Para as bandas do Centro Cívico, há quem diga que a delação de Eduardo Lopes de Souza, dono da construtora Valor, teria mexido mais com as estruturas políticas do Palácio Iguaçu do que a Batalha do Centro Cívico, que deixou centenas de professores e um desgaste enorme para o governo. E que, pelo teor bombástico, o depoimento do empresário teria o poder de embaralhar a disputa eleitoral de 2018 no Paraná. Mas, afinal, o que o foi dito pelo delator e quais as consequências para o grupo político do governador Beto Richa? Para entender essa história, a Gazeta do Povo fez um apanhado dos mais recentes capítulos e dos episódios mais marcantes desse escândalo em série, que já dura mais de dois anos.
A novidade – Eduardo Lopes de Souza é apontado como peça-chave na Quadro Negro. Ele teria aceitado participar de um esquema para desviar o dinheiro que deveria ser aplicado na construção de escolas. A empreiteira vencia licitações ao oferecer descontos substanciais, que depois eram compensados com aditivos contratuais. Ao todo, negociou R$ 32 milhões. Contudo, não executou todas as obras. Com a ajuda de funcionários da Secretaria da Educação, recebeu por escolas que não chegou a construir – ou que foram só começadas. Em depoimento que veio à tona no início de setembro, o empresário disse que repassou a políticos e assessores R$ 17 milhões do que foi pago pelo governo.
Comprovações – Por enquanto, não apareceram provas das afirmações que Souza fez. O empresário se comprometeu a entregar materiais que reforçam todas as acusações, mas também reconheceu que se viu obrigado a destruir documentos e planilhas, além de conversas comprometedoras registradas no celular, quando soube que o esquema havia sido descoberto e que seria alvo de uma operação policial. A delação do empresário foi homologada pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Aliados – O empreiteiro afirma – categoricamente, embora ainda sem provas – que o dinheiro desviado da construção das escolas era para abastecer as campanhas eleitorais dos políticos que o favoreciam. Além de citar Beto Richa (PSDB) - que nega veementemente qualquer envolvimento no caso -, Souza ainda menciona boa parte dos principais aliados políticos do governador, como o secretário-chefe da Casa Civil, Valdir Rossoni (PSDB), e o secretário especial de Cerimonial, Ezequias Moreira. Sobra também para o comando da Assembleia Legislativa, com o deputado estadual Ademar Traiano (PSDB), e para o ministro Ricardo Barros (PP). Assessores diretos do governador também são citados na delação.
O primo, de novo – O nome de um parente distante do governador Beto Richa volta a aparecer em um escândalo político. Luiz Abi Antoun é apontado por Souza como o principal interlocutor, aquele que negociava e recebia as propinas, supostamente direcionadas para o caixa 2 da campanha de reeleição de Beto Richa, em 2014. Conhecido como “primo do governador”, Luiz Abi já esteve preso e é alvo de duas outras investigações – a Voldemort, sobre licitações de oficinas encarregadas de consertar os veículos do governo do estado e a Publicano, que apura um esquema fraudulento envolvendo auditores da Receita Estadual.
Sair ou não sair, eis a questão – Beto Richa vive um impasse e o caso da Quadro Negro é mais um fator a ser analisado. Há inquéritos abertos no Superior Tribunal de Justiça (STJ) contra o governador, por suspeitas de irregularidades em licenciamento ambiental e também envolvendo repasses de dinheiro pela Odebrecht. Por enquanto, ele tem direito a foro privilegiado – ou seja, os processos tramitam nas cortes superiores da Justiça. Mas está a pouco mais de um ano do fim do mandato. Se Beto Richa decidir abrir mão do cargo para concorrer ao Senado, ficará pelo menos oito meses sujeito à primeira instância da Justiça. Se ele decidir não se desincompatibilizar, garante o privilégio de foro até dezembro de 2018, mas aí fica sem esse direito dali pra frente.
Outras delações – O empresário Eduardo Lopes de Souza não é o único envolvido na Quadro Negro que negocia colaboração premiada. Em julho, veio a público a informação de que duas delações estavam em curso, uma já havia sido homologada pela Justiça e outra estava em processo. Os nomes dos denunciantes não foram revelados. O que se sabe também é que três ex-funcionárias da empreiteira concordaram em falar. Se todos os citados na investigação decidirem contar o que sabem, pode sobrar para mais gente ainda. Ou a situação ficar pior para os já citados.
Processo suspenso – A Operação Quadro Negro já rendeu uma ação criminal, protocolada em dezembro de 2015, mas o processo foi suspenso por seis meses. A interrupção foi autorizada pela juíza Danielle Nogueira Mota Comar, em junho. A justificativa não foi oficializada, mas, em tese, a medida interrompe o prazo prescricional enquanto são negociadas as delações. Outras discussões jurídicas também permeiam o caso, como o debate em torno da competência da Justiça Estadual ou da Justiça Federal, ou, ainda, se o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou até o Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília.