A maioria dos paranaenses nem se deu conta, mas nesta quinta (7) e sexta-feira (8), Curitiba deixou de ser a sede oficial do governo do Paraná. A caneta do governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) foi parar a quase 500 quilômetros da capital, em Cascavel, na região Oeste. A justificativa para a ação foi a aproximação com a população do interior do estado. Mas o ato também é interpretado como um afago aos grupos que apoiaram o atual governador durante as eleições.
A transferência temporária do centro nervoso das decisões da administração pública paranaense pegou carona no evento que abriu o calendário agropecuário brasileiro e atraiu um público de cerca de 250 mil pessoas, o Show Rural Coopavel. “Queremos implantar este modelo de interiorização no Paraná, para colocar o governo mais próximo da população e fortalecer o interior”, afirmou o governador. Ao lado do vice, Darci Piana, e de parte do secretariado, Ratinho Junior trabalhou em um local reservado nas dependências do evento e realizou reuniões com prefeitos e líderes da região.
Esta foi a primeira de várias transferências da administração estadual que devem ocorrer ao longo dos próximos quatro anos. O cronograma ainda não está definido. De acordo com Secretaria da Comunicação Social do governo estadual, a dinâmica dos encontros será pautada, sempre que possível, por “evento ou estrutura capaz de otimizar a presença de lideranças de uma região em uma cidade”.
Outra informação que o governo não possui é o custo das ações e o tamanho das comitivas. “Ainda estamos fechando os custos. Mas são exclusivamente custos de deslocamento e hospedagem”, respondeu a secretaria até o fechamento desta edição. Os secretários de governo e presidentes das estatais estão sempre convidados a participar. Além do grupo composto por representantes do executivo estadual, participaram desta primeira incursão a Cascavel deputados estaduais e assessores.
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Descentralização
Governador por nove meses em 2010 e vice por sete anos, Orlando Pessuti (MDB), é um entusiasta da administração pública itinerante. “O ex-governador José Richa, em 1983, iniciou a interiorização no estado do Paraná. Depois Alvaro Dias, [Roberto] Requião e eu também fizemos”, recorda. O ex-governador Beto Richa também adotou a prática. Em 10 de dezembro de 2014, Londrina foi sede do governo do estado por um dia.
Como vice de Requião (MDB), Pessuti conduzia uma versão da Escola de Governo no interior. Apelidada de “Escolinha”, a reunião semanal com o secretariado era comandada pelo então governador na capital e transmitida pela TV e Rádio Educativa. “Vejo como um ato positivo [a mudança de sede]. Afinal, tem que governar para todos e é preciso descentralizar o governo”, avalia. Pessuti está no último mês de mandato como presidente do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul (BRDE). Pelo sistema de rodízio entre os três estados do Sul, em março a entidade passa para as mãos de um representante de Santa Catarina.
Retribuição
O movimento de levar parte da administração do Estado para outras cidades agrega mais ao capital político do governador do que produz resultados que não seriam obtidos se permanecesse despachando no Palácio Iguaçu, avaliam especialistas.
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“A Constituição Federal determina que o governo estadual tenha sede na capital do estado. Mas os despachos e determinações do governador têm validade de lei desde que sejam realizados dentro do limite estadual. A mudança de sede é mais um gesto para ficar nos registros como forma de homenagem, é simplesmente pró-forma”, explica Romeu Bacellar Filho, advogado especialista em direito administrativo.
“Não há ganho prático para a administração. O estado possui estrutura, superintendências regionais e subsedes para atender o interior”, pondera Luiz Domingos Costa, cientista político e professor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR). “A mudança mostra que o governo está atento para demandas de grupos políticos, prefeitos e empresários. Mas isto não tem conotação ruim, faz parte da administração pública. Quem está no interior sente-se prestigiado”, avalia Costa.
Porém, a falta de um cronograma definido definindo as cidades que devem abrigar a sede do governo fora de Curitiba embasado por critérios objetivos, como, por exemplo, priorizar regiões mais com menor infraestrutura ou Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), reforça a ideia de que a agenda tem direcionamento eleitoral. “Existe certa contradição. Mostra que é algo feito ao sabor da oportunidade, não há planejamento prévio”, aponta o cientista político.
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Costa destaca que muitos governadores são lembrados por descuidarem do interior, como o ex-governador Jaime Lerner, o que produz um impacto negativo na memória dos eleitores.