Policiais militares que não cumprem mínimo de abordagens são acusados de transgressão disciplinar no interior do Paraná.| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

O 27º Batalhão da Polícia Militar (PM) do Paraná – que abrange 11 municípios da região de União da Vitória, no Sul do estado – estabeleceu metas quantitativas, com número mínimo de abordagens que devem ser feitas por cada equipe de patrulhamento. Os policiais que não batem as metas têm respondido a procedimentos internos, acusados de transgressão disciplinar. Em julho, pelo menos quatro soldados se tornaram alvo de apuração por não terem atingido o número mínimo de revistas.

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As metas foram instituídas em maio do ano passado a partir do memorando nº 001/17, assinado pelo major Renato dos Santos Taborda. Segundo o documento, cada equipe de patrulhamento de União da Vitória e da 3ª Companhia de São Mateus do Sul deve abordar pelo menos dez pessoas, cinco carros e cinco motos, por turno. Nas demais cidades atendidas pelo batalhão, a meta é de cinco pessoas, três automóveis e três motos. Todas as revistas devem ser detalhadas em um relatório, entregue aos oficiais.

O memorando destaca que para cumprimento do número mínimo de abordagens só contam as revistas feitas a partir da iniciativa das próprias equipes de patrulhamento. Não são contabilizados, por exemplo, atendimentos de chamados feitos via 190. “Salientando que essas abordagens serão de iniciativa dos policiais militares diante as suspeições, não computando-se as abordagens originadas de ocorrências e operações”, consta do documento.

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Transgressão

Em julho, o 27º Batalhão instaurou procedimentos internos contra quatro soldados (dois que atuam em São João do Triunfo e dois, em União da Vitória), por considerar que havia indícios de que eles cometeram transgressão disciplinar. De acordo com o despacho nº 040/18, eles estavam escalados para atuar no patrulhamento nos dias 24 e 25 de julho, mas “deixaram de cumprir o número mínimo de abordagens durante o serviço, conforme preconiza o memorando nº 001/17”. “Desta maneira, teriam infringido normas que regem a administração militar, em vigor na PMPR”.

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Esclarecimentos

A Associação dos Praças do Paraná (Apra-PR) – que representa soldados, cabos e sargentos da PM – adiantou que está preparando um ofício, que será encaminhado ao Comando da corporação, pedindo esclarecimentos em relação à determinação que estabelece as metas de revistas.

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“As abordagens não podem ser aleatórias, nem serem feitas de forma mecânica. O policial tem que fazer o patrulhamento e efetuar as abordagens conforme os requisitos da lei: mediante fundada suspeita e de acordo com o cenário”, disse o presidente em exercício da associação, Jayr Ribeiro Junior.

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“Mais importante que a quantidade é a eficiência”

O estabelecimento de metas de abordagem já foi adotado em outros estados, como São Paulo e Ceará, e é considerada uma medida controversa dentro das próprias polícias e de órgãos de controle externo. Em 2011, no Ceará, o Ministério Público reagiu à política da PM de instituir um número mínimo de revistas por equipe, argumentando que as abordagens sem ordem judicial ou fundada suspeita fere garantias constitucionais – como o direito a locomoção, a intimidade e a dignidade.

Ex-secretário Nacional de Segurança Pública e consultor na área, o coronel José Vicente da Silva Filho destaca que, mais importante do que o número de abordagens, é a qualidade dos procedimentos e os procedimentos adotados pelos policiais durante as revistas. Na avaliação dele, ao se instituir metas, se induz as equipes a fazer mais buscas pessoais do que o necessário – o que gera impactos negativos à sociedade e aos próprios policiais.

“A própria PM de São Paulo que adotou metas está revendo isso. Ano retrasado, a PM abordou 15 milhões de São Paulo, o que dá um terço da população do estado. A cada 100 abordagens, aconteceu um flagrante. Em Nova Iorque, com protocolos mais criteriosos e técnicos, a cada cinco abordagens há um flagrante”, disse.

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Neste aspecto, Vicente da Silva ressalta a necessidade de a PM atuar com inteligência policial – definindo protocolos claros de abordagens de acordo com cada situação e planejando o patrulhamento de acordo com o “mapa do crime”. “Mais importante do que a quantidade é a eficiência. A polícia tem que estar operante, mas com técnica e educação. Para isso, são necessários três coisas: padrão, treinamento e supervisão”, avaliou.

Outro lado

O Comando da PM foi procurado pela Gazeta do Povo no dia 13 de agosto, mas até a publicação desta reportagem não houve resposta.

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