O deputado estadual Plauto Miró (DEM), reeleito no último domingo (7), foi denunciado nesta quarta-feira (10) por improbidade administrativa no âmbito civil da Operação Quadro Negro. Outras 10 pessoas também são alvo do mesmo processo movido pelo Ministério Público do Paraná (MP-PR), que pede ainda indisponibilidade de bens de cerca de R$ 5,2 milhões e indenização por danos morais coletivos. As informações foram divulgadas pelo G1 e confirmadas pela Gazeta do Povo nesta quinta (11).
A denúncia do Grupo Especializado na Proteção ao Patrimônio Público e no Combate à Improbidade Administrativa (Gepatria) envolve Eduardo Lopes de Souza, dono da Valor Construtora, Maurício Fanini, ex-diretor da Secretaria de Estado da Educação (Seed), e outras pessoas, além de oito empresas.
A investigação tem como base a reforma da Escola Estadual Francisco Pires Machado e o contrato firmado entre Ponta Grossa, a Seed e a Valor. Orçada em R$ 4,7 milhões, a nova sede da escola teria dois pavimentos, por onde se estenderiam 16 salas de aula, além de laboratórios de informática e ciências, e que serviriam a 1,8 mil estudantes. De acordo com a denúncia, os alunos “foram preteridos com a não construção da escola e obrigados a exercer o direito fundamental ao ensino de qualidade em condições absolutamente precárias”.
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Corrupção
A construção de uma unidade própria da escola era demanda antiga da comunidade. Desde 2002, o funcionamento do estabelecimento se dava em dualidade administrativa, ou seja, em espaço compartilhado com a Escola Municipal Deodoro Alves Quintiliano. Em dezembro de 2011, para corrigir a situação, foi assinado um termo de convênio de cooperação técnica e financeira entre o Paraná (Secretaria de Estado de Educação) e o município de Ponta Grossa, sendo o primeiro responsável pela viabilização dos projetos da obra e pelo repasse de recursos e o segundo pela doação do terreno.
Apenas a Dang Construtora e a Valor apresentaram propostas na licitação.Com a inabilitação da primeira, a Valor ficou com o contrato. Para o Ministério Público, “a ausência de participantes, somada à proposta sem descontos oferecida pela Valor Construtora, como se soubesse (e realmente sabia) que ganharia a licitação do tipo menor preço, se deve, na verdade, às intervenções políticas e escusas, as quais comprometeram toda a lisura do certame”. “Não se tratou de algo fortuito ocasionado por conjunturas do mercado, mas de ajuste prévio para se subtrair a competitividade da licitação”, afirma a denúncia. A investigação leva em conta delação premiada de Eduardo Lopes de Souza, dono da construtora.
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Segundo o colaborador, o resultado da concorrência pública foi negociado com Plauto (cujo reduto político é Ponta Grossa), sob a promessa de que o parlamentar receberia 5% do total do contrato firmado entre o município e a empresa. Uma vez negociado o valor da propina, Plauto e Eduardo contariam com o auxílio de João Ney Marçal Júnior, ex-aliado político do parlamentar e ex-servidor comissionado da Assembleia Legislativa do Estado, pois, na condição de Secretário de Planejamento de Ponta Grossa, “teria poderes para interferir em seu curso”.
Segundo o MP-PR, não houve pagamento de propina decorrente da suposta fraude, o que, “embora aparente ter menor impacto, não diminui, tampouco afasta as respectivas responsabilidades, já que ambos influíram, direta ou indiretamente, no fluxo normal da concorrência pública”.
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“O proprietário da construtora Valor enfatiza, inclusive, que apenas não repassou o percentual de 5% para o parlamentar, pois teve que arcar com despesas ilícitas não previstas ao início da negociação, vale dizer, o pagamento de terceiros (empresários do ramo da construção civil) para garantir sua vitória no certame. A organização do esquema, frise-se, foi integralmente consentida por Plauto Miró”, afirmam os promotores que assinam a peça.
Segundo a denúncia, as outras empresas denunciadas deixaram de participar da licitação porque receberam vantagens indevidas, o que foi viabilizado através da emissão de cinco cheques, anexados ao processo. Os proprietários dessas empresas também são alvo da denúncia.
Medições
Segundo o MP-PR, Eduardo Lopes de Souza indicou na delação irregularidade no curso da execução contratual, “quando Plauto Miró, interessado em se apoderar de parte dos recursos públicos que financiavam a obra, lhe sugeriu utilizar a mesma prática empregada em contratos estaduais entabulados com a Secretaria de Estado da Educação, onde a empresa Valor, em conluio com agentes públicos, recebia pagamentos antecipados, embasados em planilhas de medições falsas, que atestavam serviços não executados pela empresa”.
De acordo com a colaboração premiada, o deputado estadual solicitou uma medição fraudulenta de R$ 1 milhão, “montante que teria que dividir com quem viabilizasse o pagamento no âmbito da prefeitura”. Uma servidora de Ponta Grossa disse aos promotores do Gepatria que essa tentativa ocorreu antes das eleições de 2014. A fiscal da obra, designada pelo próprio município, no entanto, apresentou resistência ao esquema e discordou da medição elaborada pelos engenheiros da Secretaria de Educação. A medição extraoficial seria de R$ 737.316,58, mas a fiscal do município teria atestado apenas R$ 88.946,35.
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“Portanto, resta mais do que evidenciada a tentativa de desvio de recursos públicos por parte de servidores públicos e agentes políticos, em concurso com particulares, através de uma falsa medição da obra, a qual, caso tivesse sido aceita pela fiscal da prefeitura, geraria pagamento indevido em favor da empresa Valor no montante de R$ 648.370,23, que, em última análise, custearia propina em prol do réu Plauto Miró e seus aliados na prefeitura de Ponta Grossa”, aponta a denúncia.
A Operação Quadro Negro apura, a partir do esquema de medições fraudulentas, adiantamento de recursos públicos sem a devida contraprestação e concessão de aditivos injustificados, desvios da ordem de R$ 20 milhões. De acordo com o MP-PR, “restou comprovado um conluio entre agentes públicos e privados para fraudar laudos de medições e viabilizar o pagamento antecipado de obras de construção, reforma ou ampliação de escolas, sem a efetiva contrapartida pela Valor e sem a real execução das obras contratadas, o que ensejou expressivo prejuízo financeiro ao Estado do Paraná”.
Nulidades
O Ministério Público do Paraná requer a nulidade absoluta da concorrência pública e do contrato administrativo entre o município e a Valor, e, por arrastamento, “dos atos administrativos que ensejaram os pagamentos”. E também a nulidade na contratação da empresa por “dano aos cofres públicos, na medida em que impediu a seleção da melhor proposta, bem como ensejou pagamentos sem calço jurídico válido”.
De acordo com os promotores, os réus violaram o princípio da moralidade administrativa e o princípio da impessoalidade, “na medida em que não se mostra ético, moral, imparcial, afastar a concorrência de certame público, anuir com tal situação ou, ainda, aceitar suborno para deixar de oferecer proposta em licitação, tudo a favorecer uma determinada empresa, em detrimento do interesse público que tanto demandava a escola específica”.
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Na esteira, o Ministério Público pede indisponibilidade de bens da ordem de R$ 5,2 milhões contra Plauto Miró, João Ney Marçal Júnior e Eduardo Lopes de Souza para compensar a “obra inacabada”, e dano moral coletivo difuso porque os atores teriam violado os princípios de moralidade e higidez da administração pública.
“A conduta dos três requeridos foi determinante para o descumprimento do ajuste entre o Paraná e o município, o que ocasionou o inadimplemento de ambos no cumprimento de dever constitucionalmente imposto, a educação. Foram eles os protagonistas da fraude. Gerou-se um verdadeiro vazio que se reflete na qualidade de formação de todos aqueles que seriam destinatários diretos dos benefícios que a construção de uma unidade própria para a Escola Estadual Francisco Pires Machado traria”.
Plauto Miró
Segundo a delação do dono da Valor Construtora, o deputado Plauto Miró teria recebido R$ 600 mil em propina, em duas parcelas de R$ 300 mil, em todos os desvios indicados na Quadro Negro. Parte do dinheiro teria sido entregue na própria Assembleia Legislativa e a outra parte em uma padaria no bairro Batel, em Curitiba. Em ambos os casos, o pagamento teria sido feito em dinheiro vivo.
O delator afirma que o dinheiro para bancar os aditivos de contratos com as construtoras saía do montante que a Assembleia Legislativa tradicionalmente devolve ao Poder Executivo, como sobra de orçamento. Segundo Lopes de Souza, cerca de R$ 6 milhões em aditivos contratuais teriam sido bancados por esses recursos. Como Plauto era 1º Secretário da mesa-diretora, teria cobrado 10% sobre este valor para “arrumar” o dinheiro, de acordo com o delator. Os aditivos foram assinados por Beto Richa (PSDB) em 3 de dezembro de 2014.
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De acordo com os promotores, nesse caso específico, o deputado estadual vinha pleiteando a construção da Escola Francisco Pires Machado desde 2011 - ele é parlamentar desde 1991. Mas, “pretendia, através da medição fraudulenta, apropriar-se de recursos destinados à educação, afastando-se dos interesses da comunidade escolar que dizia representar”.
“O engajamento do parlamentar com os interesses da referida comunidade era apenas aparente, já que orquestrou um esquema de corrupção, pelo qual pretendia enriquecer-se das verbas públicas repassadas ao município de Ponta Grossa”, aponta a denúncia.
Outro lado
O deputado Plauto Miró afirmou em nota que já prestou os devidos esclarecimentos sobre o assunto para o Ministério Público e somente se manifestará sobre o fato perante o Poder Judiciário, quando for oficialmente intimado para tanto. À RPC, disse que “não foi pago nenhum tijolo a mais do que foi executado”.
Em maio, quando o depoimento do dono da Valor foi divulgado, Beto Richa afirmou que “são falsas as informações prestadas por um criminoso confesso que não tem fundamentos ou provas” e que determinou investigações quando soube das irregularidades enquanto ainda era governador.
O ex-secretário João Ney Marçal Júnior disse que não houve fraude na licitação. “A participação da prefeitura foi de total lisura, com fiscalização correta. Não houve nada de errado. Quando a Valor saiu da obra, depois das denúncias, ainda tinha crédito a receber”, afirmou. “As comissões de licitações são grandes. Mas da minha parte o contrato foi legal”.
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