O uso de slogans publicitários em telefonemas do governo do Paraná à população e a contratação do serviço de “telemarketing” por dispensa de licitação botaram a Casa Civil na mira do Ministério Público do Paraná (MP-PR). O inquérito civil foi oficializado no dia 11 de julho, após cinco meses de investigação preliminar, e tramita na 5ª Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público de Curitiba. A denúncia do contrato foi feita pela Gazeta do Povo, em reportagem publicada no dia 6 de fevereiro.
Durante o ano de 2017 foram disparadas 9,76 milhões de ligações telefônicas da Casa Civil para os paranaenses, mas pelo menos 8 das 21 campanhas (40% dos telefonemas feitos) não coincidem integralmente com a proposta da Central de Monitoramento dos Serviços Públicos. É esse o nome-fantasia do contrato firmado pela Casa Civil com a Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar), que na prática serviu como esquema paralelo de divulgação oficial.
Em 2017, os telefonemas automatizados com mensagens do governo custaram R$ 3,2 milhões aos cofres públicos. Renovado até o final de janeiro do ano que vem, o valor total do contrato chegará a R$ 6,5 milhões. Diz o contrato que o serviço de “telemarketing” era para comunicados de utilidade pública, coleta de dados sobre serviços do governo, convites para audiências e convocação de aprovados em concurso público. Especial para a Gazeta do Povo, Livre.jor mostrou que isso não foi seguido à risca - apesar do que diz o governo.
“Considerando que o conteúdo das mensagens é autoevidente e não necessita de maiores atos investigatórios para a conclusão sobre sua eventual ilegalidade, a investigação centra-se na averiguação da regularidade da dispensa de licitação para a contratação da Celepar e na ausência dos gastos deste contrato na contabilização de despesas com publicidade do governo do Estado”, explicou ao jornal a promotora Cláudia Madalozo, responsável pelo inquérito civil.
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Slogans publicitários
A documentação oficial mostra que a Central de Monitoramento foi gestada em 2016, quando Valdir Rossoni, do PSDB, chefiava a Casa Civil. Foi ele quem renovou o contrato no início deste ano, antes de deixar o cargo para candidatar-se à deputado federal. Dilceu Sperafico, que assumiu o comando, continuou se valendo das ligações - em agosto, por exemplo, os telefonemas são sobre a vacinação contra o sarampo.
Como a reportagem explicou em fevereiro, nenhuma das campanhas fez propaganda pessoal do ex-governador Beto Richa(PSDB), gestor à época, ou cita qualquer outro político diretamente. São as menções elogiosas à administração, alinhadas à publicidade oficial, que chamam a atenção. Por exemplo, o bordão “Governo do Estado, sempre a favor dos paranaenses” , aparece em 14 das 21 campanhas feitas pela Casa Civil. A apostila com as ligações feitas em 2017, obtidas pelo Livre.jor via Lei de Acesso à Informação, está disponível na internet para quem quiser conferir.
Quando as informações sobre os telefonemas vieram a público, a reportagem questionou a Casa Civil sobre o uso dos bordões. O órgão, na gestão Richa, respondeu que “os slogans são do governo do Estado. E o que se divulga são os serviços, obras ou ações do governo. Todos esses itens são de utilidade pública”. E que o julgamento negativo sobre o uso dos slogans era “uma avaliação pessoal de quem questiona” - no caso, a reportagem.
“As irregularidades que motivaram a instauração da Notícia de Fato [apuração preliminar, aberta em fevereiro, após protocolo do deputado Maurício Requião, do MDB] foram o possível desvio de finalidade do conteúdo das mensagens repassadas e a não inclusão dos gastos oriundos do contrato como verba de publicidade. Converteu-se em inquérito civil [em julho] pela necessidade de maiores diligências”, detalhou a 5ª Promotoria de Proteção ao Patrimônio Público de Curitiba. Se a promotora Cláudia Madalozo considerar o caso consistente, pode enquadrar a situação como ato de improbidade.
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Telefonemas continuaram
A Casa Civil do governo Cida Borghetti (PP) foi procurada pela reportagem e confirmou que a Central de Monitoramento dos Serviços Públicos continua telefonando para os paranaenses. Questionada sobre o número de campanhas, o teor das mesmas e a abrangência das ligações, limitou-se a dizer que são “orientação sobre serviços de utilidade pública, tais como campanhas de vacinação e de doação de sangue”.
Perguntada diretamente se o uso dos slogans publicitários nas mensagens continuava, o órgão responsável pela articulação política do governo do Paraná apenas disse que “o serviço está sendo prestado conforme previsto em contrato”. E que os telefonemas cumpriam o determinado pela lei federal 13.460/2017, que é posterior à assinatura do contrato e cuja vigência começou só neste ano, há apenas dois meses.
Apelidada de Código de Defesa do Usuário Público, a norma federal prevê pesquisa anual de satisfação com os cidadãos sobre a qualidade dos governos - desde que a apuração tenha “significância estatística” e que a avaliação seja “integralmente publicada no sítio [na internet] do órgão ou entidade, incluindo o ranking das entidades com maior incidência de reclamação dos usuários”.
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O governo não disponibilizou o teor das ligações feitas em 2018, logo não há como saber se servem para o monitoramento dos serviços públicos. No ano anterior, das 21 campanhas apenas uma, sobre segurança pública, atenderia a esses critérios. A confluência desse serviço de ligações com a divulgação do governo aparece na preocupação da Casa Civil com as eleições.
“Buscando evitar quaisquer equívocos de interpretação, o governo decidiu interromper temporariamente o serviço da Central”, confessou o órgão à reportagem. “A interrupção se dará a partir de 1º. de setembro e o serviço será retomado em 1º. de novembro. Neste mês de agosto, todo o trabalho da Central está concentrado na campanha de vacinação contra o sarampo, que vai até o dia 31”, explicaram-se.
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