Os comércios de bairro, aqueles pequenos estabelecimentos instalados em ruas ou regiões majoritariamente residenciais (as Zonas Residenciais 1, ou ZR1), não vão mais poder oferecer estacionamento em Curitiba. A sugestão está na proposta da nova lei de zoneamento da cidade, que prevê regras para organizar o uso do espaço urbano.
A ZR1 é estritamente residencial, permite construções com um ou dois pavimentos de uso unifamiliar, e está espalhada por diversos bairros de Curitiba.
A proposta do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc) tem com objetivo impedir o acúmulo de veículos e o estrangulamento de ruas com menor poder de escoamento do trânsito em frente aos chamados comércios ou serviços vicinais, que atendem a áreas residenciais. Atingiria apenas os novos estabelecimentos.
O Ippuc também quer impedir que a população que mora ao redor desses estabelecimentos não seja prejudicada pelo movimento de carros em uma intensidade acima do que a área suporta, ou ainda com veículos estacionados em cima da calçada ou em pontos de circulação.
Uma série de audiências públicas já está sendo realizada para a discussão do projeto, e para que comerciantes possam tirar dúvidas sobre a condição de seus estabelecimentos. Depois, o texto será encaminhado à Câmara Municipal para votação, ainda sem data definida. A proposta pode ser consultada no site da prefeitura dedicado à lei de zoneamento.
“É mais ou menos o seguinte: há um restaurante ao lado de uma residência e, na hora do almoço, 20 carros estacionam na frente dessa residência. É isso o que se quer evitar”, explica Miguel Roguski, coordenador da lei de zoneamento e de revisão do Plano Diretor. Trata-se de uma demanda de moradores, segundo explicou à Gazeta do Povo Alberto Paranhos, economista urbano que trabalhou no Ippuc entre os anos 70 e 80, a quem o prefeito Rafael Greca confiou a tarefa de revisão do projeto elaborado pela gestão anterior.
Quem será afetado
As ZR1 são zonas residenciais exclusivas, de baixa densidade de ocupação, que permitem uma casa por lote com, no máximo, dois andares, e autoriza o funcionamento de comércio e serviços nas casas já existentes. Pela proposta, esses estabelecimentos – de até 100 metros quadrados e que na nova proposta poderão ser ampliados para até 200 metros quadrados – não estarão autorizados a oferecer vagas para carros se o projeto de lei de zoneamento for aprovado.
“Nesses comércios e serviços vicinais, a ideia é que as pessoas os acessem a pé, de bicicleta, mas não de carro. Por isso vamos incentivar para que não haja vagas”, informa Roguski.
O que não quer dizer, explica o representante do Ippuc, que todo e qualquer comércio de bairro terá que obrigatoriamente fechar os espaços destinados a estacionamento. A limitação visa a impedir o estrangulamento das vias normais, as que dão acesso local às residências.
Já as ruas mais movimentadas nos bairros são pontos de atração de comércio e serviço e ali o estacionamento é permitido. Um exemplo é a Rua Nicarágua, no bairro Bacacheri. Nessas ruas, o estacionamento já é autorizado – como já ocorre em supermercados e farmácias, por exemplo – e não deve mudar. O que não pode ocorrer nestes locais é o uso de recuos de calçada como estacionamento, como acontece hoje em alguns casos, embora não seja permitido – a lei determina que o solo dessa área seja permeável, para a absorção da água da chuva.
Comerciantes questionam
Comerciantes e funcionários de estabelecimentos comerciais ouvidos pela Gazeta do Povo entendem que a proposta de lei pode, nos casos em que não for possível oferecer estacionamento, influenciar negativamente no movimento de clientes. Para Alexander Leo, funcionário de uma revistaria no bairro Juvevê, o movimento deve cair.
“O local aqui é de rápida circulação. A pessoa entra, pega o que precisa e sai. O entra e sai acontece o dia todo. Tem que ser bem prático, a pessoa estaciona o carro, desce e vai embora”, explica. A revistaria está no endereço desde 1978. Ele defende, porém, que uma vez estabelecida, a lei seja respeitada.
Pedro Inocêncio, gerente de uma lavanderia e oficina de costura no bairro Bacacheri, diz acreditar também na redução de clientes caso o local não possa mais oferecer espaço para veículos, o que faz na parte da frente, com o recuo na calçada. “A tendência é piorar”, lamenta. “Muita gente vai passar e vai para outro lugar, porque não vai ter como estacionar o carro.”
Para a farmacêutica Roswitha Berendts, cliente da lavanderia, o fluxo de clientes deve diminuir com a impossibilidade de estacionamento. “Aqui [na região], pouca gente anda a pé. Eu tenho uma firma algumas quadras para baixo, mas não ando aqui a pé.”
Já Ana de Fátima, funcionária da oficina e lavanderia, credita à violência urbana o medo de muitos de circularem pelo bairro a pé, para acessar os serviços disponíveis. “As pessoas não andam a pé aqui com medo de serem assaltadas.”
Jardim no local
Há pouco mais de seis meses instalada em uma rua do Ahú, Iara Zacchi, proprietária de uma pequena loja de roupas, não oferece espaço para carros na área conhecida como recuo, na parte da frente da loja.
Disse ter sido informada pela prefeitura, assim que assumiu o ponto, de que teria que deixar a área disponível para escoamento da água das chuvas. E que em breve deve criar uma espécie de jardim no local. Ela lembra ainda que, no mesmo endereço, antes de abrir ali sua loja, um escritório costumava permitir o estacionamento de carros no espaço.
Sem engessar o empreendedorismo
A primeira audiência pública da lei de zoneamento foi realizada na última segunda-feira (25), com o objetivo de apresentar a proposta do Ippuc. A ação é parte do processo natural de revisão do plano diretor de 2014. O texto foi enviado em outubro do ano passado à Câmara e retirado da pauta de votações a pedido do prefeito Rafael Greca (PMN).
Em junho deste ano, um grupo de dez entidades, que inclui Federação do Comércio (Fecomércio), Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep), Sindicato da Construção Civil (Sinduscom), Sindicato da Habitação e Condomínios (Secovi-PR), Conselho Regional de Engenharia e Agronomia (Crea-PR), entre outras, pediu formalmente a revisão do projeto elaborado pela equipe do então prefeito Gustavo Fruet (PDT). Greca passou a tarefa a Paranhos. A lei foi retomada, então, para ser revisada, simplificada e adequada ao plano de desenvolvimento proposto para a gestão 2017-2020.
O diretor de planejamento e gestão da Fecomércio, Rodrigo Rosalém, informa que a entidade recebeu, em tempo que considera muito curto para análise, o texto revisado por Paranhos – o material anterior contava com 700 artigos; no momento, estão sendo apresentadas quatro leis: zoneamento básico (que mostra o que pode, onde pode e quanto pode construir), outorga onerosa (trata da contrapartida para a cidade pela permissão para construir a mais do limite básico permitido), sistema viário (estabelece a classificação das ruas por tipos de atividade) e incentivos e prêmios (permite a transferência do direito de construir com foco no benefício para a cidade e a população). E que por isso a entidade solicitou a postergação das audiências públicas, para que tivesse tempo hábil de estudar as propostas com cuidado. Assim, prefere falar de modo conceitual.
“Temos que tomar muito cuidado quando se limita ou engessa algumas características, especialmente para uso do comércio, em uma legislação. Porque da mesma forma que esse tipo de regra pode limitar grandes empreendimentos, grandes incorporações [em bairros residenciais], você pode também inviabilizar o pequeno. E quando você inibe o empreendedorismo, você deixa de gerar emprego e renda”.
Para Rosalém, a primeira versão do texto encaminhado ao Ippuc continha medidas que ele considerou restritivas à iniciativa própria e ao empreendedorismo. Ele explica que a defesa da Fecomércio vai no sentido de fomentar a possibilidade de novos negócios, incluindo os pequenos, de bairro, e que a legislação dê liberdade a iniciativas pequenas.
“Você tem um estabelecimento comercial bom, uma padaria num bairro, e essa padaria foi montada com determinado porte, e o serviço prestado é tão bom que há aumento da demanda. Tenho que oferecer um lugar para o meu cliente parar o carro”, defende.
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