O novo ao lado do velho: Hibribus com veículo movido a diesel| Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo/Arquivo

A legislação sobre mudanças climáticas da cidade de São Paulo, aprovada em 2009, previa a substituição do combustível fóssil nos veículos do transporte público até 2018. O prazo venceu e mais de 90% dos ônibus da cidade continuam sendo movidos a diesel. Em janeiro passado, reconhecendo o fracasso do plano anterior, uma nova lei foi aprovada pela Câmara Municipal com metas menos audaciosas. A lei estabelece em 20 anos o prazo para a troca da matriz energética.

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A prorrogação das metas para São Paulo retrata as dificuldades enfrentadas pelas cidades de todo o mundo, especialmente nos países em desenvolvimento, para acabar com o uso do óleo diesel nos seus sistemas de transporte público. E Curitiba não é uma ilha nesse mundo que a cada dia mais se conscientiza dos malefícios causados pelos combustíveis fósseis ao meio ambiente e, consequentemente, à qualidade de vida e à saúde da população.

As primeiras tentativas na capital paranaense em busca de alternativas ao uso do diesel foram feitas há mais de duas décadas. Em 1995 a Urbs – empresa que gerencia o transporte na cidade – deu início a testes de uma mistura de álcool hidratado (95%) e aditivo (5%) em alguns ônibus. De lá para cá várias outras experiências foram feitas, como a de 1998, com a utilização do combustível B20 – diesel + 20% biodiesel, testado em 20 ônibus. Todos os testes comprovaram redução de poluentes, mas a implantação esbarrou em uma série de obstáculos, que vão dos custos à burocracia imposta pela Agência Nacional (ANP).

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A fotografia dos dias atuais é um pouco melhor, com a circulação crescente de ônibus movidos a biodiesel e os hibribus – veículos híbridos, com fonte elétrica e biodiesel ou elétrica e diesel. O horizonte, no entanto, é de uma longa espera para se chegar ao minimamente ideal.

HISTÓRICO:veja a evolução da “matriz energética” do transporte da capital

De acordo com dados da Urbs, Curitiba tem hoje 62 ônibus menos poluentes que os tradicionais movidos a diesel. Desse total, apenas 34 veículos não usam combustível fóssil, cerca de 2,6% da frota. São 26 biarticulados, 6 articulados e 2 híbridos (elétrico-biodiesel). Os outros 28 ônibus são híbridos, mas usam diesel (elétrico-diesel).

Entre as dificuldades apontadas pela Urbs para avançar na eliminação dos ônibus poluentes estão questões técnicas e econômicas. “Qualquer item que traga um impacto significativo na tarifa acaba afugentando ainda mais o passageiro do transporte coletivo. Esse passageiro acabará migrando para o transporte individual, que polui muito mais”, justifica a empresa por meio de sua assessoria.

Sobre leis que estabelecem prazos para a substituição do diesel por outra matriz energética, como a aprovada na cidade de São Paulo no começo deste ano, a Urbs avalia com cautela. “É preciso avaliar com bom senso essas legislações. Elas precisam ser elaboradas sempre dentro de uma realidade social e de uma condição técnica viável.”

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Para a direção da Urbs, no entanto, a questão econômica não é tudo. “O uso de combustíveis alternativos depende de autorização da Agência Nacional de Petróleo – ANP. Hoje, o consumo máximo liberado é de 270 mil litros por mês para o transporte coletivo de Curitiba, tudo devidamente reportado e comprovado, semestralmente, pela Urbs à ANP”, diz.

A prefeitura de Curitiba, no momento, aposta na ampliação da frota dos ônibus movidos 100% a biodiesel. Para isso, a Urbs promete colocar em circulação em março próximo 25 novos biarticulados com motores preparados para uso do chamado B100, ou seja, livre do combustível fóssil, mas a utilização do biodiesel nessa nova frota ainda depende de autorização da ANP. Hoje a cidade já utiliza a cota máxima estabelecida pela agência.

Um histórico do transporte na capital

Da tração animal aos ônibus híbridos

O transporte público de Curitiba, que já foi modelo para vários países do mundo, ainda enfrenta o problema dos ônibus poluentes, com mais de 97% da frota movida a diesel.

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Movidos a mulas

Em 1887 a empresa Curitybana começou a operar bondes puxados por animais, ligando o início da Avenida João Gualberto ao bairro do Batel. Era o início da massificação do transporte coletivo na cidade.

Bondes elétricos

Em 1912 o cenário mudou com a introdução dos bondinhos elétricos, decretando o início do fim dos bondinhos puxados por mulas. Os bondes se popularizaram e não provocavam poluição.

Os ônibus poluentes
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Em 1928 começaram a circular os primeiros ônibus de transporte coletivo, movidos a combustível fóssil. Os bondes elétricos resistiram por duas décadas, mas perderam espaço para os veículos poluentes e em 1951 saíram de circulação.

Ônibus expressos

Em 1974 entraram em funcionamento os primeiros ônibus expressos na cidade, os conhecidos ônibus vermelhos, que usavam vias exclusivas, as chamadas canaletas.

Biarticulados

Em 1992 iniciou-se a operação do ônibus biarticulado, para 270 passageiros. Nesse período também foram implantadas as Linhas Diretas, servidas por veículos de cor cinza popularmente chamados de “Ligeirinhos”.

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Veículos “limpos”

Em 1995 a cidade fez os primeiros testes em busca de fontes limpas de energia para mover os ônibus, com o uso de uma mistura de álcool hidratado (95%) e aditivo (5%) em alguns ônibus. De lá para cá várias outras experiências foram feitas, incluindo mistura de diesel e biodiesel.

Ônibus a biocombustível

Em 2009, os primeiros ônibus a rodar 100% com biocombustível (B100) entraram em operação na cidade. Medições técnicas mostraram um índice emissão de fumaça 25% menor e redução de 19% de óxido de nitrogênio e uma redução de 30% nas emissões de monóxido de carbono (CO).

Híbridos
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Em 2012 os primeiros ônibus híbridos produzidos no Brasil começaram a circular na cidade. Os veículos movidos a eletricidade e biodiesel, chamados hibribus, reduzem 90% a emissão de poluentes, na comparação com os ônibus que circulam atualmente, e 35% o consumo de combustível.

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“Há razões mais do que justificáveis para a substituição”

Luiz Pereira Ramos, professor do Departamento de Química da Universidade Federal do Paraná (UFPR, é editor associado da revista Energy and Fuels da American Chemical Society e desenvolve pesquisas no campo da bioenergia.Ele conversou com a Gazeta do Povo sobre a necessidade de substituir o uso de combustíveis fósseis no transporte coletivo das cidades.

Quais são as principais dificuldades para substituir os ônibus movidos a combustível fóssil?

É preciso avaliar primeiro o que estamos chamando de energia limpa. São ônibus elétricos, movidos a hidrogênio, biogás, etanol ou biodiesel? Cada caso exige uma avaliação diferenciada. Uma questão comum é que a substituição do diesel tem custos. Embora as últimas vendas de biodiesel em leilões da ANP tenham demonstrado que esse combustível tem capacidade de ser competitivo com o próprio diesel no varejo, há uma compreensão geral de que o uso de um combustível alternativo é mais caro e que agrega valor (custos) ao setor de transportes. Se você equaciona isso no setor de transporte público, que implica em pagamento de tarifa, e que qualquer centavo de aumento gera um furor na opinião pública, a mudança gera resistência.

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Então é inviável?

Não, pelo contrário. Os estudos realizados em relação ao aumento provocado pela adição de biodiesel ao diesel, por exemplo, demonstram que o impacto na tarifa é pequeno. Isso tudo falando sobre o valor real. Se você traz a essa conta a economia em termos de saúde pública, em termos de passivo ambiental que essa substituição traria, certamente concluirá que há razões mais do que justificáveis para a utilização de combustíveis mais limpos, que reduzam a emissão de tanta fumaça negra – a popular picumã – no ar.

Qual o impacto da substituição dos ônibus a diesel na poluição urbana por veículo automotores?

Os ônibus, pelo tipo e pelo porte de motor que usam, emitem mais fumaça, mais poluentes. Isso é facilmente percebido nas ruas. Os carros têm motores bem menor e, no Brasil, são movidos a gasolina ou a álcool. E nossa gasolina tem um porcentual alto de etanol. Os motores dos ônibus emitem muito mais poluição.

Temos tecnologia e produção para fazer a substituição?

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Há quem diga que o país não tem capacidade para produzir matéria prima suficiente para suportar o aumento da mistura de biodiesel ao diesel, mas as próprias entidades de produtores rurais que operam nesse setor dizem exatamente o contrário. O setor diz que tem capacidade para atender a demanda.

E os elétricos?

No caso do veículo elétrico há mais limitação, há problema de abastecimento e a substituição da frota é muito mais cara. No caso do biodiesel, você pode simplesmente diminuir a quantidade de diesel, substituindo-o pelo biodiesel, sem prejuízo para o motor. O máximo que pode acontecer é eventualmente exigir uma manutenção um pouco mais regular, já que o motor a diesel não foi desenvolvido para queimar biodiesel. Então, para queimar biodiesel com eficiência seria preciso ajustes no motor, e para isso já existe tecnologia desenvolvida. Já existe evidência farta no mundo inteiro de que se pode trabalhar com 20% de mistura de biodiesel ao diesel.

Existem outras preocupações técnicas?

Quando se faz todo o biodiesel de uma única matéria prima é possível determinar a qualidade desse produto com maior segurança. Por outro lado, a matriz de matérias primas for muito diversificada, se tiver óleos de vários tipos, por exemplo, soja, canola, gergelim, algodão, palma, óleo de fritura, isso vai requerer um monitoramento maior da qualidade do biodiesel. É preciso garantir que chegue ao consumidor um biocombustível eficiente.

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Por que a mudança é lenta?

Existe um marco regulatório no Brasil que prevê o aumento do teor de biodiesel no diesel nacional de até 15% ou mais em poucos anos. Já existe um escalonamento, uma previsão escalonada. Agora, é claro que a implementação dessas medidas sempre dependem de alguma movimentação política, de alguma iniciativa, de alguma regulação, especificamente pela ANP.

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