Depois de a Receita Estadual ser chacoalhada pela Operação Publicano em 2015, o órgão montou três forças-tarefa para inspecionar o trabalho dos auditores fiscais denunciados à Justiça por corrupção. Eles são acusados de facilitar a sonegação de impostos em troca de propina. A partir da documentação recolhida pelo Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Paraná, 373 empresas tiveram suas contas reanalisadas. A Receita encontrou irregularidades em 229 delas, a maioria na região de Londrina, somando R$ 704 milhões em sonegação de ICMS.
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Agora, o governo do Paraná cobra desses empresários R$ 2,28 bilhões. Além dos R$ 704 milhões sonegados, são R$ 1,36 bilhão em multas e R$ 214,9 milhões em juros. Isso não significa que esse seja o montante desviado pelo esquema de corrupção, pois a fiscalização só pode retroagir sobre o imposto devido nos últimos cinco anos, segundo regra do Código Tributário Nacional. E o Gaeco, na quarta fase da Operação Publicano, disse ter indícios de delitos sendo cometidos desde 2008.
A reportagem soube das forças-tarefa pelo Diário Oficial do Estado e o Livre.jor, especial para a Gazeta do Povo, solicitou os dados à Secretaria de Estado da Fazenda (Sefa). O órgão forneceu o balanço parcial e informou que talvez o valor da sonegação ainda aumente, pois a terceira força-tarefa ainda não concluiu sua averiguação. “As forças-tarefas I e II estão 100% finalizadas, enquanto a força-tarefa III encontra-se com 80% dos trabalhos executados”, disse a Sefa.
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Neste momento 33 auditores, de outras regiões do Paraná, trabalham para concluir a revisão desses documentos fiscais. “Diligências in loco são realizadas apenas quando necessárias, dependendo do tipo de infração a ser apurada”, explica a Fazenda. Foram realizadas outras revisões pontuais no trabalho dos auditores acusados pelo MP, mas são as forças-tarefa que concentram a quase totalidade das inspeções oriundas da Operação Publicano e do seu desdobramento, a Operação Mercúrio, que investigou delitos semelhantes na região de Curitiba.
A relação dos negócios autuados pela Receita Estadual foi solicitada, mas o órgão público não a forneceu. “Os estabelecimentos comerciais são de diversos ramos. Não é possível disponibilizar os nomes, tendo em vista a observância ao sigilo fiscal imposto pelo artigo 198 do Código Tributário Nacional”, justificou. A reportagem apurou que a maior multa dada a um único estabelecimento foi de R$ 168,6 milhões, um comércio atacadista de animais vivos da região de Londrina, que deixou de emitir documento fiscal em relação à mercadoria, numa operação que deveria ser tributada.
Operação Publicano
Deflagrada pelo Ministério Público em março de 2015, o MP define a Operação Publicano como uma ação “com o objetivo de desarticular uma organização criminosa formada por auditores fiscais da Receita Estadual, contadores e empresários que se uniram para facilitar a sonegação fiscal mediante o pagamento de propina”. Além dos casos de corrupção, há denúncia de falsidade de documentos e lavagem de dinheiro. De março de 2015 até o momento, a Publicano já passou por dez fases, nas quais foram executados 137 mandados de prisão, 180 mandados de busca e apreensão e 100 conduções coercitivas.
Nessas ações 410 pessoas foram investigadas pelo MP, com auditores fiscais sendo tratados como réus 118 vezes. Os demais são contadores (35) e empresários (257). As evidências coletadas nas investigações promovidas pelo Gaeco levaram à proposição de 20 medidas judiciais, 18 de improbidade e 2 cautelares. Nas medidas judiciais é solicitada a devolução de R$ 244,8 milhões aos cofres públicos, decorrentes de sonegação por empresas dos ramos de vestuário, calçados, móveis, veículos e autopeças, alimentos, cosméticos, combustíveis, materiais elétricos, supermercados, transportes, construção civil, frigoríficos e vendas em geral.
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Há uma queda de braço em torno das ações judiciais relacionadas às fases iniciais da Operação Publicano, cuja homologação do acordo de delação premiada do ex-auditor fiscal Luiz Antônio de Souza foi questionado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes, após manifestação dos advogados do governador Beto Richa (PSDB). A campanha de reeleição do tucano é citada na delação como suposta destinação de parte dos recursos em tese desviados pelo esquema de corrupção.
Dada a prerrogativa de foro de Richa, Mendes entendeu que não caberia à Justiça de Londrina homologar a delação, mas ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). Depois de uma troca de responsáveis no STJ, que deixou os processos parados por cinco meses, como demonstrou a repórter Catarina Scortecci na Gazeta do Povo, a ministra Maria Thereza de Assis Moura devolveu os autos para a 3ª Vara Criminal de Londrina. Ela quer que se dê seguimento localmente à questão no que tocante “aos demais implicados não detentores de prerrogativa de foro”.
Mudanças na Receita
“Todos os servidores envolvidos na Operação Publicano respondem a processos administrativos disciplinares [PADs]. Foram instaurados oito PADs relacionados à Operação Publicano e um referente à Operação Mercúrio. Dos nove processos, quatro foram finalizados. Foram aplicadas, até o momento, três penalidades de demissão”, disse a Secretaria da Fazenda após questionamento da reportagem sobre a reação da Receita Estadual após a Operação Publicano.
O governo argumenta que incluiu punições mais rigorosas na lei dos auditores e que passou a gravar em vídeo os depoimentos nesses PADs, “para agilizar”. No trabalho de campo, a Receita Estadual alega “redução do contato pessoal entre auditor fiscal e contribuinte”. Para isso, informatizaram processos, adotando o domicílio tributário eletrônico - uma interface online na qual ocorre a interação entre o empresário e a fiscalização. Outra medida foi a fixação de uma estimativa do imposto devido, que o auditor precisa justificar quando variar 30% para mais ou para menos. O Conselho de Contribuintes e Recursos Fiscais, instância que pode revisar os valores devidos pelas empresas, diz a administração, foi tornado mais transparente.
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