Se a recuperação da economia já viria mais lenta do que o esperado, os impactos causados pela greve dos caminhoneiros, o clima de incerteza eleitoral e até mesmo a alta do dólar indicam que o crescimento econômico deste ano deve ser ainda mais modesto. A economia já teve um fraco desempenho nos três primeiros meses do ano e, agora, a tendência é de estagnação ou queda no segundo trimestre. Sobrará para o último semestre de 2018 salvar o país do atoleiro e evitar que a economia entre novamente em recessão.
O mercado, em geral, ainda não trabalha com a possibilidade de o Brasil voltar à recessão neste ano. Mas a expectativa de crescimento nunca esteve tão baixa. A média do mercado, medida pelo Boletim Focus, é de um crescimento de apenas 1,53% do Produto Interno Bruto (PIB), indicador que mede a atividade econômica. O número, porém, vem caindo semanalmente desde o início do ano, quando era projetada uma alta de 2,69% para 2018.
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Todos os agentes financeiros revisaram e devem continuar revisando suas projeções do PIB para baixo. O Banco Central reduziu a previsão de crescimento da economia de 2,6% (feita no início do ano) para 1,6%; o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) de 3% para 1,7%; o Bradesco de 2,8% para 1,5%; o Santander de 3,2% para 2%; o Itaú de 3% para 1,3%; o Banco Fator de 2,9% para 1,5%; a GO Associados de 3,2% para 2%; e a 4E Consultoria de 1,9% para 1,4%.
As revisões foram feitas em junho ou início de julho, após a greve dos caminhoneiros. Mas uma nova avaliação é esperada após a divulgação do PIB do segundo trimestre, quando se saberá de fato o impacto da greve na economia.
Depois de cinco trimestres seguido de alta, PIB pode voltar a cair
E o resultado não será nada animador. O Ipea afirma que os indicadores já disponíveis para o segundo trimestre de 2018 permitem projetar crescimento praticamente nulo de abril a junho na comparação com o trimestre imediatamente anterior. Entre os indicadores que demonstram isso estão a queda de 15,4% na produção de veículos em maio, a retração de 10,9% na produção industrial e a inflação de junho em 1,26%, a maior taxa para o mês desde 1995. Todos os índices são em relação ao mês anterior.
Diante de tantos números negativos, o Ipea acredita que o PIB do segundo trimestre deve ser de apenas 0,1%, ou seja, praticamente uma estagnação. A mesma estimativa é feita pela 4E Consultoria. O Bradesco tem um palpite levemente melhor: 0,2%. Já a GO Associados e o Banco Fator estimam queda da economia no segundo trimestre: -0,3% e de -0,2% a -0,3%, respectivamente. Se confirmada, seria a primeira queda após cinco trimestres seguidos de PIB positivo.
Greve dos caminhoneiros e falta de confiança dificultam a retomada econômica
A culpa do resultado ruim do segundo trimestre será da greve dos caminhoneiros. “Vamos ter um número muito ruim por causa da greve [dos caminhoneiros]. Tivemos dez dias de paralisação da produção e da distribuição e os efeitos se prolongaram até a primeira, segunda semana de junho. Então, maio vai dar um susto em todo mundo. Todas as atividades econômicas vão sofrer. Na agricultura, por exemplo, há atividades que tiveram que sacrificar três meses de produção”, diz Claudio Considera, pesquisador associado do FGV/IBRE, ao lembrar dos animais que tiveram que ser sacrificados devido à falta de ração e à dificuldade de escoamento da produção.
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Os efeitos causados pela greve (paralisação da produção, dificuldades de distribuição e redução da confiança de empresários e consumidores) vão pressionar a inflação, que deve subir no segundo trimestre deste ano, ajudando a jogar o resultado do PIB no período para baixo. O mercado, porém, espera que esses efeitos fiquem restritos aos meses de maio e junho.
A expectativa é que a economia volte a crescer neste terceiro trimestre, até mesmo pela demanda reprimida causada pela paralisação. Se o resultado positivo vier a ser confirmado, evitaria que o país entrasse em recessão técnica neste ano. O termo é utilizado para explicar quando há dois trimestres consecutivos de queda de PIB.
Recuperação cada vez mais lenta, quase parando
Mas, apesar da expectativa de crescimento de julho a setembro, isso não significa que a economia vai voltar a avançar a níveis suficientes para reverter o déficit estrutural do PIB. A solução que o governo adotou para resolver a greve, os próprios dias de paralisação e o clima de incerteza eleitoral contaminam os já baixos índices de confiança de empresários e consumidores. E, sem confiança, o empresário não investe e a família não consome, travando qualquer chance de recuperação mais forte da economia.
“Além dos efeitos diretos sobre a produção e os preços, a greve pode ter piorado a percepção de risco dos agentes em relação ao ambiente econômico e político – já naturalmente elevada em face das incertezas do quadro eleitoral –, tornando-os ainda mais cautelosos em suas decisões de consumo e investimento. Todos estes fatores vêm tornando mais desafiadora a tarefa da política monetária de buscar a recuperação cíclica da economia ao mesmo tempo em que mantém a taxa de inflação e as expectativas inflacionárias sob controle”, explica o Ipea na Carta de Conjuntura 2.º trimestre de 2018.
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Há, ainda, o fato de a economia já ter apresentado um desempenho ruim no primeiro trimestre: crescimento de 0,4%, quando era esperado 1%. A principal explicação para o crescimento baixo no primeiro trimestre está ligada à falta de confiança do consumidor e do empresariado. E a falta de confiança existe porque o governo não conseguiu adotar sua agenda reformista, a redução da taxa de juros ainda não chegou ao consumidor, o desemprego continua em alta e ninguém sabe quem vai ganhar as eleições no fim de outubro.
Cenário externo também não ajuda a economia brasileira
O cenário externo também tem dado sua contribuição para puxar as previsões do PIB para baixo. “Dois fatores com origem nos Estados Unidos parecem ter influenciado mais fortemente a economia brasileira: a perspectiva de uma elevação mais rápida dos juros e o recrudescimento das medidas protecionistas contra importações naquele país. O principal impacto interno dessa mudança no cenário internacional tem sido a pressão sobre a taxa de câmbio, que já desvalorizou 20% contra o dólar desde o final de janeiro”, diz o Ipea.
O economista Luiz Castelli, da GO Associados, resume: “O cenário interno é o que mais contribui [para a queda nas expectativas de crescimento]. Mas o cenário externo também não é dos melhores, com os Estados Unidos subindo os juros e as perspectivas de guerra comercial. Parece que nada está conspirando a nosso favor.”
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Eleição será crucial para definir o rumo da economia
Apesar de parecer que tudo está jogando contra, a expectativa é que o país consiga crescer alguma coisa neste ano. A ameaça de uma nova recessão, afirmam os economistas consultados pela reportagem, é mais forte a partir do próximo ano, caso um candidato populista e não comprometido com reformas vença as eleições.
“No ano que vem, se o candidato vencedor for populista e não fizer a reforma fiscal e as demais reformas esperadas, não deverá haver recuperação dos investimentos e, consequentemente, do emprego”, diz o economista Bruno Lavieri, da 4E Consultoria. “Qualquer desfecho [das eleições] não esperado pelo mercado pode levar a nova queda do PIB”, acrescenta Castelli.
Já o economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, não descarta a possibilidade de o país entrar em recessão ainda neste ano. Ele lembra que a economia já vem lenta desde o primeiro trimestre, com o empresário, em geral, não fazendo grandes investimentos e nem contratando com carteira assinada diante do ambiente de incertezas – agravado ainda mais pela greve. E a tendência, diz Gonçalves, é manter esse ritmo, principalmente porque todos estão esperando pelo desfecho das eleições.
“Julho já foi e agosto está indo. Não tem como recuperar a atividade de maneira relevante em um ambiente desse”, diz Gonçalves.
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