O juiz Fernando Bardelli Silva Fischer , da 13ª Vara Criminal de Curitiba, deu um prazo de 15 dias para que os 13 denunciados no âmbito da Operação Rádio Patrulha apresentem uma resposta preliminar à acusação do Ministério Público do Estado do Paraná (MP-PR), oferecida à Justiça Estadual na terça-feira (25). Entre os denunciados por fraude em licitação e corrupção, está o ex-governador do Paraná e candidato ao Senado Beto Richa (PSDB) . Na mesma decisão, assinada na quarta-feira (26), Fischer também aproveita para se defender de críticos da prisão de Beto Richa e “reafirmar a independência do Juízo”.
O tucano esteve entre os presos temporariamente na esteira da Operação Rádio Patrulha, deflagrada no último dia 11 pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), braço do MP. Beto Richa, contudo, acabou liberado antes do prazo final da temporária, e nem chegou a cumprir a prisão preventiva determinada na sequência. As prisões foram revogadas por força de um habeas corpus concedido de ofício pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Saiba o que dizem os acusados.
As duas medidas – os mandados de prisão temporária (cinco dias) e de prisão preventiva (sem prazo) solicitados pelo Gaeco e expedidos pelo juiz Fischer – foram alvos de críticas de Gilmar Mendes. Tanto no despacho que concedeu a liberdade a Beto Richa quanto em declarações à imprensa, o ministro do STF disse que havia indicativos de prisão com “fundo político” e chegou a atrelar o episódio ao período da ditadura militar.
“Abre-se uma porta perigosa e caminha-se por uma trilha tortuosa quando se permite a prisão arbitrária de pessoas sem a observância das normas legais e a indicação de fundamentos concretos que possibilitem o exercício do direito ao devido processo legal, contraditório e ampla defesa, com todos os meios e recursos disponíveis”, escreveu Mendes, em seu despacho, assinado no último dia 14.
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Nesta quarta-feira (26), ao determinar a notificação dos denunciados e definir um prazo para a defesa preliminar deles, o juiz Fischer aproveitou também para dar uma espécie de recado aos críticos da prisão de Beto Richa. Sem citar nomes, o magistrado do primeiro grau escreveu em seu despacho que “não se deixará intimidar por qualquer forma de pressão externa e continuará atuando orientado pelo rigor técnico”.
“É notória a grande repercussão social gerada pelo presente caso, em decorrência da gravidade dos fatos imputados. Às supostas tentativas de desqualificar este Juízo por meio de declarações públicas, pontuo que na condição de Juiz Criminal, atuando há quatro anos nas Varas Criminais de Curitiba, convivo diariamente com as mazelas geradas pelo encarceramento. Em razão disso, não preciso me reportar a períodos históricos para compreender a responsabilidade da medida, pois observo a história sendo escrita diariamente, de maneira anônima e silenciosa. Que chegue o dia em que a decretação da prisão de ex-governadores não gere maior assombro do que a soma das milhares de prisões decretadas anualmente”, afirmou o juiz Fischer.
Denúncia
O foco da denúncia do MP envolve direcionamento da licitação feita no âmbito do programa Patrulha do Campo, lançado em 2011 pelo governo do Paraná, e também desvio de dinheiro, a partir dos contratos firmados com as empresas Cotrans Locação de Veículos Ltda, Ouro Verde Transporte e Locação S.A., e Terra Brasil Terraplanagem Ltda-ME.
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Além de Beto Richa, também foram denunciados por corrupção e fraude em licitação os seguintes nomes: José Richa Filho (Pepe Richa), irmão do tucano e ex-secretário de Infraestrutura e Logística; Luiz Abi Antoun, primo de Beto Richa; Aldair Wanderlei Petry, o Neco, ex-diretor-geral da pasta comanda por Pepe Richa; os ex-secretários da gestão Richa (PSDB) Deonilson Roldo (Comunicação Social), Ezequias Moreira Rodrigues (Cerimonial e Relações Internacionais) e Edson Casagrande (Assuntos Estratégicos); e dois empresários, Celso Frare (Ouro Verde) e Joel Malucelli (J. Malucelli Equipamentos S.A.).
Os demais denunciados são quatro nomes ligados a Edson Casagrande e à empresa Terra Brasil: os irmãos Túlio Bandeira e André Bandeira; e os irmãos Emerson Savanhago e Robison Savanhago.
De acordo com o Gaeco, a arrecadação e o destino das propinas prometidas pelos empresários eram uma tarefa de responsabilidade dos denunciados Pepe Filho, Deonilson Roldo, Ezequias Moreira Rodrigues e Luiz Abi Antoun, com a colaboração de outras pessoas, como o Neco, braço-direito de Pepe Richa.
O caso chegou ao Gaeco através de um delator, o empresário e ex-deputado estadual Tony Garcia, quem teria montado o esquema de corrupção, “convalidado” por Beto Richa. Na denúncia, o MP narra que o então governador do Paraná era o “principal destinatário final das vantagens indevidas prometidas pelos empresários” e estava “plenamente ciente das tratativas e reuniões realizadas, notadamente através de seu então amigo Tony Garcia”.
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Todos os denunciados negam terem cometido crimes, exceto Celso Frare, que reconheceu ter pago propina, e Joel Malucelli, que em depoimento ao Gaeco admitiu ter conversado com empresários sobre o processo de licitação. Malucelli negou ter pago propina, contudo.
Logo que receber as defesas preliminares dos acusados, o juiz Fischer deve decidir se acolhe ou não a denúncia do MP. Se não for rejeitada, a denúncia vira ação penal e os acusados passam a responder o processo na condição de réus.
Outro lado
Por meio de nota, Beto e Pepe Richa afirmaram que, a exemplo da prisão temporária, a denúncia contra eles “é baseada única e exclusivamente em termos de depoimento de colaborador premiado já conhecido do Poder Judiciário paranaense, sem qualquer base em provas de suas falaciosas alegações”.
“Ainda mais grave, sem a mínima diligência investigativa por parte do próprio Ministério Público ou da Polícia Civil para fins de verificar as ilações feitas pelo delator. Contudo, permanece a confiança na Justiça, que, em tempo certo, restabelecerá a verdade e a honra da família Richa”, diz o texto.
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A defesa de Luiz Abi Antoun vai na mesma linha. Disse considerar a denúncia “temerária, na medida em que o Ministério Público se pauta exclusivamente pela palavra do colaborador premiado Antônio Celso Garcia [Tony Garcia]”.
A defesa de Ezequias Moreira informou que ele “apresentará sua defesa nos autos demonstrando sua plena inocência”.
A defesa de Joel Malucelli declarou que, “a partir da acusação, ele vai demonstrar perante o Juízo que não fraudou qualquer licitação nem efetuou qualquer pagamento ilícito a agentes públicos”.
Em nota encaminhada à Gazeta do Povo, a Ouro Verde Locação e Serviço S.A. diz que “não é oficialmente investigada pelas autoridades, e a prestação de serviços de locação de máquinas e equipamentos pesados ao Estado do Paraná, durante o período de abril de 2013 a julho de 2015, ocorreu em processo de concorrência e, por conseguinte, pelo melhor preço de mercado à época dos fatos, sendo cumpridas absolutamente todas as obrigações previstas na licitação”.
“A Ouro Verde informa ainda que tomou a firme decisão de prestar todos os esclarecimentos necessários às autoridades ao longo do curso da investigação e que o Celso Frare se afastou de toda e qualquer atividade relativa à empresa”, finaliza a empresa.
Por nota, a defesa do empresário Celso Frare diz que seu cliente concedeu um “depoimento esclarecedor ao MP” e, por iniciativa própria, ressarciu eventuais danos aos cofres públicos. Também afirma que o empresário segue à disposição das autoridades para prestar os esclarecimentos necessários.
A defesa de Edson Casagrande refutou as acusações e disse que no processo demonstrará a inocência do seu cliente.
A defesa de Emerson e Robison Savanhago, donos formais da Terra Brasil, disse que se pronunciará no decorrer do processo. Disse ainda que ambos os clientes estão à disposição da Justiça Estadual para eventuais esclarecimentos.
As defesas de André e Túlio Bandeira informaram que não vão se manifestar até que eles sejam notificados formalmente.
A defesa de Aldair Petry afirmou que a denúncia não possui sustentação legal em relação ao seu cliente e que não trouxe qualquer elemento concreto e individual sobre possíveis ilícitos por ele cometidos. A defesa disse ainda que ele nunca cometeu qualquer ilícito.
A defesa de Deonilson Roldo não foi localizada. Antes do oferecimento da denúncia, a defesa dele já havia dito que seu cliente não cometeu crimes.
Representante da Cotrans na época dos fatos, Osni Pacheco faleceu no final de 2015.