Contern tinha interesse em participar da licitação da PR-323, mas teria sido orientado por Roldo a se afastar do processo, porque já teria compromisso com a Odebrecht. O encontro foi gravado por Rache – e o conteúdo foi divulgado em maio deste ano.
Vai e vem
A investigação em torno da licitação da PR-323 é alvo de muita polêmica pelo trâmite judicial. Em abril, com a renúncia e consequente perda de foro por parte de Richa, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) enviou o processo para as justiças Eleitoral e Federal, ao juiz Sergio Moro. Em junho, no entanto, a Corte Especial do STJ decidiu acolher um recurso do ex-governador e encaminhar o inquérito somente para a Justiça Eleitoral do Paraná.
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Na oportunidade, quando teve de abrir mão do caso, Moro disse ver indícios de que não se tratava apenas de caixa 2, pois laudos indicam que o dinheiro supostamente repassado à última campanha de Richa veio de contas no exterior, comprovando “o caráter transnacional do suposto crime de corrupção e lavagem” e firmando “a competência da Justiça Federal”.
Já no dia 21 de julho, o processo voltou para Moro após decisão de primeiro grau da Justiça Eleitoral do Paraná. Mas nesta semana, Richa recorreu ao Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE-PR) e, mais uma vez, o processo saiu da competência da Justiça Federal.
Essa última decisão diverge de despacho do último fim de semana do vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, Humberto Martins, que havia mantido o inquérito nas mãos do juiz Sergio Moro ao analisar um recurso da defesa de Richa após o retorno do caso à Justiça Comum.
O que dizem os citados
À RPC e ao G1, a maioria dos citados na reportagem se manifestou por nota (leia abaixo). O advogado de Deonilson Roldo disse que só iria se manifestar nos autos. Já o advogado de Jorge Atherino afirmou que não iria comentar por não ter tido acesso aos autos.
Beto Richa
“A obra prevista na licitação não aconteceu. Nenhum recurso público foi gasto nesse projeto. Em relação à empresa Contern, por duas vezes ela se apresentou para entregar sua proposta para a comissão de licitação. Em seguida ela declinou de participar por não ter conseguido as garantias bancárias exigidas pelas regras do edital. Tanto é assim que a Contern ajuizou, em 27/02/2014, a Ação Ordinária n. 0001667-03.2014.8.16.0004), perante a 3ª Vara da Fazenda Pública de Curitiba, em razão de sua incapacidade econômica financeira para participar do certame. Questionou as exigências do edital, pois não tinha patrimônio líquido mínimo exigido no edital e também por não conseguir oferecer garantia, equivalente a 10% do valor estimado da licitação. O pedido foi negado pela Justiça. Como usualmente vem ocorrendo, os delatores apresentam planilhas e informações, como estratégia de defesa, sem no entanto conseguirem comprovar a veracidade de suas acusações. Até porque os fatos relatados são inexistentes. A defesa, mais uma vez, estranha o desrespeito ao sigilo judicial decretado neste caso.”
PSDB
“O diretório estadual do PSDB no Paraná volta a afirmar que as colocações são inverídicas. E garante ainda que todas as doações referentes às eleições de 2014 foram legais e seguiram à risca a legislação eleitoral vigente.”
Contern
“A Contern, empresa de engenharia e construção pesada com inúmeras grandes obras realizadas, estudou o edital de licitação da PR 323, do mesmo modo que estudou outros tantos processos licitatórios. O engenheiro Pedro Rache exerceu, durante vários anos, funções de direção na Contern, tendo como uma de suas responsabilidades a interação com os órgãos públicos aos quais as licitações estavam vinculadas. Em nenhum momento, pelas informações disponíveis, a Contern recebeu sinais de que o referido processo licitatório estaria direcionado para uma determinada construtora.”
Odebrecht
“A Odebrecht continua cooperando com as autoridades e está focada no exercício de suas atividades e na conquista de novos projetos.”
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