O presidente do Tribunal de Contas do Paraná (TC-PR), Durval Amaral, se tornou alvo de um inquérito no Superior Tribunal de Justiça (STJ) no âmbito da Operação Quadro Negro, escândalo de desvio de dinheiro a partir de contratos de reformas e construções de escolas, assinados entre o governo do Paraná e a empresa Valor Construtora e Serviços Ambientais, entre 2011 e 2014.
Uma das suspeitas que pesa contra ele é a de receber parte do dinheiro desviado dos cofres públicos e utilizá-lo para abastecer a campanha eleitoral de 2014 do seu filho Tiago Amaral (PSB), eleito deputado estadual naquele ano. Além disso, Durval Amaral também é investigado por uma suposta atuação no Tribunal de Contas para tentar dar aspecto de legalidade ao fato de a empresa não ter concluído as obras, mesmo tendo recebido verba pública para fazer o serviço contratado.
As duas suspeitas serão investigadas pela Procuradoria-Geral da República (PGR) e o inquérito será conduzido pelo ministro do STJ Herman Benjamin, sorteado para ser o relator do caso. Foi o magistrado quem, em 7 de março deste ano, autorizou as primeiras diligências em torno do caso, atendendo a um pedido da PGR.
Ao final da investigação, a PGR pode pedir o arquivamento das peças, caso entenda que não há elementos que apontem para a prática de crimes, ou oferecer uma denúncia contra Durval Amaral, se encontrar provas. Se a denúncia for acolhida, o conselheiro se tornará réu no STJ.
Outro lado
Procurado pela reportagem, Durval Amaral estava em viagem ao exterior, mas se manifestou por escrito, por meio da assessoria de imprensa do TC. Ele reforça que “todas as doações feitas à campanha de meu filho foram declaradas à Justiça Eleitoral” e nega com veemência ter participado do esquema de corrupção revelado pela Operação Quadro Negro. “Sou o principal interessado nesta investigação por ter meu nome envolvido indevidamente”, escreveu ele.
“Foi a partir de uma decisão liminar minha, na sessão do Tribunal de Contas de 29 de junho de 2015, que foi determinada a primeira suspensão dos contratos e aditivos e abertura de tomada de contas em duas obras realizadas pela empresa Valor Construtora. Além disso, com aprovação do Pleno do TC, encaminhei comunicação dos fatos ao Ministério Público Federal e Estadual, além do Tribunal de Contas da União, já que os recursos envolvidos são também oriundos do governo federal. Reforçando, fui o primeiro conselheiro a determinar a suspensão de obras. Foi a partir das informações do TC à Polícia Civil e ao MP que as investigações sobre as fraudes nas escolas aconteceram”, argumentou ele.
Em relação ao suposto “TAC”, o conselheiro afirmou que isso é “no mínimo, um absurdo”. “Fui me informar do inquérito e fiquei sabendo que uma pessoa teria citado meu nome como autor de um TAC que, me parece, foi identificado efetivamente pelos investigadores num computador de uma empresa. Só que o Termo de Ajustamento de Conduta é um procedimento exclusivo do Ministério Público Estadual. Jamais poderia, como conselheiro, elaborar um documento que não compete ao órgão ao qual integro. É uma coisa absolutamente sem sentido”, explicou ele.
Por fim, o presidente do TC disse que está “à disposição da justiça para qualquer esclarecimento, pessoalmente ou através de meus advogados”.
Durval Amaral já foi deputado estadual em seis legislaturas e também secretário de Beto Richa (PSDB) no primeiro mandato do tucano no governo do Paraná. Em 2012 foi eleito pela Assembleia Legislativa do Paraná e nomeado pelo governador para a cadeira vitalícia no Tribunal de Contas, órgão auxiliar do Poder Legislativo.
O nome do conselheiro, conforme a Gazeta do Povo revelou há cerca de um ano, apareceu na investigação durante depoimentos colhidos no final de 2015 pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do Ministério Público do Paraná (MP-PR).
Duas ex-funcionárias da Valor Construtora, Vanessa Domingues de Oliveira e Tatiane de Souza, revelaram ao Gaeco que a assessora jurídica da empresa, Ursulla Andrea Ramos, contou que Durval Amaral teria recebido parte dos recursos para custeio da campanha eleitoral de Tiago Amaral.
Peças do inquérito consultado nesta semana pela reportagem no STJ mostram que Vanessa Domingues de Oliveira também disse ao Gaeco que a empresa firmaria um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Tribunal de Contas “para que fossem terminadas as obras e restituídos os recursos públicos indevidamente pagos à empresa Valor Construtora”, em “longuíssimos prazos”.
A minuta do TAC teria sido feita pela própria assessora jurídica da Valor Construtora, Ursulla Andrea Ramos, e também por advogados ligados a Eduardo Lopes de Souza, o dono da empresa, “tudo previamente ajustado” com o Tribunal de Contas.
Outras autoridades na mira
Em janeiro do ano passado, a Gazeta do Povo também revelou que Durval Amaral não era a única autoridade detentora de foro privilegiado citada nos depoimentos. O dinheiro desviado do esquema revelado pela Operação Quadro Negro também teria abastecido contas de campanhas eleitorais do governador do Paraná, Beto Richa (PSDB), e dos deputados estaduais Plauto Miró (DEM) e Ademar Traiano (PSDB), presidente da Assembleia Legislativa do Paraná. Todos negam ter recebido dinheiro ilícito.
No caso de Beto Richa, o foro adequado para eventual abertura de investigação também é o STJ. Já deputados estaduais devem ser investigados pelo Tribunal de Justiça do Estado (TJ-PR). A reportagem não conseguiu verificar se já houve abertura de inquéritos relativos a esses três nomes citados nos depoimentos.
Em primeira instância
Desde janeiro de 2016, o dono da Valor Construtora, Eduardo Lopes de Souza, e outras 14 pessoas, já respondem a um processo em trâmite na 9ª Vara Criminal de Curitiba. O empresário foi denunciado por organização criminosa, corrupção ativa, falsidade ideológica, fraude a licitação, uso de documento falso, lavagem de dinheiro e obstrução à Justiça.
Entre os réus, ainda estão o ex-diretor da Secretaria Estadual de Educação (Seed) Maurício Fanini, denunciado por organização criminosa, corrupção passiva e fraude a licitação; e o ex-vereador de Curitiba Juliano Borghetti, irmão da vice-governadora do Paraná, Cida Borghetti, denunciado por tráfico de influência.
Todos negam terem cometido os crimes apontados pelo Ministério Público. O processo corre em sigilo.
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