O governo do Paraná e ambientalistas ainda têm divergências a respeito da construção da Faixa de Infraestrutura no Litoral do estado. A proposta prevê um conjunto de obras em Pontal do Paraná: uma rodovia em pista dupla, um canal de drenagem, uma linha de transmissão de energia elétrica, um gasoduto e um ramal ferroviário, além das ligações da rede de água e esgoto.
O que ninguém nega é que, caso saia do papel, o empreendimento com custo estimado em R$ 369 milhões vai alterar completamente a configuração da área, com desdobramentos em cidades da região litorânea. Não há consenso com ambientalistas sobre a melhor alternativa para a obra, porque vários interesses, diretos e também difusos, estão envolvidos na questão.
A administração estadual reconhece que a obra daria condições para a instalação de um terminal portuário em Pontal do Paraná, mas rechaça que esse seja o principal objetivo do investimento. Segundo o secretário estadual do Planejamento, Juraci Barbosa, o foco é a população. Há projeções que indicam aumento populacional considerável na cidade, além de um estrangulamento na PR-412, com crescimento de 57% no tráfego (atualmente já considerado saturado).
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A alternativa de duplicar a PR-412, que corta Pontal do Paraná, foi descartada pelo governo com o argumento de que a obra seria muito cara, por causa da necessidade de desapropriações, e que não resolveria a questão, atraindo para a área urbana o trânsito pesado de veículos.
“Vamos supor que o porto não saia. É justo que a população fique sem conseguir transitar durante 90 dias por ano?”, indaga o secretário.
O consultor de infraestrutura da Federação das Indústrias do Paraná (Fiep), João Arthur Mohr, é um fervoroso defensor da obra em Pontal. Além de propiciar a instalação de empresas, a Faixa de Infraestrutura permitiria que gargalos logísticos fossem sanados. Segundo Mohr, acaba ficando caro, sem contar o “gasto de paciência”, para percorrer a PR-412. “Eu mesmo já levei quatro horas para percorrer 10 quilômetros ali. Para uma transportadora, isso representa prejuízo. E quem está a passeio pensa duas vezes se sabe que vai precisar enfrentar isso”, comenta.
Desenvolvimento
Barbosa insiste que se trata de uma questão focada no desenvolvimento dos moradores e turistas, impactados por congestionamentos, acidentes e parcas opções de trabalho. A obra também promete resolver outro problema recorrente no local: os alagamentos. A construção do canal de drenagem controlaria a vazão da água, além de servir de opção de lazer e de transporte, com pequenos barcos.
Um dos receios é que a abertura de uma nova estrada, no meio de um dos mais conservados e últimos remanescentes de Mata Atlântica, incentive a ocupação desordenada. A Secretaria do Planejamento alega, contudo, que com regras – estabelecidas por lei e controladas por fiscalização – seria possível conter esse tipo de invasão, que é comum ao longo de novas rodovias.
Para o governo, a Faixa de Infraestrutura poderia ter o efeito contrário, servindo como uma barreira de contenção, estabelecendo os limites de até onde a configuração urbana poderia se estabelecer. Os técnicos destacam que hoje, sem controle, esse avanço em direção à mata já acontece, aos poucos e de difícil reversão, tanto partindo de Pontal como se espalhando a partir de Paranaguá.
Ligação
O conjunto envolvendo ferrovia, gasoduto e linha de transmissão levanta um questionamento: ligaria o que a quê? Atualmente, não há demanda. Seria uma instalação para necessidades futuras. Sem o complexo portuário, a secretaria admite que não haveria demanda. Consultada, a empresa Rumo Logística, concessionária responsável pela malha férrea na região do Litoral, informou que não há previsão de investimento na construção de um ramal ferroviário em Pontal do Paraná.
Questionado pela Gazeta do Povo sobre o motivo da urgência na aprovação do projeto, o secretário reconheceu que “os investidores precisam de uma definição” e que o governo foi procurado por empresários que, na condição de sigilo, apresentaram informações sobre “janelas de oportunidades” que estariam abertas agora, se a obra sair logo. “O dinheiro não espera”, disse. Barbosa não descarta que, caso empresas se instalem no complexo portuário, o governo exija algum tipo de contrapartida pelas obras realizadas. “Para mim, o projeto está maduro”, declarou.
Além do investimento público para propiciar a instalação de um porto privado, o projeto causa receio também em quem gosta da tranquilidade de Pontal. A ideia da movimentação intensa de caminhões e de uma série de problemas decorrentes de um complexo portuário faz com que a construção da Faixa de Infraestrutura não seja unanimidade. Contudo, o discurso das oportunidades e da geração de emprego costuma prevalecer numa fatia da população local.
Faixa de Infraestrutura acirra ânimo com ambientalistas
Em meio a tantos embates sobre o projeto da Faixa de Infraestrutura, as reuniões para discutir o assunto têm sido acaloradas. Foi assim no início do ano, quando aconteceram as audiências públicas, e o cenário também se repetiu no dia 20 de novembro, em Pontal do Paraná, durante a sessão do Conselho de Desenvolvimento do Litoral (Colit), que aprovou a realização da obra após uma reviravolta, que inclui um pedido de vista e a volta do tema à pauta da comissão no mesmo dia.
As entidades ambientais consideram que foi feita uma manobra para a aprovação do projeto e que as regras do Colit foram desrespeitadas – por isso, pretendem levar o caso à Justiça. Dayley Fischer, da organização Mater Natura, comenta que o regimento interno é claro sobre a possibilidade de adiamento da discussão de projetos em pauta. “O artigo 39 diz que é facultado ao conselheiro requerer vista de matéria ainda não votada, uma única vez, sendo o procedimento retirado automaticamente da pauta da reunião”, afirma. Ela conta que, no passado, em outro pedido de vista negado pelo conselho, a Justiça deu ganho de causa à entidade, considerando que havia o direito de se analisar o projeto por um prazo maior.
Para a ambientalista, o processo todo foi “atropelado”. “Um dos papeis do Colit é ter um olhar sobre o Litoral como um todo, analisando as formas integradas de desenvolvimento com todos os aspectos, e isso não aconteceu”, alega. Com a composição do conselho majoritariamente governamental, ela acredita que não há a pluralidade de vozes necessária para discutir as questões. Além disso, o fato de o pedido de vista ter sido negado foi visto como uma atitude autoritária. “A representatividade existe por um motivo”, diz, acrescentando que a população não foi corretamente informada sobre o impacto da obra e, consequentemente, sobre como ficará a região de Pontal com a Faixa de Infraestrutura.