A Corregedoria do Tribunal de Justiça (TJ) do Paraná vem orientando os cartórios de todo o estado a ignorarem qualquer fiscalização que não venha do tribunal. “A orientação é devolver à origem”, diz o corregedor, Mário Helton Jorge, no ofício circular 148/2017, de 25 de outubro, afirmando que só o órgão que ele dirige “é competente para regulamentar questões afetas ao foro extrajudicial”. No processo que embasa o documento, Jorge acusa a intromissão do Ministério Público (MP) do Paraná, para ele uma instituição “alheia ao Judiciário”.
Especial para a Gazeta do Povo, o coletivo de jornalistas Livre.jor consultou a decisão do TJ que embasa o ofício enviado a todos cartorários e juízes corregedores do Paraná. Nela, Jorge relata que inspeções pelo interior identificaram diversas situações em que o MP fez recomendações aos serventuários, instruindo como eles deveriam proceder em determinados casos.
O corregedor cita como exemplo um caso de 2014, em Marialva, quando o notário foi orientado pelo Ministério Público a não lavrar escritura pública de área rural inferior a 20 mil m². “Inadequado”, foi como Jorge qualificou o MP.
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“Preventivamente”
O MP reconheceu à reportagem que tem feito recomendações aos cartórios “preventivamente”. O órgão diz agir “na defesa da ordem jurídica e do seu reflexo na dinâmica dos serviços de relevância pública”.
Diferentemente do que diz o TJ, para quem o Ministério Público é “alheio à Justiça”, o MP considera que o interesse público autoriza os promotores a agir “no âmbito das atividades do sistema de Justiça”. No caso de Marialva, por exemplo, a recomendação ao cartório era parte de uma ocorrência maior, em que havia suspeita de fracionamento irregular de propriedades rurais para fins de exploração turística.
Na nota enviada à Gazeta do Povo, contudo, o MP sinaliza que a desavença com a Corregedoria do Tribunal de Justiça poderia ser “superada”. O Ministério Público diz que está “a ajustar a melhor forma de encaminhamento dos referidos expedientes [recomendações aos cartórios], de modo a bem separar as esferas de competência de cada qual, conciliando-se, assim, suas inafastáveis funções constitucionais”.
A ideia de uma “parceria”, diz o MP, seria evitar “sobreposições de orientações”. O órgão também relativizou o alcance de suas recomendações administrativas, “não vinculantes” e destinadas a “externarem o posicionamento do Ministério Público acerca das questões que lhe são afetas”.
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Exclusividade
Já o TJ faz uma insistente defesa da exclusividade de fiscalização sobre os cartórios. “Porque somente a Corregedoria-geral da Justiça é órgão competente para regulamentar questões afetas ao foro extrajudicial, os agentes delegados paranaenses [cartorários] deverão devolver à origem eventual recomendação administrativa oriunda do Ministério Público, ou de outras instituições, alheias ao Poder Judiciário, sob pena de afronta direta ao texto constitucional e ao princípio de legalidade.”
A entidade de classe dos cartorários aplaudiu a iniciativa do Tribunal de Justiça. Procurada pela reportagem, a Associação dos Notários e Registradores do Paraná (Anoreg) limitou-se a confirmar os argumentos do TJ. “A Anoreg declara que as recomendações quanto ao exercício da atividade, bem como a fiscalização dos atos praticados, é de competência exclusiva do Poder Judiciário, através da Corregedoria da Justiça”, diz o comunicado enviado pela assessoria de imprensa.
Questionada sobre o assunto, a associação não respondeu se foi ela quem se queixou do Ministério Público à Corregedoria, nem quis comentar o posicionamento do MP no caso.
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