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João Carlos Gomes, secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior. | Daniel Caron/Gazeta do Povo
João Carlos Gomes, secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior.| Foto: Daniel Caron/Gazeta do Povo

O secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, João Carlos Gomes, se mostra bastante confiante e tranquilo com a auditoria nas universidades estaduais anunciada pelo Tribunal de Contas do Paraná (TCE-PR). Ele confirma que o orçamento das instituições é um dos maiores do governo, mas diz que a verba serve também para executar várias políticas públicas, além de proporcionar ensino regular de graduação e atividades de pesquisa.

Gomes, que é ex-reitor da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), defende a padronização do sistema de folha de pagamento das instituições de ensino – nem todas aderiram ao Meta 4, utilizado pelo governo estadual. Segundo ele, uma comissão está avaliando se a melhor alternativa será mesmo o Meta 4 e de que jeito será implantado, dentro de um acordo feito com o governador Beto Richa (PSDB). O secretário confirma que algumas progressões de carreira em outros órgãos foram barradas em momentos de crise econômica, mas que depois foram pagas, de forma retroativa, e que é natural provocar temor de perda de autonomia nas universidades.

Por outro lado, Gomes assume a defesa integral das instituições quando o assunto é a utilização de recursos públicos. Diz que as universidades só praticam atos previstos em lei, e que não há desperdício ou uso ilegal de dinheiro. Além disso, já oferecem todas as informações à sociedade, diz ele. “Independentemente de estar no sistema Meta 4 ou não, já tem transparência, até porque está no Portal da Transparência do Paraná. Hoje todos os professores e funcionários administrativos aparecem no portal, com seus salários”, afirmou, em entrevista à Gazeta do Povo realizada em seu gabinete. Confira a entrevista completa:

As universidades estaduais do Paraná gastam muito?

Desde 2011 tivemos aumento considerável de investimento nas universidades. O fato desse aumento está baseado na questão salarial. Até 2010 havia uma defasagem salarial de muitos anos nas universidades. Na primeira gestão do Beto Richa – eu era reitor na época –, ele atendeu a uma reivindicação e deu aumento real de 32%, divididos em quatro parcelas anuais. Isso fez com que nossa folha de pagamento dobrasse. O orçamento das nossas universidades vai ficar este ano em torno de R$ 2,4 bilhões no ensino, além de R$ 600 milhões para os hospitais universitários [que recebem recursos da Secretaria da Saúde]. É um volume considerável, mas é uma estrutura grande. Temos mais de 340 cursos de graduação e em torno de 270 cursos de mestrado e doutorado. Somos aproximadamente 8 mil professores e 9 mil funcionários administrativos. E há muitas particularidades. Se olhar no mapa do Paraná, a capilaridade das instituições é muito grande. Estamos presentes em 32 municípios com campus presencial, mais de 60 com campus de ensino a distância e mais de 230 com atividades de pesquisa e extensão. Isso gera custo.

Mas, agora que o TC anunciou uma auditoria específica nas universidades, o sr. acredita que podem ser localizadas situações de desperdício de dinheiro?

Não acredito que será encontrado desperdício de recurso ou problema de ordem legal. Claro que, quando se faz uma análise mais profunda, podem ser feitas sugestões de mudanças. Mas é preciso ver o formato particular das universidades. Há uma integração muito forte com a sociedade, várias políticas de governo realizadas pelas instituições. Por exemplo, o patronato, que é um apoio que o estado dá, via universidades, aos egressos do sistema prisional ou para aqueles que cumprem medidas alternativas. Se o estado não fizer isso, quem fará? Há serviço similar voltado para crianças e adolescentes infratores e sua família. Outro projeto executado pelas universidades é o Bom Negócio Paraná, que qualifica os micro e pequenos empreendedores. Há a certificação de produtos orgânicos, feita pelos cursos de Agronomia com certificação do Tecpar. São vários programas que transcendem a função de ensino. Vamos cortar verbas? Podemos cortar, mas a comunidade deixará de ser atendida. Mesmo nestes anos de dificuldade, por vezes deixamos de investir em uma obra, mas não paramos os projetos de extensão, pesquisa. Foi determinação do governador.

O orçamento das universidades vai continuar crescendo?

Não vai ampliar porque não se está criando novos cursos. Mas precisamos fazer a manutenção dessa estrutura. Agora, é preciso ressaltar que dos nossos 6 mil professores, 5,5 mil são mestres ou doutores, ultrapassando 90% de titulação. Isso faz com que nas avaliações nacionais apareçam entre as 50 melhores do país, entre 600 instituições. As cinco mais antigas, que já são consolidadas. UEL, UEM, UEPG, Unicentro e Unioeste aparecem com nota 4 em uma escala até 5. Só 7% ou 8% das universidades estão aí. As outras duas mais novas, a UENP e a Unespar, já têm cursos de alta excelência e estão avançando na avaliação institucional.

De tempos em tempos ressurge a proposta de federalização das universidades estaduais. Qual sua opinião?

Não há como federalizar, são 23 estados. Seria como quase duplicar o sistema federal hoje. Quando eu era reitor da UEPG e presidente da Associação dos Reitores das Universidades Estaduais, fizemos um movimento para que a União destinasse verba do seu orçamento para compensar. Em 2010, um aluno no sistema federal custava cerca de R$ 18 mil ao ano. Na época, solicitamos que União destinasse R$ 2 mil reais por aluno matriculado nas universidades estaduais. O governo não pode atender, mas acho que essa é a forma mais coerente de resolver. Agora em 2017 estamos fazendo um trabalho com a bancada federal, governador e reitores, para destinar verba de emenda impositiva para cada uma das universidades, R$ 4 milhões para cada uma, para usar metade no custeio, metade no investimento. O valor é relativamente pequeno, mas é um início de verba federal no sistema estadual. Porque não vejo, em termos políticos, financeiros, administrativos, como federalizar.

O sr. avalia que há outras formas de financiamento para a universidade pública?

O pessoal precisa ser custeado pelo ente, seja estadual ou federal. E como esse volume chega a representar 90% do custo, o que se pode fazer é incentivar uma parceria maior com a iniciativa privada para trazer recursos para custeio e investimento. Já existem parcerias em todas as universidades, mas precisamos caminhar mais.

Há algum tipo de engessamento por questões sindicais ou corporativas?

Não é questão de sindicato. No Brasil existe é um grande problema com os marcos regulatórios. Já temos um embate aí há três, quatro anos com o governo federal, para mudar a Lei de Inovação. Hoje, para comprar um produto para pesquisa dentro de uma instituição é preciso seguir o mesmo procedimento legal de compra de um litro de material de limpeza. A própria participação do professor em um projeto de pesquisa com iniciativa privada, há leis que dificultam. Quando Dilma Rousseff (PT) promulgou a Lei da Inovação, vetou alguns artigos que nos dariam redenção. Estamos tentando rever essa situação. Há resistências internas, mas esse não é o problema.

Uma grande resistência que existe é referente ao sistema Meta 4, de folha de pagamento. Como o sr. vê essa situação?

Há uma preocupação das universidades que, entrando no sistema, percam parte da autonomia. Mas não perdem, porque o sistema permite fazer tudo que está na lei e as universidades hoje só aplicam o que a lei permite, tenho convicção de que é assim. Mas, se um dia o estado estiver com dificuldade financeira, o que espero que a gente não enfrente mais, pode ser que o governo determine algumas medidas, como corte de hora-extra. Claro, isso pode acontecer, mas é o agente pagador que sabe que não se pode gastar a mais. O Meta 4 é um sistema de folha de pagamento. Cada uma das nossas universidades tem o seu sistema e de fato é meio difícil de administrar, cada um com o seu. A proposta acordada com o governador é bem clara: uma comissão para discutir um modelo ideal para as universidades e o governo. Estamos caminhando para chegar a um denominador comum. É importante dizer que o sistema não tira autonomia, porque tudo aquilo que é legal é permitido no Meta 4.

A maioria dos reitores não vê o assunto com tanta tranquilidade...

Há uma preocupação de perder autonomia com a ascensão na carreira, e até entendo. Porque houve momentos de dificuldades financeiras e o governo não deu o aumento da carreira. Depois fez, inclusive retroagindo. Agora estamos discutindo mais, até para definir uma verdadeira autonomia das universidades. Ainda não temos um modelo, mas vamos ver o de outros estados, estudar o que melhor se aplicaria no Paraná.

O sistema Meta 4 trará algum impacto na transparência das universidades?

A universidade, independentemente de estar no sistema Meta 4 ou não, já tem transparência, até porque está no Portal da Transparência do Paraná. Hoje todos os professores e funcionários administrativos aparecem no portal, com seus salários. Então, nem há como aumentar a transparência.

O sr. citou alguns compromissos assumidos pelo governador. Mas há setores do governo que pensam diferente?

Quem tem que fazer o compromisso é o governador mesmo. Mas é natural que cada pasta administre sua área. A Saúde vai priorizar as ações na sua área, a Ciência e Tecnologia também. A Secretaria da Fazenda tem a responsabilidade de criar mecanismos financeiros orçamentários para dar cumprimento à política de governo. Às vezes a Fazenda recebe críticas, mas injustamente, porque tem a responsabilidade de que mês a mês, ano a ano, o estado tenha o dinheiro para pagar seus compromissos. E não vejo nenhuma área contra a política de Ensino Superior do governo. Todos os secretários sabem da importância das universidades para o desenvolvimento regional do Paraná.

A gestão de Beto Richa acaba em 2018. A política de Ensino Superior continuará em qualquer governo?

As universidades públicas estaduais são uma política de estado, não de governo. Já passamos momentos difíceis. Em 2003, com uma canetada do governador [Roberto Requião] foi fechado o curso de Medicina da UEPG. Isso sim foi ferir a autonomia da universidade, alunos tiveram que se mudar de Ponta Grossa, foi um desrespeito. Então, já tivemos momentos difíceis. Eu sei, sou professor há 35 anos. Agora, não vejo nenhuma possibilidade de hoje ter ambiente para qualquer governador fechar curso. Não é perfil do governador atual. E ninguém deve fazer no futuro. É um sistema consolidado. Agora, precisamos de um pacto, todo o Brasil. Precisamos de muito investimento em ciência, tecnologia e inovação. Não dá para investir em educação e achar que vamos crescer. Precisamos fazer mais, tanto o sistema público como privado.

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