As duas novas denúncias oferecidas pelo Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR) no âmbito da Operação Quadro Negro envolvem dez acusados e incluem, pela primeira vez, o ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB). Embora o nome do tucano já circulasse em depoimentos de delatores, é a primeira vez que ele é acusado criminalmente dentro da investigação sobre desvio de recursos de obras em escolas.
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A primeira fase da Operação Quadro Negro foi deflagrada em meados de 2015 e já gerou quatro ações penais na Justiça Estadual. As duas novas denúncias foram oferecidas no último dia 13 à 9ª Vara Criminal de Curitiba, que, até o início da noite desta terça-feira (19), ainda não tinha decidido se acolhia ou rejeitava as acusações.
Na primeira denúncia, com foco no desvio de dinheiro, o MP incluiu seis pessoas: Beto Richa é acusado de organização criminosa, corrupção, fraude em licitação e lavagem de dinheiro. Além do tucano, também foram denunciados Luiz Abi Antoun (primo de Beto Richa); Ezequias Moreira Rodrigues (ex-secretário da gestão Richa); Jorge Atherino (empresário e amigo de Beto Richa); e também os delatores Maurício Fanini (ex-diretor na Secretaria da Educação) e Eduardo Lopes de Souza (dono da empresa Valor Construtora).
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A segunda denúncia, pelo crime de obstrução de justiça, foi feita contra sete pessoas: neste caso, além de Beto Richa, Jorge Atherino e Maurício Fanini, também figuram na lista de denunciados a ex-primeira-dama Fernanda Richa, o advogado Sérgio Botto de Lacerda (que já foi procurador-geral do Estado na gestão Requião), o empresário João Gilberto Cominese Freire e Rafael de Sarandy Wawryniuk (genro de Jorge Atherino).
Foi o suposto crime de obstrução de justiça que serviu para o MP justificar o pedido de prisão contra três dos denunciados, Beto Richa, Jorge Atherino e Ezequias Rodrigues, nesta terça-feira (19), no bojo da batizada “Operação Entre Amigos”, uma quarta fase da Operação Quadro Negro.
Desvio de dinheiro
A Operação Quadro Negro mira contratos feitos entre construtoras e a Secretaria de Estado da Educação, para reforma ou construção de escolas. Delatores contam que evoluções fictícias das obras eram apresentadas por quem deveria fiscalizá-las. Pagamentos indevidos eram liberados a empresas a partir das falsas medições. Parte do dinheiro seguiria para o grupo de Beto Richa e as obras demoravam para sair do papel. “Este modus operandi permitiu que fossem pagas vantagens indevidas, em prejuízo do erário paranaense, na ordem de, pelo menos, R$ 21.743.114,90, em valores não atualizados”, calcula o MP, somente com base em dez licitações vencidas pela Valor Construtora.
Neste contexto, Beto Richa é apontado pelo MP como “comandante e principal beneficiário” do esquema de desvio de dinheiro. Hoje delator, Maurício Fanini foi chamado por Beto Richa para ocupar a cadeira de diretor de Engenharia, Projetos e Orçamentos dentro Secretaria da Educação, durante a primeira gestão do tucano, e ficou responsável pela arrecadação ilegal junto a “empresas parcerias”. “Fanini recebeu, diretamente do então governador do estado, a espúria missão de solicitar vantagens indevidas a alguns empresários”, narra o MP, na denúncia.
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“As pessoas escolhidas pelo denunciado Beto Richa para fazer o recolhimento das vantagens indevidas foram selecionadas entre aquelas de sua mais alta confiança. Num primeiro momento, essa função foi exercida por seu primo, Luiz Abi Antoun, depois substituído por Ezequias Rodrigues”, aponta o MP. “Cabia a eles, mediante a determinação do líder da organização criminosa, informar a Maurício Fanini o momento e o montante que deveria ser repassado no interesse da cúpula do grupo”, continua a denúncia.
Quando o valor era definido, Abi e Ezequias Rodrigues chamariam emissários para fazer o recolhimento do dinheiro. Os investigadores contam que Abi acionava duas pessoas, de alcunha “Pablo”, e que ainda não foram identificadas pelo MP. Já Ezequias Rodrigues chamaria o empresário Jorge Atherino, amigo de longa data de Beto Richa (o tucano chegou a ser estagiário de Atherino, na época de estudante de engenharia civil).
Amizade e mesada
A segunda denúncia oferecida pelo MP contra sete pessoas tem ligação com uma suposta tentativa de atrapalhar as investigações. “A partir do momento em que a prática de alguns desses ilícitos começou a vir a público, no primeiro semestre de 2015, a organização criminosa passou a adotar medidas com vistas a embaraçar as investigações que se iniciavam, notadamente para obstar a colheita de provas que levassem à identificação da integralidade de seus integrantes, em especial de Beto Richa, à época ainda exercendo a função de governador do estado do Paraná”, escreve o MP.
Neste ponto, os investigadores consideram que a ex-primeira-dama Fernanda Richa teve um papel “decisivo”, já que ela era amiga íntima de Betina Sguario Moreschi Antonio, mulher de Maurício Fanini. Ela teria agido, segundo o MP, “no sentido de evitar que Maurício Fanini, que acabou sendo preso e apontado publicamente como principal responsável pelos desvios investigados, revelasse fatos que pudessem levar à responsabilização do seu marido, Beto Richa”.
O empresário Jorge Atherino também teria colaborado nisso. Ele teria entregue por mais de um ano “expressivas e periódicas quantias em dinheiro a Maurício Fanini” para que ele se mantivesse em silêncio. Em determinado momento, para fazer os repasses da mesada, Atherino teria contado com ajuda de duas pessoas, João Gilberto Cominese Freire e Rafael de Sarandy Wawryniuk, que também acabaram alvos da denúncia.
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Destruição de provas
De acordo com o MP, em março de 2015, quando as fraudes na pasta da Educação começaram a surgir na imprensa, Beto Richa determinou que Maurício Fanini “excluísse de todo e qualquer dispositivo eletrônico que possuísse todo e qualquer registro em foto ou vídeo em que ambos aparecessem, bem como qualquer comunicação existente entre eles”. Já em julho de 2015, o advogado Sérgio Botto de Lacerda, a pedido de Beto Richa, também teria conversado com Maurício Fanini sobre o assunto.
Botto de Lacerda teria pedido, segundo o MP, para Fanini “se desfazer de qualquer elemento de prova que pudesse vinculá-lo ao então governador do estado, bem como de qualquer quantia de dinheiro em espécie que, eventualmente, possuísse em sua residência”. Fanini estava na iminência de ser preso e também teria sido avisado por Botto de Lacerda sobre a possibilidade de detenção.
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Outro lado
A defesa de Beto Richa alega perseguição, afirma que foi a gestão do ex-governador do Paraná que descobriu e denunciou as fraudes nas obras das escolas, “tendo tomado as medidas cabíveis, no âmbito administrativo, para responsabilizar os culpados”. A nota diz ainda que “a determinação de prisão exarada hoje não traz qualquer fundamento”: “Tratam-se de fatos antigos sobre os quais todos os esclarecimentos necessários já foram feitos”.
O advogado de Maurício Fanini, Tracy Reinaldet, afirmou que o denunciado “continuará colaborando de modo amplo e irrestrito com a Justiça, esclarecendo os fatos investigados e apresentando provas de suas declarações".
O advogado Marlus Arns de Oliveira, que atua na defesa de Ezequias Moreira, informou que se manifestará nos autos do processo.
Carlos Alberto Farracha de Castro, advogado de Jorge Atherino, informou que a defesa ainda está analisando o processo, mas disse que os fatos que embasaram o pedido de prisão são de 2014 e que o cliente já tinha se colocado à disposição do Ministério Público e da Justiça para prestar esclarecimentos.
“Respeitamos o trabalho do Ministério Público, mas acreditamos que neste caso não há requisitos que justifiquem o pedido de prisão preventiva”, afirmou a defesa de Atherino.
Já o ex-procurador-geral do estado Sérgio Botto de Lacerda afirmou que a denúncia não tem o menor fundamento. “Já expliquei essa questão ao Ministério Público lá atrás. Eu não estava em Curitiba na data dos eventos citados, comprovei isso ao Ministério Público. Não tenho nada a ver com essa questão”, disse Botto de Lacerda.
A defesa do delator Eduardo Lopes de Souza, da construtora Valor, disse que não vai se manifestar.
A defesa de Fernanda Richa informou que não teve acesso aos autos e só irá se pronunciar quando puder conhecer os fatos em sua integralidade.
A Gazeta do Povo ainda tenta contato com os demais acusados.