Após uma sequência de denúncias envolvendo seu nome e de pessoas próximas que ocuparam cargos de confiança na sua gestão, o ex-governador Beto Richa (PSDB) assumiu uma postura mais agressiva e passou a contra-atacar seus adversários políticos. Licenciado do cargo desde o começo de abril, para concorrer a uma vaga no Senado, o tucano afirmou à Gazeta do Povo que não se arrepende de ter deixado o Palácio Iguaçu, e que vive um momento de baixa na política, mas que isso faz parte do jogo.
Nos últimos dias, surgiram fatos novos ou confirmações à Justiça de delações referentes a um suposto direcionamento de licitação da rodovia PR-323, favorecimento à empreiteira Odebrecht em troca de recursos, referente à Operação Lava Jato, e desvios de recursos de escolas, dentro das investigações da Operação Quadro Negro. Em todas as situações, o objetivo teria sido o de angariar recursos via caixa 2 para as campanhas de Richa.
Lembrando da sua longa carreira política, que teve início em 1995 como deputado estadual, o tucano reconheceu que há um “cansaço” natural envolvendo seu nome. “Ninguém é eterno, principalmente na política. Um dia se está por cima, outro por baixo”, afirmou, após passar por sabatina na Gazeta do Povo , já realizada com os demais candidatos ao Senado pelo Paraná. O tucano disse que não se arrepende de ter deixado o Palácio Iguaçu – no cargo, ele conseguia promover uma agenda positiva em torno de seu nome: “Minha missão como governador já está cumprida. Entreguei o governo muito melhor do que recebi”. Ele também disse que não tem intenção de concorrer de novo ao cargo de governador, que não pretende “morrer na política”, e que no futuro não muito distante quer aproveitar a “vida útil” para curtir a família.
Ainda assim, Richa destacou outros momentos em que passou por crises, e que conseguiu dar a volta por cima, como a disputa eleitoral pela prefeitura de Curitiba em 2012. “A derrota do Luciano Ducci (PSB), quando ele não foi para o segundo turno, atribuíram a mim. O Paulo Bernardo [ex-ministro] comentou em uma roda de empresários em São Paulo que o ‘Beto Richa estava morto’. Em 2014 venci a eleição para governador mais fácil do que a de 2010, também no primeiro turno, mas com porcentual superior”, destacou. Ele não mencionou os episódios de 29 de abril de 2015, que ficaram conhecidos como a “batalha do Centro Cívico”, mas analistas políticos ressaltam que, após três anos, o ex-governador conseguiu reconquistar índices de popularidade, que atingiram o menor patamar na sequência do conflito.
“Tem uma frase do Winston Churchill que se aplica bem. A política é quase tão excitante quanto a guerra. A diferença é que na guerra só se morre uma vez. Na política não. Esse é o momento que estou passando. É uma articulação diabólica contra mim, explorada à exaustação na imprensa, e meus adversários são implacáveis”, afirmou. Durante a sabatina, o ex-governador ressaltou que o país vive uma onda que ele chamou de “denuncismo”, que atinge principalmente os atuais ou ex-ocupantes de cargos no Executivo. O tucano se disse favorável a todas as investigações, mas reclamou da repercussão feita pela imprensa e pelos inimigos políticos. “No meu caso, por exemplo, que acusação consistente há contra mim? Na Quadro Negro? Não sou investigado pela Quadro Negro. Foi uma investigação iniciada no meu governo, denominada pelo meu governo. As pessoas foram presas, demitidas”, declarou.
Richa também reclamou da atuação do senador Roberto Requião (PMDB), seu principal adversário político, e o desafiou a fazer um debate “olho no olho” sobre as realizações de governo de cada um. “Estou farto de ser criticado pelo Requião. Quero comparar nossas gestões, sobretudo no campo ético. Ele me acusa, se aproveita de forma oportunista, como sempre foi. Tenho dois processos de investigação, ele saiu com mais de uma centena. Não aceito que venha apontar seu dedo sujo na minha cara”, disse durante a sabatina.
Suspeitas
A sequência recente de denúncias envolvendo Beto Richa e o seu governo teve início em 10 de maio, quando a revista Isto É divulgou um áudio em que Deonilson Roldo, ex-chefe de gabinete, ex-secretário de Comunicação e braço direito do tucano, conversa sobre um acordo para a Odebrecht vencer a licitação de obras na PR-323, rodovia no Noroeste do Paraná. Na gravação, Roldo pede um “entendimento” a Pedro Rache, diretor-executivo da Contern, outra empresa interessada na estrada. Em troca disso, oferece uma participação em negócios da Copel para o Grupo Bertin, dono da construtora em questão. Richa negou favorecimento e disse que não houve aplicação de dinheiro público na obra.
Na sabatina, Richa disse que ainda esperava as explicações de Roldo sobre o episódio. Ele considerou a conversa “reprovável”, e lamentou que o aliado tenha sido demitido pela atual governadora, Cida Borgetti (PP). Roldo ocupava uma diretoria da Copel e cargos em vários conselhos de governo. “Ele disse que não teve tempo de se defender”, relatou Richa. Em nota, Deonilson Roldo disse que a gravação foi feita de forma clandestina, negou irregularidades e disse que estava sendo chantageado.
Na esteira desse episódio, no dia 12 de maio, veio à tona a decisão do juiz federal Sergio Moro, que determinou à Polícia Federal abertura de inquérito contra Richa para apurar se houve favorecimento à Odebrecht nessa licitação. Essa denúncia já havia aparecido em abril de 2017, quando o executivo da empresa Benedicto Junior fez uma delação à Operação Lava Jato. Na ocasião, ele relatou repasse de R$ 2,5 milhões para a campanha de Richa. Na sabatina, o ex-governador reafirmou que nunca fez captação de recursos para suas campanhas, e o comitê do partido responsável por isso assegurou que toda a verba foi registrada. “A menor doação estava sempre lá, contabilizada. Sobre esses casos, eu perguntei e todos me reafirmaram que não tinha a entrada deste dinheiro.”
Por fim, em 14 de maio, a RPC TV divulgou vídeos com o depoimento de Eduardo Lopes de Souza, dono da Valor Construtora, para 9.ª Vara Criminal de Curitiba, a respeito dos desvios de verbas apurados na Operação Quadro Negro. O empreiteiro afirmou que, em 2015, recebeu o pedido para pagar uma “mesada” de R$ 100 mil para abastecer o caixa 2 da campanha de Richa para o Senado em 2018. Também seriam beneficiados o irmão dele, Pepe, e o filho, Marcello, com a intenção de concorrer aos cargos de deputado federal e estadual, respectivamente. A solicitação, segundo Lopes, foi feita pelo ex-diretor da Secretaria de Estado da Educação (Seed) Maurício Fanini.
Essa acusação já tinha sido feita por Lopes anteriormente, mas sem tantos detalhes. Essa foi a primeira vez em que ele falou na condição de delator à Justiça Estadual. Até então, ele tinha prestado depoimento como réu no processo que investiga os desvios da Quadro Negro. O processo corre em segredo de Justiça e tem 15 réus ao todo.
Richa reclamou das denúncias “requentadas”, que não dizem respeito a ele próprio, mas a recursos para campanha, e ressaltou que as investigações sobre desvios de verbas de obras em escolas foram iniciadas pela sua gestão, e que inclusive foi sua equipe que batizou a apuração de Quadro Negro.
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