É um silêncio que vem fazendo a prefeitura de uma cidade da região metropolitana de Curitiba (RMC) arrancar os cabelos. Desde que confirmou o interesse na venda da Refinaria Presidente Getúlio Vargas, a Repar, na primeira metade de 2018, a Petrobras entrou em um hiato de informações que coloca em xeque o planejamento da cidade onde está instalada, Araucária. Embora ninguém saiba ao certo quando e se, de fato, a privatização vai ocorrer, o município se prepara para sobreviver a um futuro pós-apocalíptico, já que praticamente toda economia local depende da indústria do combustível.
Anunciado em abril, o plano da estatal de vender a maior parte da Repar é encarado pela maioria dos especialistas como certo. Muito por causa da inclinação da nova presidência da República em desinchar o estado – o que significa apoio às privatizações. Embora o secretário especial de Desestatização e Desinvestimento do governo, Salim Mattar, tenha afirmado no fim de janeiro que o presidente Jair Bolsonaro (PSL) pretende manter sob as asas do governo a petrolífera, ele destacou que ela deverá ter o tamanho reduzido. “Eu tenho um panorama geral. As estatais brasileiras, Petrobras, Banco do Brasil e Caixa, deverão ao longo desses quatro anos se desfazer dos seus ativos e ficar um pouco mais magras e mais enxutas”, disse.
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Caso a autorização presidencial ocorra e a estatal siga com o plano inicial, ela deverá vender 60% de duas refinarias no Sul – a Repar e a Alberto Pasqualini, no Rio Grande do Sul – e duas no Nordeste, mantendo sob seu domínio outras 9 refinarias, concentradas na região Sudeste. A empresa disse, via assessoria de imprensa, no entanto, que não tem detalhes de prazos ou forma como essa venda será feita, o que dificulta qualquer planejamento em cima dos desdobramentos dessa negociação.
O município, no entanto, se prepara para o pior dos cenários: o de queda de arrecadação. É que sai da refinaria mais da metade do ICMS, o imposto sobre circulação de mercadorias, arrecadado pelo município. O tributo, da ordem de R$ 1 bilhão, segue para o governo estadual, que retorna uma parte substancial para que a cidade consiga tocar seus projetos. Por ano, são R$ 400 milhões para Araucária, indica o secretário de Governo do município, Genildo Pereira Carvalho.
Se somados também o tributo arrecadado de empresas ligadas à refinaria, como as distribuidoras de combustível, e o ISS, que é o imposto sobre serviço de qualquer natureza, esse total responde por mais de 80% do dinheiro que irriga os cofres da cidade. “A preocupação com a privatização é alta em virtude de uma queda de arrecadação. Ainda não sabemos se esse petróleo será refinado aqui ou em virá de fora [do país]”, diz. Caso seja importado, Araucária poderá ter a divisão de ICMS com Paranaguá, por exemplo.
Para mitigar os efeitos e tornar a cidade independente da indústria petrolífera, o município está apostando em novas frentes de investimento. “Em 2017, quando soubemos [do interesse em privatizar], elaboramos um plano de desenvolvimento do município. Contratamos o Sebrae e estamos na fase de estudo e diagnóstico. Queremos criar um plano que contemple tanto o desenvolvimento do município quanto a atração de novas empresas ”, aponta o controlador-geral de Araucácia, Luis Carlos Moreira.
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“Estamos fazendo a revisão de nosso plano diretor, que é de 2006, e já estava até vencido. Queremos preparar o município para sair deste segmento de combustível. Queremos atrair mais serviços, principalmente na parte de tecnologia. O município também é forte na parte de logística. Outra vocação é a indústria moveleira”, conta Moreira. “A ideia é trazer empresas de vários segmentos, desde que respeitem a questão ambiental”, complementa. O município divide seu grande parque industrial com áreas como as barragens do Passaúna e do Rio Verde, regiões de preservação ambiental.
Um dos passos começou a ser dado ainda no ano passado. O município, que tinha ISS mais caro entre os municípios da região metropolitana e que, em alguns casos, superava o de Curitiba, reduziu as cobranças. “A maioria das nossas alíquotas estavam no patamar de 5%. Reduzimos para 2%, com exceção de alguns serviços. Com isso, tornamos o município mais atrativo”, diz Moreira.
Outro ponto adotado pelo governo está sendo enxugar o município. O secretário de Governo indica que a cidade, de 140 mil habitantes, tem 5 mil funcionários – é um número similar ao funcionalismo de Londrina, que tem 500 mil habitantes. Nesse arrocho, o município eliminou sua companhia de transporte coletivo, que custava cerca de R$ 45 milhões ao ano. O serviço passou a ser ligado diretamente ao município e atualmente custa R$ 18 milhões.
Conversas com o governo
Segundo o secretário de Governo de Araucária, as conversas com o governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD) já avançam. Faz sentido, já que a refinaria é a maior contribuinte individual do estado e uma quebra de arrecadação também fere os cofres do resto do Paraná. “Isso afeta muito a economia do município, mas também a do estado”, diz Carvalho. “Nossa relação com o governador é muito próxima, tanto em termos políticos, quanto técnicos. Pensamos em articular, neste primeiro momento, a viabilização de infraestrutura no anel metropolitano e na cidade. A parceria se mostra muito promissora. Só estamos aguardando para que o governo do estado se estabilize. Mas já há sinalização de obras de infraestrutura para a nossa região”, diz.
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Atual prefeito, Hissam (PPS), foi apoiador de Ratinho Junior na mais recente eleição. Agora, espera do mandatário apoio sobretudo na integração do transporte coletivo e na construção de rodovias interligando a cidade a Campo largo, Fazenda Rio Grande, São José dos Pinhais.
A reportagem não conseguiu contato com a secretaria da Fazenda do Estado para falar sobre o peso da privatização para o Paraná.
Benefícios
Embora Araucária se prepare para um cenário incerto, a privatização não significa necessariamente perdas para o município. Diversificar a economia pode ser uma saída para que a cidade resolva velhos problemas que acompanharam a montagem da refinaria e toda sua rede. “O problema social que a Repar gerou é muito maior. Temos uma das maiores ocupações irregulares do Paraná. Cerca de 30 mil pessoas. Isso gera uma pressão social na saúde, na educação”, diz o secretário de governo. Com nova vocação, a prefeitura almeja, ao menos, estancar o crescimento dessas regiões. É uma aposta de médio e longo prazos.
Economicamente, pode haver ganho imediato. Tudo depende do rumo que o novo detentor da refinaria der a ela. “Se pegar o exemplo da Vale do Rio Doce, guardadas as devidas proporções, depois que ela foi privatizada, ela rende aos cofres federais, estaduais e municipais muito mais do que antes. Muito por conta da produtividade, da política que ela mantém”, pondera o controlador-geral do município. “Se a privatização não tiver deslocamento de refino, essa atividade continuar em Araucária, a chance é de que se aumente a capacidade de produção e, com isso, incremente o recolhimento de imposto”, diz Moreira.
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Sem novas informações, no entanto, o município vive entre a esperança e o medo. “Sem saber o modelo [que a refinaria irá seguir após uma provável venda], é difícil saber como vai se pesar [na economia da cidade]”, adianta Carvalho. “O presente é incerto. A certeza está no fato de que Araucária precisa estar preparada para ao futuro”, afirma.
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