Adotadas no Paraná em 2015 como opção para desafogar o sistema penitenciário, as tornozeleiras eletrônicas rastreiam os passos de milhares de apenados. No estado, mais de 7 mil monitorados circulam diariamente fora das cadeias, segundo o Departamento Penitenciário (Depen). Polêmicas, elas suscitam dúvidas sua efetividade entre a população ao mesmo tempo em que são bem vistas pelo Judiciário.
Segundo dados levantados pelo Depen-PR, só em Curitiba 2.010 apenados portam o aparelho, sendo acompanhados 24 horas por dia pela central de monitoramento do órgão. Ainda segundo o departamento, a maioria dos monitorados se concentra nos bairros Umbará, Sítio Cercado, Tatuquara e CIC.
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A tornozeleira eletrônica é adotada tanto em casos de presos em flagrante por crimes de menor potencial ofensivo quanto aos condenados em regime semiaberto. No Judiciário do Paraná, a medida foi bem recebida.
“Observamos uma queda expressiva no número de reincidentes, nos casos de presos sob regime semiaberto após a adoção do dispositivo. Já entre os portadores que ainda não foram condenados pelo sistema penal e por aqueles que cometeram crimes de menor potencial ofensivo, o fator psicológico do aparelho teve um papel importante, evitando o cometimento de novos delitos”, explicou juiz da 1ª Vara de Execuções Penais do Tribunal de Justiça do Paraná, Eduardo Lino Bueno Fagundes Junior. Segundo o magistrado, o porcentual de reincidentes no Paraná é de 10%.
Da mesma forma, uma boa parte dos advogados criminalistas em atuação no estado enxerga o uso do dispositivo como medida eficaz, principalmente quando o assunto é o controle da população carcerária.
Segundo o advogado e professor do curso de direito penal da Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) Rodrigo Sanchez Rios, a tornozeleira eletrônica surgiu como um “alívio” à prisão privativa de liberdade. “É um instrumento que contribui com a socialização do acusado ou indiciado ao passo que o obriga a cumprir com exigências como não se afastar de determinado local ou não ultrapassar tal perímetro. A tornozeleira eletrônica acaba sendo um remédio efetivo, uma vez que transfere ao próprio indivíduo algumas responsabilidades a cumprir fora da cadeia”, explica.
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Casos extremos e desafios
Apesar dos números oficiais apontarem um baixo número de reincidências, há desafios para a melhoria do sistema.
Uma situação no mínimo inusitada foi registrada em agosto do ano passado. Na ocasião, rastreando os sinais de uma tornozeleira eletrônica que supostamente deveria estar sendo usada por um rapaz indiciado por tráfico de drogas, o Depen identificou que o equipamento tinha sido acoplado ao pescoço de um cachorro. O fato aconteceu na cidade de Palotina, no interior do Paraná, e, segundo depoimentos colhidos na época, o apenado justificou o rompimento do aparelho afirmando que tinha encontrado dificuldades para dormir usando a tornozeleira. O caso foi encaminhado à Vara Criminal de Palotina e o rapaz preso novamente sob o risco de ter a pena agravada por dano ao patrimônio público.
Já em outra ocorrência, um cavalo foi flagrado usando uma tornozeleira eletrônica em Ponta Grossa no final de 2017. A Secretaria de Estado da Segurança Pública e Administração Penitenciária do Paraná (Sesp) explicou que o preso que usava o aparelho perdeu o benefício e, atualmente, cumpre pena no regime semiaberto. O aparelho normalmente é devolvido quando o preso perde o benefício, mas nesse caso isso não aconteceu porque ele já havia sido rompido.
O juiz Eduardo Lino Bueno Fagundes Junior pondera que, apesar do balanço positivo do Judiciário após a adoção do equipamento, a tornozeleira ainda é novidade. “Seu uso é muito recente ainda. Desta forma, as adaptações necessárias vão sendo feitas ao longo do tempo, caso a caso. Ainda não se pode afirmar totalmente que o dispositivo é um modelo pronto e acabado, enquanto remédio punitivo. Nesse sentido, todo o Judiciário está trabalhando para que se torne o mais próximo da perfeição o possível.”
Regime semiaberto e caso Carli Filho
No Paraná, como não há vagas no regime semiaberto em número suficiente nem mesmo para quem está em presídio e ganha o direito de progressão de pena, os sentenciados ao semiaberto passam a usar tornozeleira eletrônica.
Esse será o caso do ex-deputado estadual Luiz Fernando Ribas Carli Filho, que escapou do regime fechado (penitenciária) pelas mortes de Carlos Murilo de Almeida e Gilmar Rafael Yared, em colisão de trânsito em maio de 2009.
A pena ficou fixada em 7 anos, 4 meses e 20 dias em julgamento na semana passada. O regime fechado é aplicado nos casos superiores a 8 anos de punição.
Carli Filho agora está sujeito à execução da sentença. Contudo, isso ainda deve demorar. É que depois do julgamento, ainda precisa ser lavrado o acórdão (redigida a decisão) e depois publicada no diário oficial da Justiça – e isso costuma levar um tempo. Além disso, é praxe que as partes entrem com um embargo de declaração – recurso para esclarecer os termos do acórdão – e só depois de analisado o pedido é que a decisão passa a ter efeito.