O ex-diretor da Secretaria de Estado da Educação (Seed) Maurício Fanini afirmou – em interrogatório realizado no âmbito da principal ação penal da Operação Quadro Negro – que recebeu carta branca do ex-governador Beto Richa (PSDB) para “arrecadar” mais dinheiro para a campanha de 2014, via caixa 2. Segundo as declarações, Richa justificou a necessidade de mais recursos por causa da compra de apoio político, entre os quais, o de três deputados federais: Fernando Francischini (PSL), Alex Canziani (PTB) e Ricardo Barros (PP). Fanini apresentou uma proposta de delação premiada à Justiça, mas que ainda não foi homologada.
Fanini relatou um diálogo (leia a transcrição abaixo ) que teria ocorrido naquele ano, em um domingo chuvoso, em que ele teria sido convidado por Richa para jogar tênis no Graciosa Country Club, em Curitiba. Num intervalo da partida, o então governador teria pedido a Fanini para “arrecadar” e dado o “aval” ao diretor da Educação. Segundo o depoimento, é a partir daí que a Seed começa a liberar o pagamento para empreiteiras a partir de medições fraudulentas em obras de escolas estaduais. Conforme a Quadro Negro, pelo menos R$ 20 milhões foram desviados por meio desse esquema.
“No intervalo entre um set e outro, fomos tomar uma água e ele falou: ‘Olhe, precisamos arrecadar, você precisa arrecadar. Este ano a coisa é bastante brava’. Daí eu falei: ‘Mas eu posso propor alguma coisa diferente pras empresas, posso combinar alguma coisa com eles que possa ser acertado depois, algo nesse sentido, Beto?’”, relatou Fanini a promotores do Ministério Público do Paraná (MP-PR). “Pode, porque eu tenho grandes chances de ser eleito, devo ser reeleito. E aí a gente tem quatro anos depois pra ajeitar a situação dessas empresas parceiras. Pode fazer a parceria que você tiver que fazer”, teria sido a resposta do tucano.
Veja o relato de Fanini a promotores do MP-PR:
“Compromissos enormes”
Segundo Fanini, tempos depois, em uma reunião de trabalho na casa do então governador, Richa reiterou a carta branca: “Pode fazer o que tiver que fazer. Faça pra arrecadar”, teria afirmado o tucano. Na ocasião, Richa teria justificado a necessidade, alegando ter assumido “compromissos enormes” e apresentado uma lista de pagamentos. De acordo com o depoimento, o ex-governador detalhou, então, o repasse a três deputados federais.
“Ele me mostra assim, indignado: ‘Veja aqui o papel, ó. R$ 800 mil tive que arrumar aqui pro Francischini, pro Solidariedade. R$ 2 milhões aqui pro Ricardo Barros’. Ele me mostra assim... os nomes que eu lembro na época. Era R$ 1,5 milhão pro Canziani, pra ter o PTB. E ele falou assim: ‘Então, veja como é isso aqui, entenda como que é a política. Política a gente faz assim ó. Tem que arrumar dinheiro e tudo dinheiro vivo’”, narrou Fanini.
DESEJOS PARA O BRASIL: Uma política moralmente exemplar
Questionado pelo promotor, o então diretor da Seed foi conclusivo, confirmando que os pagamentos se tratavam de “compra de apoio político em caixa 2”. “Tinha que ser dinheiro vivo. Não era nada dinheiro em caixa 1”, acrescentou.
O depoimento
O interrogatório foi tomado judicialmente no dia 30 de maio, em Brasília – semanas depois de Fanini ter sido transferido para lá, por motivos de segurança. O ex-diretor da Educação foi ouvido por promotores, que o questionaram com base na proposta de delação que ele havia apresentado à Justiça e que ainda não foi homologada.
Fanini está preso desde setembro do ano passado, por lavagem de dinheiro. Réu em ações penais e cíveis relacionada à Quadro Negro, o ex-diretor da Educação era amigo pessoal de Richa, com quem fazia viagens internacionais – cujas fotos integram os processos. A participação de Fanini no esquema havia sido detalhada pelo dono da Valor Construtora, Eduardo Lopes de Souza, que se tornou o principal delator da Quadro Negro.
Políticos citados negam acusações e põem em dúvida credibilidade de Fanini
O ex-governador e pré-candidato ao Senado Beto Richa classificou as afirmações de Fanini de “declarações criminosas” e disse que o que o ex-diretor da Educação tenta conseguir redução de pena. Richa destacou que o depoimento é mentiroso e que não apresenta provas e acrescentou que espera que a Justiça apure rapidamente os desvios relacionados à Quadro Negro.
“O que esse criminoso pretende? Ora, a resposta é muito simples! Pretende conseguir a redução da pena a que certamente será condenado pelos crimes cometidos e já confessados à Justiça”, disse Richa, por meio de nota. (leia o documento na íntegra ).
Por telefone, o deputado Alex Canziani disse que as declarações de Fanini não passam de “inverdades” e que “não têm o menor fundamento”. O parlamentar afirma que seu partido apoiava o governo Richa, por isso era natural que ele prestasse apoio e que nunca recebeu contrapartidas financeiras para isso. O deputado também desqualificou Fanini, o definindo como “um sujeito que comprovadamente cometeu ilícitos”.
“São inverdades. Nada disso aconteceu. Todos esses partidos que ele cita apoiavam o Beto Richa. E é estranho que ele cite um pré-candidato a deputado e dois pré-candidatos ao Senado. Não tem o menor fundamento”, disse Canziani. “Vamos tomar providências. É fácil falar, mas cadê as provas?”, acrescentou. Posteriormente, o deputado também encaminhou nota .
Francischini emitiu uma nota, em que disse que o envolvimento de seu nome nas denúncias é “um escândalo fabricado, típico ‘Fake News’”. O deputado diz que, por ser delegado federal, está “do outro lado da algema” e que ajuizou uma ação criminal contra o “suposto delator”.
“É preciso deixar bem claro que meu nome não foi citado na proposta de delação. E agora estranhamente o delator começa o depoimento dizendo que ia trocar de estratégia de defesa porque havia trocado de advogado”, consta da nota. (leia na íntegra ).
Ricardo Barros também negou as acusações. O deputado do PP emitiu nota (leia clicando aqui ) em que disse que “rechaça a acusação baseada em ‘ouvi dizer que’ e afirma que não houve nenhuma negociação financeira envolvendo o apoio às campanhas eleitorais do ex-governador Beto Richa. As negociações de apoio sempre ocorreram no âmbito político. Nesta eleição citada (2014) o grupo político buscava o espaço de vice-governador na chapa, o que de fato ocorreu”.
Nota emitida por Richa:
“Mantenho integralmente as afirmações que fiz no último dia 5 de junho, por ocasião do vazamento criminoso da proposta de delação, que não foi aceita tanto pelo Supremo Tribunal Federal quanto pela Procuradoria Geral da Republica, do sr. Maurício Fanini.
Não faço parte desta cena deplorável, onde criminosos confessos buscam envolver pessoas inocentes em crimes que somente eles praticaram.
O que esse criminoso pretende? Ora, a resposta é muito simples! Pretende conseguir a redução da pena a que certamente será condenado pelos crimes cometidos e já confessados à Justiça.
Portanto, está mais do que explicado porque Fanini tenta delatar tudo e todos, sem, no entanto, apresentar quaisquer indícios de provas.
São acusações criminosas, com o objetivo de envolver terceiros, retirando o foco das fraudes por ele cometidas.
E para isso, mente descaradamente. Jamais pedi ou solicitei a ele qualquer favor ou atendimento a quem quer que seja.
Repito: é uma declaração criminosa, sem provas, que busca apenas confundir as pessoas. Espero que a Justiça apure e esclareça rapidamente essa questão, para que os culpados sejam punidos de forma exemplar”.
Nota emitida por Canziani:
”Sobre a questão abordada, informo que não houve nada, não pedi nada e não foi dado nada no que diz respeito ao que está sendo falado!
O depoente não apresenta provas. Ele tem que simplesmente falar a verdade, e não montar depoimentos “mudando versão” ou “mudando estratégia”, como ele menciona!
Neste último depoimento, ele também muda o que tinha dito antes falando algo novo que não estava nem na proposta de delação. Por que ele não constou isso no acordo de delação?
Muito estranho este depoimento, porque eram 16 ou 17 partidos que estavam apoiando e ele vem falar exatamente do marido da governadora e de dois pré-candidatos ao Senado. Qual o interesse que está por trás?”
Nota emitida por Francischini:
“Mais uma vez, às vésperas da eleição, tentam colocar meu nome em um escândalo fabricado, típico ‘Fake News’. Todos sabem quem são os criminosos envolvidos na Quadro Negro.
Os Bandidos de colarinho branco já tentaram fazer o mesmo em outra delação para me constranger. E logo a verdade veio a tona! Sou Delegado da Polícia Federal, estou do outro lado da algema.
Já entrei com uma ação criminal contra o suposto delator e interpelei todos os citados nesta montagem. Todos negaram os fatos narrados.
É preciso deixar bem claro que meu nome não foi citado na proposta de delação. E agora estranhamente o delator começa o depoimento dizendo que ia trocar de estratégia de defesa porque havia trocado de advogado.
Vou continuar denunciando estes Bandidos, não vão me fazer parar!”.
“A assessoria de imprensa do deputado Ricardo Barros (PP) rechaça a acusação baseada em ‘ouvi dizer que’ e afirma que não houve nenhuma negociação financeira envolvendo o apoio às campanhas eleitorais do ex-governador Beto Richa.
As negociações de apoio sempre ocorreram no âmbito político. Nesta eleição citada (2014) o grupo político buscava o espaço de vice-governador na chapa, o que de fato ocorreu.”
Leia trecho do depoimento de Fanini ao MP-PR:
Promotor – Tem uma história de uma partida de tênis, uma conversa com o governador?
Fanini – Isso já em 2014, doutor. Entrou o ano de 2013, eu fui arrecadando. Aí chegou em 2014, que era ano de eleição, da eleição dele. Ele me chama pra jogar tênis. Eu já tinha me mudado, daí é perto da minha casa o Graciosa Country Club, onde eu sou sócio há muito tempo e ele também é. E a gente foi jogar tênis lá. Ele me chamou assim: “Vamos jogar tênis?”. Era domingo de tarde, chuvoso. A gente sabia que não tinha ninguém lá na quadra. Tem quatro quadras cobertas lá. A gente ficou na última das últimas, que fica lá no fundo do clube. Eu e ele só. Ele dispensou a segurança. A segurança e motorista ficaram no carro. No intervalo entre um set e outro, fomos tomar uma água e ele falou: “Olhe, precisamos arrecadar, você precisa arrecadar. Este ano a coisa é bastante brava”. Daí eu falei: “Mas eu posso propor alguma coisa diferente pras empresas, posso combinar alguma coisa com eles que possa ser acertado depois, algo nesse sentido, Beto?”. Ele falou assim: “Pode, porque eu tenho grandes chances de ser eleito, devo ser reeleito. E aí a gente tem quatro anos depois pra ajeitar a situação dessas empresas parceiras. Pode fazer a parceria que você tiver que fazer”. Ele me deu o aval pra fazer. Foi quando eu começo a adiantar algumas faturas. Foi a partir desse momento.
Promotor – Ele te deu o aval?
Fanini – Pode fazer o que tiver que fazer. Faça pra arrecadar, porque eu tenho compromissos enormes. Depois, passado um tempo, ele me mostra uma lista do dinheiro que ele tinha que... Eu estava na casa dele, era um sábado. Ele tinha uma reunião de trabalho na casa dele. Era junho, julho de 2014 já. Ele meio indignado. Estava presente o chefe da arrecadação da campanha dele, que era o Juraci Barbosa, o tesoureiro. Estava o Luis Abi, o Ezequias, o Deonilson Roldo. E ele me mostra assim, indignado: “Veja aqui o papel, ó. R$ 800 mil tive que arrumar aqui pro Francischini, pro Solidariedade. R$ 2 milhões aqui pro Ricardo Barros”. Ele me mostra assim... os nomes que eu lembro na época. Era R$ 1,5 milhão pro Canziani, pra ter o PTB. E ele falou assim: “Então, veja como é isso aqui, entenda como que é a política. Política a gente faz assim ó. Tem que arrumar dinheiro e tudo dinheiro vivo”. Então ele fala do Ricardo Barros, do Alex Canzini e do Francischini.
Promotor – Compra de apoio político, é isso?
Fanini – Isso, compra de apoio político em caixa 2. Caixa 2. Tinha que ser dinheiro vivo. Não era nada dinheiro em caixa 1.
Moraes eleva confusão de papéis ao ápice em investigação sobre suposto golpe
Indiciamento de Bolsonaro é novo teste para a democracia
Países da Europa estão se preparando para lidar com eventual avanço de Putin sobre o continente
Ataque de Israel em Beirute deixa ao menos 11 mortos; líder do Hezbollah era alvo