Pela primeira vez desde o início da Lava Jato, há quase quatro anos, um político foi condenado no exercício do mandato pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no âmbito da operação. Nesta terça-feira (29), o deputado federal Nelson Meurer (PP-PR) foi condenado pela Segunda Turma do STF pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Os ministros também condenaram os dois filhos do deputado, Cristiano Meurer e Nelson Meurer Júnior.
Nelson Meurer, cuja principal base eleitoral é a cidade de Francisco Beltrão, pode ainda perder o mandato na Câmara dos Deputados. Ele está na sexta legislatura consecutiva. Tem sido eleito e reeleito por eleitores do Paraná desde 1994, somando mais de duas décadas na Casa. No último pleito, em 2014, obteve mais de 100 mil votos.
Ligado ao agronegócio, Meurer é titular hoje de uma única comissão interna da Câmara dos Deputados, a de Agricultura, Pecuária, Abastecimento e Desenvolvimento Rural. Em maio de 2016, também se tornou membro do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, e votou, no mês seguinte, contra a cassação do mandato de Eduardo Cunha por quebra de decoro. Meurer não faz mais parte do colegiado.
Já no plenário da Casa, embora assíduo no local, Meurer mantém uma atuação discreta hoje. Praticamente não usa a tribuna para fazer discursos, defender pautas ou debater temas. No registro eletrônico da Câmara dos Deputados, consta que Meurer usou o microfone do plenário apenas três vezes ao longo da atual legislatura: uma para votar a favor da admissibilidade do impeachment de Dilma Rousseff, em abril de 2016; nas demais situações, para votar contra o prosseguimento das denúncias contra Michel Temer (PMDB), nos meses de agosto e outubro últimos.
Meurer resistiu a votar contra Dilma, mas foi pressionado pelo PP, que decidiu fechar questão em defesa do afastamento da petista.
Partido de Janene
O parlamentar está filiado ao PP desde a década de 90. Antes, pertencia à Arena, grupo que deu sustentação à ditadura militar.
O PP foi a legenda que indicou Paulo Roberto Costa, outro delator-chave da Lava Jato, para a Diretoria de Abastecimento da Petrobras. Meurer era extremamente ligado a José Janene, o conhecido deputado federal pelo PP do Paraná, morto em 2010.
Em depoimento prestado por Meurer durante a ação penal no STF, o parlamentar chega a defender o amigo, envolvido em escândalos de corrupção como o “Mensalão” e o próprio “Petrolão”: “Eu nunca deixei de considerar o Janene uma pessoa correta”, disse Meurer a Ricardo Rachid de Oliveira, um dos juízes auxiliares do ministro Fachin.
Apesar da proximidade, no mesmo depoimento que prestou no âmbito da ação penal, Meurer negou qualquer vínculo com o doleiro Alberto Youssef, que trabalhava com Janene. “Eu não tinha nenhuma relação com Youssef. Ele era um assessor de assuntos diversos do Janene”, respondeu Meurer ao juiz auxiliar de Fachin.
O depoimento do próprio Youssef na mesma ação penal, como mostrou a Gazeta do Povo em primeira mão, trouxe outra narrativa: o doleiro, que se tornou um dos principais delatores da Operação Lava Jato, revelou que fez “várias entregas” de dinheiro ilícito a Meurer, inclusive pessoalmente.
Mas o doleiro não comprometeu o advogado Nelson Meurer Júnior e o empresário Cristiano Augusto Meurer, filhos do parlamentar, e que também foram denunciados pela PGR. “Eu não acredito que o Nelson fosse colocar um filho para fazer esse tipo de coisa”, disse o delator.
O deputado Meurer também negou ter recebido dinheiro de forma ilegal. “A origem [do dinheiro] era minha, doutor. Era a conta diária de uma pessoa que tem dificuldade financeira”, disse ele, reforçando que volta e meia pedia dinheiro emprestado de pessoas próximas, para pagar uma dívida ou outra.
Patrimônio bloqueado
No pleito de 2014, Meurer declarou à Justiça Eleitoral ter um total de R$ 4.656.434,40. Entre seus bens, estão veículos, embarcações, terreno rural, além de R$ 762.360,00 guardados em espécie. Também é um dos donos da Firma Agrícola Sudoeste Ltda, com sede em Francisco Beltrão.
A partir do andamento dos processos da Lava Jato contra ele, o parlamentar chegou a ter bens bloqueados. Além da ação penal 996, julgada nesta terça-feira (29), Meurer é alvo de uma ação por improbidade administrativa, que tramita no primeiro grau da Justiça Federal do Paraná, e também já foi denunciado por associação criminosa ao STF, no final do ano passado, como mostrou a Gazeta do Povo. Os dois processos são derivados da Lava Jato.
Fora da Lava Jato, há também ao menos um inquérito envolvendo Meurer, e que tramita de forma sigilosa no STF desde setembro de 2010. Só é possível saber que se trata de uma investigação sobre suposto favorecimento ilegal de empresas através de emendas. O caso, que está nas mãos do ministro Marco Aurélio, já teria gerado denúncia por parte da PGR. A análise da peça – ou seja, se os ministros aceitam ou não a acusação – deve ser feita no próximo dia 30.
Em entrevista à Gazeta do Povo, antes do julgamento, Meurer não quis entrar no mérito dos processos. Disse apenas que não cometeu “nenhum ato ilícito”, que a sua defesa já fez os esclarecimentos devidos ao STF e que não está “preocupado”.
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