Beto Richa alega que a 13ª Vara Criminal de Curitiba não poderia ter homologado a delação de Tony Garcia e que não há provas concretas.| Foto: Aniele Nascimento/Gazeta do Povo

Denunciado por corrupção passiva e fraude em licitação em processo decorrente da Operação Rádio Patrulha, o ex-governador Beto Richa (PSDB) pediu à Justiça a anulação da colaboração premiada firmada com o empresário Tony Garcia – que se tornou delator do esquema de corrupção. O primo de Richa, Luiz Abi Antoun, também havia pedido a suspensão da delação, questionando a validade das gravações e capturas de dela apresentadas como provas por Tony Garcia. Richa, Antoun e outras 11 pessoas chegaram a ser presos na operação, que investiga o direcionamento de licitação em um programa de pavimentação de estradas rurais, em troca de propina.

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“Argumentação não para em pé”, diz Tony Garcia.

O pedido de Richa foi apresentado conjuntamente com o irmão, Pepe Richa, que também foi denunciado na Rádio Patrulha. O requerimento consta da defesa preliminar juntada por eles à ação penal que tramita na 13ª Vara Criminal de Curitiba. A defesa alega que este juízo não teria competência para homologar a delação, porque o acordo de colaboração envia benefícios a Tony Garcia relacionados a processos que tramitam em outras varas. Segundo os advogados, em razão disso, a delação deveria ser considerada nula.

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Ao longo do documento, a defesa também argumenta que não ficou comprovado que Beto e Pepe cometeram os crimes dos quais foram acusados. Os advogados citam ainda “enormes prejuízos” a que o ex-governador foi submetido, entre os quais, ter “seu nome indevidamente envolvido em supostos ilícitos, a partir de informações exclusivamente prestadas pelo colaborador” e que a operação “contribuiu decisivamente para a derrocada da candidatura do acusado ao Senado”.

O primo

Em sua defesa preliminar, Luiz Abi Antoun também pede a anulação da delação, mas por outros motivos. O documento assinado pelo advogado Anderson Mariano, e que foi tornado público primeiro, horas antes da defesa dos irmãos Richa, argumenta que “há fundada dúvida quanto à edição” das gravações apresentadas por Tony Garcia e que não é possível garantir que as vozes captadas são mesmo das pessoas a que o delator se referiu em seus depoimentos. A defesa alega ainda que o colaborador não entregou à Justiça o aparelho em que fez as gravações, para que este pudesse ser periciado.

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Entre os áudios disponibilizados às autoridades por Tony Garcia, estão gravações de reuniões, em que empresários a quem a licitação foi direcionada combinam que 8% do valor bruto que receberiam seriam repassados como propina ao núcleo político de Richa. Em outro material, o delator gravou uma conversa com o ex-governador, em que este diz ter caído um “tico-tico” e que, por isso, Tony Garcia deveria “ir pra cima” de um dos empresários. Segundo as investigações, “ir para cima” significa cobrar propina atrasada.

O advogado de Antoun também contestou as conversas de WhatsApp e reproduções de diálogos fornecidos pelo delator. Segundo a defesa, “pela simples captura de tela não é possível constatar se o nome associado ao contato realmente condiz com o titular da linha” e “as supostas conversas podem, inclusive, ter sido manipuladas pelo próprio colaborador premiado”.

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Em razão disso, a defesa do primo de Richa pede que as provas sejam consideradas nulas e, por consequência, que a Justiça rejeite a denúncia oferecida contra Antoun, “ante ausência de justa causa”.

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Delação

Por causa disso e de “outros vícios”, a defesa de Antoun pede que a Justiça anule o acordo de colaboração premiada firmado com Tony Garcia. Entre os outros fatores, o advogado do primo de Richa afirma que a delação foi homologada por um magistrado que, posteriormente, “se declarou suspeito para atuar nos processos relacionados”. Além disso, a defesa questiona a credibilidade de Tony Garcia, que teria firmado a delação com intuito de “evitar a todo custo ser responsabilizado por suas ações, desviando o foco para pessoas de maior visibilidade”.

“Destaque-se que o ‘colaborador’ já demonstrou sua inidoneidade reiteradas vezes, uma vez que descumpriu os termos dos acordos de colaboração firmados no âmbito dos casos do Consórcio Garibaldi, da força-tarefa do Banestado e Gafanhotos”, consta do documento apresentado pela defesa de Antoun.

Ainda segundo o advogado, Tony Garcia teria violado a cláusula de sigilo de sua delação. A defesa cita uma entrevista de mais de duas horas, concedida ao vivo pelo colaborador à Gazeta do Povo, em que ele teria revelado “o teor dos depoimentos por ele prestados antes do recebimento da respectiva denúncia”. (Veja a entrevista na íntegra)

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O empresário Tony Garcia, que se tornou delator 

“Argumentação não para em pé”, diz Tony Garcia

O empresário Tony Garcia refutou cada um dos argumentos apresentados à Justiça pela defesa dos irmãos Richa e de Luiz Abi Antoun. O delator ainda não teve acesso aos documentos, mas, em entrevista à Gazeta do Povo, ao ser informado do teor das alegações, o empresário riu, ironicamente. “Tudo isso que se aponta já foi amplamente discutido e elucidado. É uma argumentação que não para em pé”, disse. “O Beto [Richa] deveria se concentrar em se defender dos delitos que ele praticou, não tentar anular no tapetão coisas que são claras e corroboradas por testemunhas e outros elementos”, acrescentou.

Sobre os áudios e conversas de WhatsApp fornecidos às autoridades, Tony Garcia disse que todos os materiais foram periciados pela Justiça Federal e pela Justiça Estadual, antes da homologação do acordo de colaboração, o que assegurou que os elementos de prova não sofreram edições ou violações.

“Qualquer tipo de edição digital é diagnosticável e as auditorias que foram feitas comprovam a autenticidade das gravações e dos prints”, afirmou.

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Tony Garcia também nega que tenha violado a cláusula de confidencialidade de sua delação. Ele argumentou que a entrevista concedida à Gazeta do Povo ocorreu quando a operação já havia sido deflagrada e quando a Justiça já havia levantado o sigilo do processo. “O que eu disse na entrevista é o que já havia vindo à tona. A partir do momento que não havia sigilo judicial, eu não tinha mais obrigação. Tudo o que eu disse já era de conhecimento público”, apontou.

O empresário ainda ironizou que Luiz Abi Antoun está exercendo seu “jus sperniandi” – expressão sarcástica, que significaria algo como “direito de espernear” – e que ele deveria se apresentar à Justiça brasileira. O primo de Richa está no Líbano e, nesta semana, chegou a faltar a uma audiência judicial decorrente da Operação Publicano, em que ele também é investigado. Antoun apresentou atestado médico, alegando problemas de saúde - sua volta ao país estava prevista para 6 de outubro.

“Acho que ele está no ‘jus sperniandi’. Mas agora ele deveria dar uma demonstração de boa vontade e vir se defender no Brasil, não no país em que ele está fugido. Ele deveria se apresentar à Justiça, não apresentar atestado em árabe”, disse.

A operação

A Operação Rádio Patrulha foi deflagrada em 11 de setembro pelo Grupo Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público do Paraná (MP-PR). A investigação se debruçou sobre o programa Patrulhas do Campo, implantado no governo Beto Richa, para contratar empresas de manutenção e pavimentação de estradas rurais.

Conforme a denúncia oferecida pelo MP-PR, a licitação foi direcionada a empresas, após um acordo prévio, por meio do qual os empresários concordaram em repassar 8% do que receberiam “em vantagens indevidas” a agentes públicos, próximos a Richa.

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No dia em que operação foi deflagrada, foram presos temporariamente 15 pessoas (confira a lista completa), entre eles Richa e seu irmão, o secretário de Infraestrutura e Logística, Pepe Richa, assim como Luiz Abi Antoun.

A Justiça chegou a determinar a prisão preventiva de Richa e seu núcleo político, mas todos foram soltos por força de um salvo-conduto concedido pelo ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).